EFEITOS DO USO PROLONGADO DO OMEPRAZOL EM IDOSOS
SOUSA, Lucas Rangel de Almeida
Acadêmico do 4º período de Medicina da Faculdade Metropolitana de São Carlos
lucas.srangel14@gmail.com
SIQUEIRA, Maria Clara Teixeira
Acadêmico do 4º período de Medicina da Faculdade Metropolitana de São Carlos
mclaratsiqueira@gmail.com
ISTOÉ, Carolina Crespo
Doutoranda do Programa de Ciências Aplicadas à Produtos da Saúde da Universidade Federal Fluminense – Professora de Farmacologia do curso de Medicina da Faculdade de Metropolitana de São Carlos
carolcistoe@yahoo.com.br
MANGIAVACCHI, Bianca Magnelli
Doutora em Biociências e Biotecnologia pela Universidade Estadual
do Norte Fluminense Darcy Ribeiro – Coordenadora do Ciclo Básico do curso de Medicina da Faculdade Metropolitana de São Carlos
bmagnelli@gmail.com
INTRODUÇÃO
O envelhecimento é um processo humano natural e com isso há o declínio de funções físicas, fisiológicas e mentais do indivíduo. Assim, cada vez mais as pessoas precisam de medicamentos para lidar com algumas etapas desse processo. Entretanto, o uso indiscriminado de fármacos pode acabar por afetar a qualidade de vida, principalmente, dos idosos.
Destaca-se aqui o omeprazol, o primeiro inibidor de bomba de prótons comercializado. Este, além de ser um medicamento amplamente prescrito, é um fármaco que os idosos utilizam de forma descontrolada, sem um acompanhamento médico adequado. Ao mesmo tempo, eles também são a população mais vulnerável aos riscos advindos do uso irracional deste medicamento, já que nessa fase da vida o aparecimento de doenças crônicas é bem comum, o que favorece a polifarmácia e aumenta os desafios do controle das interações medicamentosas.
Este é um grande tópico de discussão que necessita de uma atenção meticulosa a fim de delinear com acurácia o ponto terapêutico do uso ao longo prazo do omeprazol.
METODOLOGIA
A metodologia utilizada para o desenvolvimento deste trabalho foi uma revisão integrativa bibliográfica de artigos, livros e revistas cientificas compilados a partir de sites de busca online como google acadêmico, scielo e pubmed no período de 2015 a 2020 utilizando os descritores uso crônico do omeprazol, efeitos do uso do omeprazol e utilização do omeprazol pelos idosos.
DESENVOLVIMENTO
No Brasil, o omeprazol, é um medicamento comercializado e dispensado sem a necessidade de uma prescrição médica, de acordo com a regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (SALGADO et al., 2019).
A automedicação é uma prática comum no Brasil, e o uso irrestrito e irresponsável, de alguns medicamentos, entre esses o omeprazol, torna-se habitual, uma vez que é possível comprar com facilidade este medicamento em farmácias sem a presença de receita médica (PIMENTA et al., 2016). Segundo De Lima, Dal Fabbro e Funayama (2019) o omeprazol é um medicamento listado como essencial pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e é amplamente prescrito, muitas vezes de forma equivocada, tanto na Atenção Básica de Saúde quanto no ambiente hospitalar.
Liotti e Ambrosio (2015) destacam que o maior desafio do uso do omeprazol está ligado a utilização indiscriminada e prolongada desse fármaco com a justificativa de prevenir lesões estomacais por uso excessivo de outros medicamentos. Junta-se a essa problemática, a polifarmácia, muito prevalente na população idosa em decorrência do surgimento de várias doenças crônicas e por essa população ser mais suscetível à problemas agudos, como infecções.
Estudos apontam que a utilização do omeprazol pode provocar alterações na mucosa gástrica, interferindo na absorção de vitaminas e minerais importantes para o organismo, como por exemplo a vitamina B12, o ferro, o cálcio e o magnésio. O déficit desses complexos pode ocasionar no paciente anemia, pneumonia e infecções entéricas, e recentemente, com quadros de depressão. Além disso, o uso deste medicamento também está relacionado a doenças renais, como nefrite intersticial aguda, doença renal aguda e mais recentemente doença renal crônica (SALGADO et al., 2019).
O omeprazol cuja administração ocorre principalmente por via oral, é um medicamento pertencente à classe dos inibidores da bomba de prótons (IBPs). Por ser um fármaco que se degrada rapidamente em um pH ácido, ele é comercializado em cápsulas revestidas (RANG e DALE, 2020). É absorvido no intestino, atinge a circulação e alcança as células parietais, local em que exercerá sua ação. Seu funcionamento consiste na inibição de forma irreversível e seletiva da enzima H+/K+ ATPase. Essa inibição tem como efeito o bloqueio da liberação de ácido clorídrico (HCl) pelas células parietais do epitélio estomacal, até que novas enzimas sejam sintetizadas, tendo como consequência final a diminuição da acidez gástrica de até 95% (PIMENTA et al., 2016).
Outros medicamentos que também pertencem a mesma classe do omeprazol são lansoprazol, pantoprazol, rabeprazol e esomeprazol, sendo que, dentre todos esses medicamentos, o omeprazol, o medicamento mais prescrito, sendo usado no tratamento da doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), esofagite erosiva associada com DRGE, condições hipersecretórias, em tratamento de distúrbios causados pelo uso de AINEs, úlceras pépticas e terapia da erradicação de Helicobacter pylori. Essa classe de fármacos tem poucos efeitos adversos, mas devem ser usados com cautela devido aos efeitos de longo prazo devido a supressão ácida (PIMENTA et al., 2016).
Os IBPs são pró-fármacos, precisam de um meio ácido para serem ativados, espalham-se pelas células parietais do estômago depois da absorção por via oral e acumulam-se nos canalículos secretores de ácidos (DE BARROS et al., 2020). Neste local são ativados através da formação de uma sulfenamida tetracíclica catalisada em meio ácido, a sulfenamida associa de modo covalente com os grupos sulfidrilas da bomba de prótons, causando inibição da sua atividade de forma irreversível. O omeprazol é uma mistura racêmica de isômeros R e S, C17H19N3O3S é a sua fórmula estrutural empírica, apresenta peso molecular de 345,42 g/mol, é uma base fraca lipofílica, pouco solúvel em água e apresenta-se na forma oral ou endovenosa para terapia relacionada a distúrbios da acidez gástrica (PIMENTA et al., 2016).
O omeprazol, na sua primeira passagem sistêmica, é metabolizado intensamente pelas enzimas do citocromo P450 hepáticas, principais enzimas responsáveis pela metabolização desse IBP. A sua absorção ocorre no intestino por causa que as cápsulas são revestidas por pellets que não permitem a degradação pelo ácido estomacal, tem uma biodisponibilidade de 40 a 65%, meia-vida de 30 a 60 minutos, entretanto, a secreção gástrica é inibida por cerca de 24 horas (PIMENTA et al., 2016).
De acordo com Rang e Dale (2020), doses aumentadas do omeprazol causam uma elevação desproporcional da sua concentração plasmática, pois o efeito inibitório da secreção ácida acaba por melhorar a própria biodisponibilidade do fármaco. Quando ele está distribuído pela circulação sanguínea, o alvo do omeprazol é chegar ao interior das células parietais e depois para os canalículos, local em que sofre ativação e realiza a inibição da bomba de prótons.
De Lima, Dal Fabbro e Funayama (2019) destacam ainda que o omeprazol pode elevar a concentração sanguínea de alguns medicamentos, tais como metotrexato, cilostazol, utilizados para tratamento de câncer e acidente vascular cerebral respectivamente. Também podem diminuir o efeito de alguns inibidores de proteases, como o atazanavir e nelfinavir, gerando efeitos nocivos ao organismo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Salienta-se algumas disposições dos malefícios do uso contínuo e prolongado do omeprazol a fim de reflexão e debate. O uso contínuo do omeprazol aumenta cerca de quatro vezes as chances de desenvolvimento de pólipos glandulares fúndicos, sendo associado à hiperplasia, à hipertrofia das células parietais e o surgimento de cistos glandulares (DE LIMA, DAL FABBRO e FUNAYAMA, 2019). Além disso, vale destacar que ácido clorídrico, pepsinogênio, fatores intrínsecos e muco estão localizados no corpo e no fundo gástrico e são secretados pelas glândulas oxínticas, sendo que com o uso prolongado do omeprazol, mudanças proliferativas de mucosa oxíntica podem ocorrer e os IBPs também estão relacionados com o aparecimento de tumores carcinóides (PIMENTA et al., 2016).
Como bem preceitua De Barros Filhos et al. (2020), o uso de IBPs de forma prolongada ou profilática na área hospitalar foi associado a um aumento na mortalidade, por causa que seu uso altera a homeostasia da secreção gástrica possibilitando maiores chances de uma infecção. Além disso, a administração desse medicamento não promove a cura da patologia, mas somente causa o alívio dos sintomas apresentados pelo paciente.
Ademais, o omeprazol diminui a absorção da cobalamina (vitamina B12), já que altera o ciclo do pepsinogênio, devido a redução da acidez gástrica visto que é necessário um ambiente ácido para que o pepsinogênio seja transformado em pepsina. E esta última por sua vez é responsável por retirar a vitamina B12 contida nos alimentos ingeridos. Sendo assim, nos idosos que já possuem atrofia gástrica e infecção por Helicobacter pylori, a concentração sérica de vitamina B12 pode diminuir devido ao uso crônico de omeprazol, podendo ocasionar anemia megaloblástica, mudanças no processo proliferativo dos eritrócitos e risco aumentado de demência e doença de Alzheimer (PIMENTA et al., 2016).
A modificação na secreção de ácido gástrico ocasiona também a diminuição da absorção de cálcio. Isso ocorre porque grande parte do cálcio presente no organismo está na forma de sais insolúveis em água e a solubilidade do cálcio é dependente da acidez, sendo assim, a dissolução e absorção do cálcio diminui com o aumento do pH gástrico devido ao uso do omeprazol (SALGADO et al., 2019). Com isso, tem-se um aumento no risco de fraturas osteoporóticas e não osteoporóticas, principalmente nos idosos que costumam apresentar níveis baixos de cálcio devido dieta pobre e mudanças fisiológicas. Esse risco é diretamente proporcional ao tempo de uso e a dose utilizada do omeprazol (LIOTTI e AMBROSIO, 2020).
Lembrando que é comum o idoso apresentar uma deficiência na absorção de vitaminas e sais minerais, o que aumenta ainda mais o alerta quanto ao risco do uso desse medicamento sem o acompanhamento adequado (PIMENTA et al., 2016). Outro fator importante que deve ser levado em consideração é que a eliminação de fármacos em idosos é menos eficiente, sendo assim, alguns medicamentos podem ter duração prolongada ou efeitos maiores. Para mais, a composição corpórea do idoso assim como a sensibilidade aumentada também são importantes fatores que precisam ser observados ao prescrever um medicamento para essa faixa etária, pois esses tópicos interferem na distribuição e absorção dos fármacos (RANG e DALE, 2020).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por fim, constata-se que são muitos os efeitos advindos do uso indiscriminado e prolongado do omeprazol, principalmente nos idosos, visto que essa população já apresenta, devido ao processo de envelhecimento, mudanças fisiológicas que dificultam processos de absorção e metabolização de substâncias. Além do mais, são indivíduos que costumam usar muitos medicamentos, o que favorece a ocorrência de interações medicamentosas com o omeprazol, ocasionando desfechos desfavoráveis para o paciente.
Destaca-se então a importância de um olhar mais atento nas práticas médicas sobre o uso do omeprazol pelo fato de que o hábito da prescrição desse medicamento tornou-se comum e automático para alguns profissionais. Ainda sim é necessária a elucidação do assunto para os pacientes, de modo que as pessoas, no geral, compreendam fatores integrais de curto e longo prazo que possam afetar a saúde, principalmente as faixas etárias mais vulneráveis a problemas relacionados à farmacoterapia, como os idosos. E, por conseguinte, diminuir a incidência da polifarmácia e iatrogenia nessa faixa etária com um controle apropriado no uso de medicamentos.
REFERÊNCIAS
DE BARROS FILHO, A. J. et al. Infecções hospitalares relacionadas ao uso de inibidores da bomba de prótons. Brazilian Journal of Development, v. 6, n. 5, p. 25929-25944, 2020.
DE LIMA, J. M.; DAL FABBRO, A. L.; FUNAYAMA, A. R. Uso do Omeprazol: Estudo Descritivo de Pacientes Idosos de uma Unidade de Saúde da Famílisa (USF) de Ribeirão Preto, SP, Brasil. Infarma-Ciências Farmacêuticas, v. 31, n. 1, p. 46-53, 2019.
LIOTTI, A. C. C.; AMBROSIO, P. A. Riscos da má absorção de vitamina B12 e cálcio causados pelo uso prolongado do omeprazol em idosos. Revista Acadêmica Oswaldo Cruz. 2015. Disponível em: <http://revista.oswaldocruz.br/Content/pdf/Edicao_16_LIOTTI_Ana_Caroline_Costa.pdf> Acesso em: 12 set. 2020.
PIMENTA, L. R. S. et al. Uso Indiscriminado De Omeprazol Em Idosos E A Importância Da Atenção Farmacêutica. Revista de Trabalhos Acadêmicos Universo Goiânia, 2016. Disponível em: <https://oswaldocruz.br/revista_academica/content/pdf/Edicao_23_DALBIA_BATISTA_MOTA.pdf> Acesso em: 20 set. 2020
RANG, H. P.; DALE, M. M.; RITTER, J. M.; FLOWER, R. J.; HENDERSON G. Rang & Dale Farmacologia. 9ª edição. Rio de Janeiro, Elsevier, 2020.
SALGADO, A. L. et al. Uso indiscriminado de inibidores da bomba de prótons em receituários de medicamentos de uso contínuo/Indiscriminate use of proton pump inhibitors in continuous use drug prescriptions. Brazilian Journal of Health Review, v. 2, n. 6, p. 5883-5897, 2019. Disponível em: < https://www.brazilianjournals.com/index.php/BJHR/issue/view/72> Acesso em: 15 set 2020
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