CONCEITO DE ALIENAÇÃO NAS PESQUISAS EM EDUCAÇÃO NO BRASIL: UMA ANÁLISE A PARTIR DE TESES E DISSERTAÇÕES (2008 – 2018)
Geovani Roberto Kreling – UEPG – geovani_rk@hotmail.com
Carina Alves da Silva Darcoleto – UEPG - carinaasd@gmail.com
Eixo 2 – Política Educacional e Gestão
Introdução
O texto apresenta resultados parciais da pesquisa que vem sendo desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa, na Linha de Pesquisa de História e Políticas Educacionais. O objetivo é verificar se e de que maneira é abordado o conceito de alienação em pesquisas de Programas de Pós-Graduação em Educação, tendo em vista o campo da Política Educacional.
A compreensão da relação entre a alienação e a educação, assim como a crítica radical das alienações produzidas pela sociedade capitalista acabam adquirindo caráter de necessidade e urgência histórica, pois colocam em risco a educação enquanto um direito social, além da própria continuidade do gênero humano. Compreende-se que esta questão é fundamental na luta pela garantia do direito à educação pública, gratuita e de qualidade, pois a atividade educativa é um complexo social que exerce grande influência na maneira de agir e pensar dos indivíduos, podendo estar permeada por interesses políticos e ideológicos.
O referencial teórico-metodológico adotado na pesquisa é o materialismo histórico e dialético.
Aspectos Metodológicos
O levantamento dos dados foi realizado entre os meses de agosto e setembro de 2018 e se deu a partir da busca, no catálogo de teses e dissertações da CAPES, pelo termo “alienação”. Em seguida, a busca foi refinada a partir de trabalhos concluídos entre os anos de 2008 e 2018 e vinculados aos seguintes programas: Educação, Educação (Currículo), Educação (Psicologia da Educação), Educação – Campus Catalão, Educação e Contemporaneidade, Educação e Ensino, Educação Escolar e Educação: História, Política, Sociedade. A busca resultou em 203 trabalhos, sendo 136 dissertações e 67 teses; destes, 11 trabalhos não foram encontrados em meios eletrônicos, seja no portal da CAPES ou mesmo nas páginas dos respectivos Programas de Pós-Graduação. Desse modo, esses 11 trabalhos não serão analisados nessa pesquisa.
A sistematização e análise prévia dos dados foram realizadas a partir dos 192 trabalhos encontrados, buscando categorizar as pesquisas a partir do uso do termo “alienação” nas palavras-chave e no resumo; do tema ou questão central do trabalho; do referencial teórico-metodológico e da metodologia utilizada; e da dedicação ou não de um capítulo à discussão do conceito de alienação.
Resultados preliminares
Devido ao estágio de realização da pesquisa, neste texto, são apresentados apenas alguns dados preliminares. O termo “alienação” aparece nas palavras-chave de 26 trabalhos, sendo 17 dissertações e 9 teses, totalizando 13,54% dos trabalhos que estão sendo analisados. Quanto ao resumo, em 171 trabalhos aparece o termo alienação, sendo 116 dissertações e 55 teses, perfazendo 89,06% do total. Dentre os trabalhos, 60 dedicam um capítulo à discussão do conceito de alienação, sendo 40 dissertações e 20 teses, que totalizam 31,25% dos trabalhos examinados. Ao cruzar as buscas por trabalhos que utilizaram o termo “alienação” nas palavras-chave e resumos, além de dedicar um capítulo à alienação, obtivemos um total de 17, com 12 dissertações e 5 teses, totalizando 8,85% dos trabalhos.
A partir da teoria marxiana, compreende-se a alienação como um processo de perda de controle, que surge a partir da maneira específica em que a objetivação do trabalho se dá em cada momento histórico e que acaba sendo incorporada pelos indivíduos que produzem a riqueza material necessária à existência humana, de maneira a se tornar uma força hostil e potencialmente destruidora, que foge ao próprio controle racional dos sujeitos, refletindo diretamente sobre todas as relações sociais e criando obstáculos ao desenvolvimento do gênero humano.
O trabalho é a atividade que permite aos seres humanos produzir os meios necessários à sua sobrevivência, a partir da transformação consciente da natureza, caracterizando-se como uma atividade essencial para existência da vida humana em sociedade. De acordo com Marx e Engels:
[...] Mas da vida fazem parte sobretudo comer e beber, habitação, vestuário e ainda algumas outras coisas. O primeiro ato histórico é, portanto, a produção dos meios para satisfação dessas necessidades, a produção da própria vida material, e a verdade é que esse é um ato histórico, uma condição fundamental de toda a história, que ainda hoje, tal como há milhares de anos, tem de ser realizado dia a dia, hora a hora, para ao menos manter os homens vivos. (2009, p.40).
Ao longo da história, os seres humanos se organizaram e se organizam de diferentes modos para produzir trabalho, conferindo-se a cada forma de sociabilidade, em cada momento histórico, caraterísticas peculiares, mas que mantêm quase sempre um aspecto em comum: a exploração do homem pelo homem. Nesse contexto, a caraterística principal que difere a exploração do modo de produção capitalista dos anteriores (feudal e escravista) é o trabalho assalariado, que reduz a força de trabalho de quem realmente produz à mera mercadoria, o que constitui a essência das alienações capitalistas, pois é a força de trabalho que permitiu e permite aos seres humanos se desenvolver enquanto sujeito histórico e se relacionar com toda a história de seu próprio gênero. Dessa forma, na sociedade capitalista, as necessidades humanas não são postas em primeiro lugar, mas, ao contrário, são sempre submetidas às demandas produzidas pelo capital. Conforme Meszáros:
O trabalho, que deveria ser uma propriedade interior, ativa, do ser humano, torna-se exterior ao trabalhador como resultado da alienação capitalista [...] Não é ‘atividade vital’, na qual o ser humano ‘afirma a si mesmo’, mas mero ‘meio para sua existência individual’, autonegação que mortifica sua physis e arruína seu espirito. A alienação transforma a atividade voluntária em ‘trabalho obrigatório’, em atividade que é mero meio para atingir fins essencialmente animais (comer, beber, procriar) e, consequentemente, ‘o animal se torna humano e o humano, animal’. (2016, p. 145).
Nessas circunstâncias, ao tratar a força de trabalho como uma mercadoria, o caráter essencialmente humano desta atividade é negado e as necessidades humanas são deixadas de lado para que as necessidades do capital possam ser atendidas, o que acaba tornando as relações sociais cada vez mais desumanas. De acordo com Marx:
O estranhamento aparece tanto no fato de meu meio de vida ser de um outro, no fato de aquilo que é meu desejo ser a posse inacessível de um outro, quanto no fato de que cada coisa mesma é um outro enquanto si mesma, quanto no fato de que minha atividade é um outro, quanto finalmente – isto vale também para os capitalistas – no fato de que, em geral, o poder não humano domina. (2010, p. 146).
Das relações sociais cada vez mais desumanas, fruto das alienações da sociedade capitalista, resultam modos de pensar e agir que colocam as necessidades imediatas dos indivíduos a frente do desenvolvimento humano genérico, o que reflete significativamente na forma como são tratadas as políticas públicas em âmbito geral, e, particularmente, aquelas voltadas para a educação. Isso acontece porque a educação está relacionada à totalidade social, influenciando direta ou indiretamente na maneira de agir e pensar dos sujeitos.
Desse modo, a atividade educativa exerce papel político ativo quando se trata da formação dos indivíduos, caracterizando-se como um campo de intensas disputas ideológicas, mesmo quando isso ocorre inconscientemente ou de forma mascarada. No Brasil, por exemplo, tais disputas são objetivadas em movimentos como o Escola Sem Partido e em Reformas Educacionais, como a estabelecida pela Lei 13.415/2017, que reformulou o Ensino Médio. Entende-se que essas ações representam retrocessos no que se refere às políticas educacionais no Brasil, pois caminham na contramão do caráter público e universal da escola e da educação em âmbito geral, tendo cunho sobretudo mercadológico e visando atender apenas os interesses do capital.
Algumas Considerações
A reflexão sobre os dados levantados e sistematizados até o momento indica que o número de pesquisas que se dedicam a compreender a relação entre a alienação e a educação, principalmente no campo das políticas educacionais, ainda é escasso. Isso se destaca tendo em vista os problemas impostos pelas alienações produzidas na sociedade capitalista e que afetam a educação, seja ela de tipo escolar ou em qualquer outro espaço e dimensão.
A importância dessa discussão está justamente na compreensão de que as relações sociais não se perpetuam e obtêm sucesso de modo automático em cada forma de sociabilidade, mas precisam de complexos sociais, como a educação, para que as maneiras de agir e pensar de um determinado modo de produção, em um determinado momento histórico, sejam incorporadas e aceitas pelos indivíduos como únicas possíveis. Essa questão configura-se como central na luta política pela garantia do direito à educação enquanto atividade essencial para o desenvolvimento do indivíduo, de forma singular, e do gênero humano, em um sentido amplo.
Referências
MARX, K. Manuscritos econômicos-filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2010.
MARX, K; ENGELS, F. A ideologia alemã. São Paulo: Expressão Popular, 2009.
MESZÁROS, I. A teoria da alienação em Marx. São Paulo: Boitempo, 2016.
Comissão Organizadora
Érico Ribas Machado
Comissão Científica