INTRODUÇÃO
Vaginites infecciosas são as doenças infecciosas mais comuns encontradas entre mulheres atendidas em ambulatórios de ginecologia nos serviços de atenção médica primária. Geralmente a doença ocorre em consequência de um desequilíbrio ambiental no ecossistema vaginal ou devido a infecção causada por um microrganismo de transmissão sexual. As três infecções mais frequentes associadas às vaginites infecciosas são causadas por Gardnerella vaginalis, Trichomonas vaginalis e espécies do gênero Candida.
Espécies do gênero Candida estão associadas a vulvovaginites, principalmente em certas etapas do ciclo menstrual ou quando a paciente foi submetida à antibioticoterapia prolongada, e apresenta frequentemente um fluxo característico semelhante a “leite coagulado”, acompanhado de prurido, disúria e enrijecimento da mucosa vaginal e do epitélio vulvar. Estima-se que até 75% das mulheres sexualmente ativas desenvolvam candidíase pelo menos uma vez durante a vida e entre 5% a 10% delas apresentem a forma recorrente, ou seja, de três ou mais episódios em um ano (HERNÁNDEZ-RÍOS, 2019).
Trichomonas vaginalis é um protozoário flagelado, causador de uma das doenças mais comuns de transmissão sexual. Provoca vaginite que se caracteriza por um corrimento vaginal fluido, abundante, de cor amarelo-esverdeada, espumoso e de odor fétido, mais frequentemente no período pós-menstrual. O processo é acompanhado de irritação vulvovaginal de intensidade variável e dores no baixo ventre. A vagina e a cérvice podem estar edematosas e eritematosas, com erosão e pontos hemorrágicos da parede cervical. A tricomonose é mais sintomática durante a gravidez ou entre mulheres usuárias de medicamento anticoncepcional oral (NEVES et al., 2016).
Gardnerella vaginalis é uma bacteria Gram-positiva geralmente encontrada na flora vaginal, porém em alguns casos pode se tornar dominante e levar à vaginose bacteriana.
Este trabalho teve como objetivo calcular indicadores de infecção, como o coeficiente de prevalência, o coeficiente de dominância por faixa etária das mulheres que desenvolveram vaginites causadas por Gardnerella vaginalis, Candida spp. e Trichomonas vaginalis entre as atendidas em ambulatórios de assistência à mulher nas cidades da Baixada Fluminense, estado do Rio de Janeiro, Brasil.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram examinadas mulheres voluntárias que compareceram em ambulatórios de ginecologia de cidades da Baixada Fluminense A amostra foi constituída por 202 mulheres com idades variando de menos de 15 anos, até mais de 45, as quais foram divididas em classes de idade. Material da parede vaginal, laterais e fundo de saco posterior foi coletado com o auxílio de suabes estéreis. Os esfregaços foram submetidos a cultura e pesquisa direta para o diagnóstico microbiológico.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Entre as 202 mulheres examinadas foram diagnosticados 83 casos de infecção por um dos três microrganismos investigados, correspondendo a um coeficiente de prevalência total (CP) de 41,09%. A distribuição de casos de vaginites de acordo com os elementos microbianos apontou os seguintes resultados: 45 de G. vaginalis, coeficiente de prevalência (CP) de 22,28%, 20 de Candida spp. (CP = 9,90%), e oito de T. vaginalis (3,96%). Foram detectados 10 casos de infecção simultânea por mais de um dos três agentes, sendo G. vaginalis + Candida spp. o mais incidente com seis casos (CP = 2,97%), seguido por G. vaginalis + T. vaginalis com dois casos (CP = 0,99%). Candida spp. + T. vaginalis, e a tríplice infecção só foi detectado em um caso cada (CP = 0,50%) (Quadro 1).
Tabela 1: Número de casos diagnosticados de vulvovaginites, com identificação dos agentes microbianos, entre 202 mulheres examinadas na Baixada Fluminense, em 2014-2015, com coeficiente de dominância (CD) por espécie e faixa etária.
Faixa etária (anos) | Gardnerella vaginalis (No)[CD%] | Candida spp. (No) [CD%] | Trichomonas vaginalis (No) [CD%] |
<15 | 02 [18,18] | 01[9,09] | 00 |
15 H 24 | 20 [37,04] | 09[16,67] | 04[7,41] |
25 H 34 | 12 [15,00] | 05[6,25] | 02[2,50] |
35 H 44 | 08 [19,05] | 03[7,14] | 02[4,76] |
>45 | 03 [42,86] | 02[28,57] | 00 |
T o t a l | 45 | 20 | 08 |
A distribuição por faixa etária demonstra que o grupo mais afetado é o de mulheres com idades entre 20 e 40 anos, que corresponde a 54,5% do total de casos diagnosticados de vulvovaginites causadas por espécies do gênero Candida.
Os coeficientes de dominância para as infecções pelos três microrganismos indicam que o maior casuísmo está na faixa de idade de mais de 45 anos, e dos 15 aos 24 anos, portanto onde deverá acontecer maior atenção (Figura 1).
Figura 1: Número de casos diagnosticados de vulvovaginites, com identificação dos agentes microbianos, entre 202 mulheres examinadas na Baixada Fluminense, em 2014-2015 por espécies e associações microbianas.
Abdul-Aziz et al. (2019) examinaram mulheres em idade reprodutiva na cidade de Sana’a, Yemen, encontrando uma prevalência geral para infecções vaginais de 37,6%, sendo a vaginose bacteriana a mais prevalente (27,2%). Vaginites causadas por Candida spp. foram significativamente mais frequentes entre mulheres sintomáticas, principalmente associadas a prurido. A vulvovaginite causada por espécies do gênero Candida apresentou uma prevalência de 6,6%; vaginoses causadas por Trichomonas vaginalis foram registradas em 0,9% das mulheres examinadas; vaginoses por infecção simultânea por Candida spp. e elementos bacterianos representou 2,6% do total das mulheres examinadas, enquanto a coinfecção por T. vaginalis e Candida spp. foi verificada em apenas uma paciente (0,3%). O perfil e distribuição por espécies microbianas dos casos de vaginites encontrados por Abdul-Aziz et al. (2019) aproximam-se daqueles obtidos em nossa pesquisa entre mulheres residentes na região da Baixada Fluminense.
Os pesquisadores Payne et al. (2020) determinaram fatores de risco associados à prevalência de infecção por Candida albicans, Gardnerella vaginalis e Trichomonas vaginalis entre mulheres que foram atendidas no Hospital de Dschang, Cameroon. O diagnóstico foi realizado com amostras de 1001 pacientes que apresentavam problemas ginecológicos através da microscopia a fresco, coloração de Gram e cultivo em meio de cultura Ágar-Sabouraud. Entre as amostras examinadas, 525 mulheres foram diagnosticadas com pelo menos um dos microrganismos pesquisados, com prevalência de 52,44%. Um total de 256 mulheres (25,57%) estavam infectadas por Candida albicans. 171 mulheres (17,8%) infectadas por Gardnerella vaginalis; 95 mulheres (9,49%) infectadas por Candida albicans e Gardnerella vaginalis simultaneamente; 2 mulheres (0,2%) infectadas simultaneamente por Candida albicans e Trichomonas vaginalis; e 1 (0,1%) com infecção simultânea por Gardnerella vaginalis e Trichomonas vaginalis. Os autores concluíram que medidas drásticas devem ser tomadas para minimizar a frequência da infecção causada por esses agentes patogênicos. Concordamos com as recomendações de Payne et al. (2020), ressaltando que medidas de controle e prevenção são essenciais para a redução de casos de vaginites. Os resultados encontrados por Payne et al. (2020) diferem substancialmente daqueles obtidos entre mulheres na Baixada Fluminense, e provavelmente condições sociais, ambientais e epidemiológicas influam diretamente no perfil de distribuição dos agentes causadores de vaginites entre essas populações e aquela investigada em nossa pesquisa.
A prevalência de T. vaginalis, Candida albicans e G. vaginalis em mulheres sem sintomas clínicos de vaginite atendidas em consultórios médicos da família na província de Mayabeque, Cuba, foi investigada por Rodriguez et al. (2014). De 179 amostras estudadas 79 foram positivas (44,13%). A candidíase foi a infecção mais frequente, com 45 casos (25,14%), correspondendo a 56,96% do total de dos diagnósticos positivos. A vaginose bacteriana foi diagnosticada em 33 (18,44%) examinadas, e tricomoníase somente em cinco pacientes (2,79%). Os autores concluíram que há significativo contingente de mulheres com infecções vaginais apesar de apresentarem-se assintomáticas. É possível que situação semelhante aconteça na Baixada Fluminense, ainda carente de investigação.
Bonfati e Gonçalves (2010) estudaram a prevalência de G. vaginalis, Candida spp. e T. vaginalis em exames citopatológicos de gestantes atendidas no Hospital Universitário de Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. Examinaram 1.344 laudos e observaram que 59,82% das pacientes apresentaram flora bacteriana normal, ou seja, constituída por Lactobacillus spp. O total da flora encontrada foi 40,17%, com 38,24% de G. vaginalis, 33,75% de Candida albicans e 5,92% de T. vaginalis. As autoras chamaram a atenção para a possibilidade dessas infecções estarem associadas a complicações na gestação, pois os resultados encontrados mostraram prevalência elevada de agentes patogênicos nas pacientes, e ressaltaram a importância do acompanhamento pré-natal para o diagnóstico e tratamento adequados a fim de evitar possíveis complicações aos conceptos. Colocações válidas para a Baixada Fluminense.
Vasconcelos et al. (2010) realizaram pesquisa documental e retrospectiva que envolveu mulheres atendidas no centro de saúde da família na cidade de Fortaleza, Ceará, Brasil e identificaram nos exames colpocitológicos que afecções vaginais sugestivas de processo inflamatório eram causadas por G. vaginalis (25,3%), Candida albicans (10,2%) e T. vaginalis (3,1%), que se identifica com os resultados encontrados agora para a Baixada Fluminense.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O maior casuísmo de vaginites está na faixa de idade de mais de 45 anos, e dos 15 aos 24 anos, portanto onde deverá acontecer maior atenção. Consideramos que todas as mulheres devem submeter-se a controles periódicos com o ginecologista e realizar exames ginecológicos de secreções vaginais para que seja realizado o diagnóstico precoce e tratamento específico para o agente etiológico diagnosticado. É recomendável maior atenção para as mulheres adolescentes entrando em atividade sexual, e as de mais de 45 anos que podem estar descuidando das ações de saúde ginecológica.
REFERÊNCIAS
ABDUL-AZIZ, M.; MAHDY, M. A. K.; ABDUL-GHANI, R.; AL-ALHILALI, N. A.; AL-MUJAHED, L. K. A.; AL-ALABSI, S. A. Bacterial vaginosis, vulvovaginal candidiasis and trichomonal vaginitis among reproductive-aged women seeking primary health care in Sana’a city, Yemen. BMC Infectious Diseases, v. 19, p. 879, 2019.
ANDRADE, S. S. C.; SILVA, F. M. C.; OLIVEIRA, S. H. S.; LEITE, K. N. S.; COSTA, T. F.; ZACCARA, A. L. L. Agentes microbiológicos de vulvovaginites identificados pelo Papanicolaou. Revista de Enfermagem da UFPE, v. 8, n. 2, p. 338-345, 2014.
BONFATI, G.; GONÇALVES, T. L. Prevalência de Gardnerella vaginalis, Candida spp. e Trichomonas vaginalis em exames citopatológicos de gestantes atendidas no hospital de Santa Maria, RS. Revista de Saúde Santa Maria, v. 36, n. 1, p. 37-46, 2010.
HERNÁNDEZ-RÍOS, E. Prevalencia de vaginitis y vaginosis bacteriana en personal policial de la província de Ica, Peru. Revista Médica Panacea, v. 1, n. 2, p. 40-43, 2011.
NEVES, D. P.; MELO, A. L.; LINARDI, P. M.; VITOR, R. W. A. Parasitologia Humana. Ed Atheneu, Rio de Janeiro, 2016.
PAYNE, V. K.; CÉCILE, T. F.; CEDRIC, Y.; NADIA, M. A. C.; JOSÉ, O. Risk factors associated with prevalence of Candida albicans, Gardnerella vaginalis and Trichomonas vaginalis among women at the District Hospital of Dschang, west region, Cameroon. International Journal of Microbiology. Disponível em: DOI 10.1155/2020/8841709, 2020. Acessado em 18 de setembro de 2020.
RODRÍGUES, M. L.; REYES, O. G.; MIRANDA, L. S.; LIMIA, O. C. Prevalência de Trichomonas vaginalis, Candida albicans y Gardnerella vaginalis en mujeres sin sintomas de vaginitis. Revista Ciencias Medicas La Habana, v. 20, n. 2, p. 164-174, 2014.
VASCONCELOS, C. T. M.; NETO, J. A. V.; CASTELO, A. R. P.; MEDEIROS, F. C.; PINHEIRO, A. K. B. Analysis of coverage and of the pap test exams not retired of a Basic Health Unit. Revista de Enfermagem USP, v. 44, n. 2, p.: 323-328, 2010.
COMISSÃO ORGANIZADORA E CIENTÍFICA
FACULDADE METROPOLITANA SÃO CARLOS
Avenida Governador Roberto Silveira, nº 910
Bom Jesus do Itabapoana-RJ CEP: 28.360-000
Site: www.famescbji.edu.br
Telefone: (22) 3831-5001
O conteúdo de cada trabalho é de responsabilidade exclusiva dos autores.
A reprodução dos textos é autorizada mediante citação da fonte.