Nesta comunicação são apresentados resultados de uma tese de doutorado em andamento, distribuídos em dois tópicos, a dizer: a) um panorama geral da pesquisa, considerando a etapa na qual o trabalho se encontra; b) a discussão inicial sobre patrimônio cultural, a partir da análise das Representações Sociais dos colaboradores da pesquisa.
A investigação citada tem como objetivo discutir a formação docente a partir das Representações Sociais de professores de música sobre manifestações de cultura popular na escola, na perspectiva da educação patrimonial em tempos de globalização e internacionalização. O aporte teórico-metodológico da pesquisa é composto pela Teoria das Representações Sociais (RS) de Serge Moscovici (ver: Moscovici, 2007; 2012; 2013; 2015; Jodelet, 1984; 1989; 2001; 2005; Jovchelovitch, 1998; 2004; 2011; 2013) e pela Teoria do Núcleo Central (TNC) de Jean-Claude Abric (ver: Abric, 1998; 2001a; 2001b; Sá, 2002). Os dados foram discutidos à luz do campo da Educação Patrimonial e da construção conceital sobre globalização e internacionalização conforme Hall (2015) e Kertz-Welzel (2018). As ferramentas foram: questionário sociodemográfico, teste de associação livre de palavras (TALP) e entrevista semiestruturada.
A pesquisa é de cunho qualitativo, compreendida como uma investigação comparativa, que teve como campo dois grupos sociais distintos: um brasileiro, outro chileno. Os elementos que os constituem enquanto grupos sociais estão associados ao o reconhecimento dos colaboradores da investigação como professores de música que atuam em escolas e ao fato de cada grupo pertencer a uma mesma região geográfica. No caso, uma região brasileira, localizada no norte do Paraná, outra chilena, localizada na região de O’Higgins.
A investigação partiu dos questionamentos: qual a identificação dada por professores de música à constituição de patrimônio cultural e manifestações populares na escola? e quais os impactos perceptíveis nos processos de educação patrimonial desses professores, desde a formação à prática com o ensino de música na escola?
Os dados advindos do questionário sócio demográfico foram transformados em tabelas que contribuíram para a compreensão dos contextos de vivência com a arte/música durante a vida, formação, atuação e relação com a escola básica. Compreendemos que este conjunto de informações permitirá a melhor identificação de cada um dos colaboradores, bem como dos grupos sociais formados para a investigação.
As entrevistas, após transcritas e analisadas, permitiram a identificação de seis categorias, que são descritas na sequência. A primeira, denominada “Contexto escolar e organização do ensino de música na escola”, tem como central a compreensão acerca das representações dos professores sobre os espaços para a educação musical nas escolas onde atuam. A segunda leva como nome “Cultura popular, cultura tradicional e Folclore”. Nela discutimos a dimensão conceitual destes termos a partir das Representações Sociais dos professores. A terceira categoria tem como foco a discussão conceitual acerca dos termos “Patrimônio cultural, patrimônio cultural e música”, sendo assim denominada. A quarta categoria discute os espaços para a “cultura popular e patrimônio cultural na escola”, recebendo esta denominação. Na quinta categoria, o foco central da análise são as Representações Sociais dos professores sobre “Diversidade cultural e inclusão cultural na escola”. A última categoria apresentada foca na formação docente em relação aos processos de educação patrimonial.
Em relação ao TALP, foram considerados para a investigação um conjunto de 09 termos, e todos analisados para a constituição dos quadrantes relativos à identificação do núcleo central e elementos periféricos das Representações Sociais dos professores. Após a finalização das análises de cada ferramenta de maneira independente, será realizada a triangulação dos dados. O processo será repetido de igual maneira nos dois grupos sociais investigados. Após o término destas etapas, o processo comparativo entre os dois grupos será realizado, tendo como eixo condutor o conjunto conceitual referente à globalização e, em especial, a internacionalização, conforme compreendida por Kertz-Welzel (2018), para a qual faz-se urgente a realização de estudos na área de educação musical que estejam preocupados com os processos de internacionalização em vistas a uma educação musical globalizada, porém, sensível à diversidade cultural e atenta aos acordos internacionais voltados para a educação escolar.
Como ponto específico de discussão, compartilharemos um recorte, no qual são apresentados resultados parciais da discussão acerca do tema indutor “patrimônio cultural”, analisando dados advindos do TALP e das entrevistas com ambos os grupos sociais.
Quando se trata de patrimônio cultural encontramos estudos distribuídos por diversos campos, a dizer: arquitetura, história, geografia, ciências sociais, turismo, arqueologia, teologia, antropologia, ciências e matemática, gestão de patrimônio cultural, ensino de ciências, gestão pública, patrimônio cultural e sociedade, educação, entre outras. Isso nos permite sustentar a ideia de patrimônio cultural como um tema transversal e potencialmente interdisciplinar de trabalho.
Dentre as vertentes de investigação encontradas, classificamos algumas. A primeira, é aquela voltada para o estudo de patrimônio cultural e sua valorização, seja para reconhecimento de comunidades locais específicas seja voltado para o turismo e empreendedorismo cultural (ver, como exemplos: CAVALCANTI, 2016; MAIA, 2016; VASCONCELOS, 2015; HENRIQUES, 2013; entre outros). A segunda, volta-se para a análise de contextos de práticas nas quais o foco de estudo são as experiências com o patrimônio cultural por meio de mediações práticas, realizadas com grupos comunitários distintos. As ações podem ser planejadas especificamente para a realização do estudo, ou serem provenientes de programas e projetos pré-existentes (ver, entre outros: REGO, 2018; PEREIRA, 2017; MAIA, 2016; FREITAS, 2014; AREVALO, 2013; EITERER, 2013). A terceira vertente de investigações é aquela na qual as pesquisas se voltam para as políticas públicas quanto à inserção de patrimônio cultural nos currículos e práticas escolares, bem como, às análises e contribuições dos inventários culturais em relação ao alcance das ações desenvolvidas em projetos (ver, entre outros: HOFFMANN, 2018; MARINS, 2018; CAVALCANTI, 2016; CHAGAS, 2014; EITENER, 2013; SILVA, 2007;). A quarta vertente é formada por pesquisas que se propõem a discutir patrimônio cultural dentro de um universo conceitual, com vistas a apontar o estado da arte ou propor a criação de modelos teóricos e práticos (ver, entre outros: CAVALCANTI, 2016; MERILLAS, 2016; CONFORTI, 2010;). Uma vertente aproximada a essa é aquela na qual as investigações são voltadas para a análise da formação do campo conceitual que está na base da constituição e da preservação de patrimônio cultural nos ambientes tidos como potencialmente educativos, de forma geral, desde escolas, até museus e projetos sociais, partindo das concepções constituídas por participantes de grupos sociais específicos (ver, entre outros: CASTRO, 2017; CAVALCANTI, 2016; SOUZA, 2014). Por último, a vertente de investigação que está atrelada à formação docente em relação à patrimônio cultural e educação patrimonial. Linha de pesquisas na qual estaria categorizada nossa investigação. (Ver, entre outros: MAIA, 2016; SANTOS, 2016; ROSSI, 2015; SILVA, 2015; EITERER, 2013).
Sob a perspectiva das políticas mundiais para a educação, em especial, àquelas advindas da UNESCO, o campo da educação patrimonial vem ganhando território, atentando para as mudanças da sociedade atual e seus processos de globalização e internacionalização. Porém, em meio à tantas mudanças, como estão pensando nossos professores que atuam com música na escola básica quando se trata de patrimônio? Compreendemos como essencial para a sustentação teórica e prática do campo, bem como para a construção e valorização de patrimônio cultural, identificar as Representações presentes nos grupos sociais que são parte essencial do processo educativo.
Nesta comunicação apresentamos o ponto de partida da investigação, que é conhecer como os grupos sociais pesquisados constituem suas Representações Sociais acerca do termo patrimônio cultural.
Considerando as análises preliminares, podemos afirmar que em ambos os grupos a centralidade das RS sobre patrimônio cultural está associada à sua compreensão enquanto elemento estático e representativo de um passado, “que deve ser preservado para as gerações futuras” (Professor Brasil 3), somando 85% dos entrevistados. Mesmo quando o discurso remete a elementos do chamado patrimônio cultural imaterial (onde estaria, por exemplo, a música), o que ressalta é a ideia de elemento estático “a ser preservado pra garantir sua manutenção e história” (professor Chile 2).
Atentando para as discussões contemporâneas no campo da Educação Patrimonial e para as representações sociais dos colaboradores da pesquisa, identificamos a urgência de discutir a formação docente neste campo, desenvolvendo estratégias que conciliem elementos históricos às mudanças da sociedade em tempos de globalização e internacionalização. Estas, se consideradas desde a formação até a atuação, permitem visualizar um processo de colaboração e participação ativa e criativa na formação de bens patrimoniais que sejam vivos e representativos para comunidades locais e globais.
Comissão Organizadora
Érico Ribas Machado
Comissão Científica