INTRODUÇÃO
Em março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou um alerta de pandemia, devido ao novo vírus SARS-CoV-2, causador da doença Coronavírus Disease-19 (COVID-19). Os primeiros casos COVID-19 ocorreram no mês de dezembro de 2019, na cidade chinesa de Wuhan e em poucos meses disseminou-se rapidamente pelo mundo.
Segundo dados divulgados pela Universidade Johns Hopkins, atualmente 29.751.156 casos globais de COVID-19 foram confirmados (dados de setembro de 2020). Nesse ranking mundial, o Brasil ocupa o terceiro lugar em número de casos confirmados da doença com aproximadamente 4.419.083 casos registrados (HOPKINS, 2020).
O SARS-CoV-2 possui alta virulência e sua principal via de transmissão se dá através do contato com secreções das vias aéreas de pessoas infectadas. As apresentações clínicas desta doença são variáveis, visto que os sintomas vão desde febre e mialgia até complicações respiratórias graves (SANTOS et al., 2020). Atualmente, não há um fármaco específico ou vacina para o tratamento da COVID-19 (RIBEIRO et al., 2020).
Nesse cenário, normas de isolamento social foram estabelecidas pelos órgãos de saúde, a fim de minimizar a propagação viral. Essas mudanças, geraram impactos significativos na saúde mental das famílias, por conseguinte, afetando as crianças e os adolescentes (GASTAUD et al., 2020). Nesse período, apenas os serviços essenciais foram mantidos e muitas instituições fecharam, como: comércios, igrejas e escolas. Tais atos, alteraram abruptamente a rotina familiar. Por certo, as crianças não se encontram indiferentes a situação atual, mas eles assimilam os fatos de forma diferente dos adultos (MAGALHÃES et al., 2020). Os pais/cuidadores não possuem a capacidade para reconhecer, atender e lidar perante as demandas emocionais desses indivíduos.
Logo, apesar da menor susceptibilidade às formas graves da COVID-19, as crianças são os de indivíduos considerado os mais afetados psicologicamente, pois se encontram em uma fase de desenvolvimento onde ocorrem inúmeras transformações, físicas, sociais e psicológicas, e somado a isso são dependentes de seus familiares e amigos (LINHARES; ENUMO, 2020).
Nesse sentido, este trabalho busca descrever os comportamentos positivos relacionados a saúde mental das crianças e adolescentes durante a pandemia da COVID-19, através da análise de informações disponíveis, até o presente momento, destacando-se os principais efeitos psicológicos gerados pelas medidas de isolamento social, bem como a influência destes contextos no desenvolvimento saudável.
MATERIAIS E MÉTODOS
Este estudo é de caráter explicativo, pois objetiva elucidar as estratégias promotoras de saúde mental para crianças e adolescentes durante a pandemia da COVID-19. Trata-se de uma revisão de literatura, em que foram utilizadas as seguintes etapas para a sua elaboração: escolha do tema, seleção dos artigos, análise dos materiais coletados, avaliação e exposição dos resultados obtidos.
Realizou-se uma busca de artigos nas bases de dados Google Scholar e Portal Regional da BVS (Biblioteca Virtual em Saúde). Os descritores aplicados foram “saúde mental”, “COVID-19” e “crianças”, incluindo os filtros “texto completo”, “infecção por coronavírus” e “saúde mental”. Totalizaram-se 1405 artigos encontrados, contudo, somente 8 foram selecionados.
Para tal seleção, utilizaram-se os respectivos critérios de inclusão: (1) artigos disponíveis gratuitamente na integra, (2) títulos relacionados com o tema e (3) escritos em português. Ademais, aplicaram-se os seguintes parâmetros de exclusão: textos inconclusivos, trabalhos sem associação com o tema, editoriais, cartas ao leitor, dissertações, teses e monografias.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os trabalhos selecionados nesse estudo encontram-se na tabela 1. Percebeu-se que as medidas de isolamento social, com objetivo de mitigar a contaminação pelo novo coronavírus, geraram mudanças drásticas sobre crianças e adolescentes segundo todos os trabalhos avaliados.
Tabela 1: Artigos selecionados para a construção dos resultados
TÍTULO DO ARTIGO | AUTORES |
O olhar das crianças/adolescentes sobre a pandemia Covid-19 e a psicologia. | ALCOBIA et al., 2020 |
Pandemia de COVID-19: guia prático para promoção da saúde mental de crianças e adolescentes. | ALMEIDA et al., 2020 |
Os efeitos da pandemia de covid-19 na saúde mental das crianças. | DUTRA et al.,2020 |
Como cuidar da saúde mental das crianças em quarentena? | GASTAUD et al. 2020 |
Reflexões baseadas na Psicologia sobre efeitos da pandemia COVID-19 no desenvolvimento infantil. | LINHARES; ENUMO, 2020 |
Isolados e conectados: atendimento psicossocial de crianças e seus familiares em tempo de distanciamento social. | PEREIRA et al., 2020 |
Saúde Mental na Perspectiva do Enfrentamento à COVID-19: Manejo das Consequências Relacionadas ao Isolamento Social. | RIBEIRO et al., 2020 |
Saúde mental de crianças e seus cuidadores diante da pandemia da COVID-19. | SANTOS et al., 2020 |
As crianças estão mais vulneráveis diante as mudanças e transformações que ocorrem no ambiente a sua volta, causando alterações fisiológicas e comportamentais, como alterações de humor, transtornos alimentares, distúrbios do sono e problemas na comunicação e relação interpessoal (SANTOS et al., 2020).
As dificuldades financeiras enfrentada pelas famílias em virtude da pandemia e o adoecimento ou morte de parentes podem causar o surgimento de sentimentos como insegurança e desamparo (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2020). Mediante a isso, a elaboração de orientações sobre o manejo do público pediátrico durante a pandemia, se faz importante na busca da preservação da saúde mental especialmente desse grupo (ALCOBIA et al., 2020).
Os processos proximais, ou seja, àqueles referentes ao contato direto do indivíduo com outros sujeitos, objetos e símbolos corroboram de maneira significativa para o desenvolvimento humano. Outrossim, os processos distais, como é o caso das conjunturas de trabalho dos pais ou ainda os princípios e a cultura, ao qual o sujeito está inserido são fatores que atuam de forma mais duradoura, complexa e distribuída no tempo no desenvolvimento da criança seja pelas relações interpessoais seja pelo contexto social. Nessa ótica, é notável a importância da família (LINHARES e ENUMO, 2020).
Determinados meios familiares não apresentam características favoráveis ao bom desenvolvimento infantil, muito pelo contrário, apresentam-se como fatores de risco, com a falta de estímulo ao desenvolvimento psicossocial, maus tratos, displicência, evasão escolar, violência doméstica dentre outros fatores, que com isso, agravam o quadro de saúde mental, se tornando um problema de saúde pública. (EVANS; WACHS, 2010 apud LINHARES; ENUMO, 2020)
Para Dutra (2020, p.294):
O desenvolvimento humano é um processo de aprendizado que ocorre entre o indivíduo e o ambiente sociocultural que o cerca, ou seja, para que sejamos humanos necessitamos do auxílio de outro humano nessa jornada de desenvolvimento e descobrimento.
As relações interpessoais e as brincadeiras auxiliam no desenvolvimento das habilidades psicomotoras, importantes para uma infância saudável (ALCOBIA et al., 2020). Do mesmo modo, a suspensão das aulas presenciais promove perdas significativas, pois no ambiente escolar constroem-se o pensamento crítico, as habilidades comunicativas e o sentimento comunitário (DUTRA et al., 2020). Assim, as crianças e adolescentes necessitam de atenção e cuidados adequados, tendo em vista as sérias repercussões desse afastamento social no seu desenvolvimento cognitivo e comportamental (MAGALHÃES et al., 2020).
Em estudo realizado por Almeida et al. (2020) apresenta-se orientações para ajudar na promoção e cuidado da saúde mental de crianças e adolescentes. Dentre as sugestões mais importantes destacam-se: a determinação de rotinas pelos pais, que vão desde o estabelecimento do horário de dormir e acordar, realização de tarefas escolares aos horários de afazeres domésticos e diversão. Tais ações promovem o aumento do senso de colaboração nas crianças bem como o desenvolvimento de bons hábitos. Ademais, as crianças devem ter um tempo destinado ao brincar livre, como, por exemplo, correr, dançar, desenhar, cantar, fantasiar-se dentre outros (ALMEIDA et al.,2020).
O controle no uso dos equipamentos tecnológicos, como celulares, tablets e computadores, apesar de serem ferramentas de acesso à informação, também são abertas a conteúdos inadequados para a faixa etária, sendo importante a limitação do tempo de uso, preferindo-se o estímulo à substituição das mesmas pelo contato pessoal (ALMEIDA et al., 2020). Outro ponto a ser citado, é a restrição de acesso às notícias, de modo que os pais optem por fontes confiáveis e sempre verifiquem a veracidade das informações. Nesse sentido, é importante avaliar as informações respeitando a ingenuidade e capacidade de compreensão das crianças (ALMEIDA et al.,2020).
Além das estratégias supracitadas, Gastaud et al. apresenta uma outra análise no que diz respeito a mitigar os efeitos nocivos da quarentena em crianças (2020, p.84):
Pensando na quarentena como oportunidade, sugere-se uma dinâmica para ajudar as famílias a se conscientizar dos possíveis ganhos deste período. Todos os dias, cada integrante da família anota pelo menos uma coisa boa que ocorreu durante o dia e coloca todas essas anotações em uma caixa. A “caixa da quarentena” ou “caixa da gratidão” fica um registro simbólico de aspectos positivos desta quarentena, um documento que oficializa o potencial transformador desse trauma e que proporciona uma reflexão focada também nos aspectos positivos.
Nessa perspectiva, o estudo aponta que muitas pessoas afirmam que o ano de 2020 foi perdido. Desse modo, a “caixa” seria, uma forma de tanto os pais, quanto as crianças perceberem e se lembrarem, nos anos seguintes, das coisas boas que existiram, sobretudo nos ganhos referentes ao fortalecimento das relações interfamiliares. Além do mais, isso não diz respeito à uma espécie de “positividade tóxica”, mas sim, de uma forma de focar no positivo. Posto que a experimentação dos sentimentos de raiva e frustração também se faz importante para o desenvolvimento humano, os autores enfocam que devem ser registrados apenas aquilo que propiciou um sentimento verdadeiramente bom (GASTAUD et al. 2020).
Frente ao exposto, vale ressaltar que as orientações visam atender à todas as famílias. No entanto, é sabido que grande parte das famílias brasileiras vivem em vulnerabilidade social, de modo que algumas dessas recomendações não se adequam aos seus contextos domiciliares. Dessa forma, faz-se fundamental a atuação do gestores da saúde em campanhas educativas nos mais diversos meios de comunicação de forma a atingir o maior público possível bem como ofertar recursos financeiros e sanitários, democratizando a promoção do bem-estar mental na infância durante o período de isolamento social (ALMEIDA et al., 2020).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os impactos psicológicos causados pelo isolamento social advindo da COVID-19 podem ser mais intensos durante à infância em detrimento da vida adulta, uma vez que essa é a fase, na qual o sujeito se constrói, necessitando de relações interpessoais para tal desenvolvimento. Assim, o contexto da pandemia torna-se uma oportunidade de progredir a resiliência, ensinando as crianças a lidarem com situações adversas e fortalecendo os laços familiares, bem como o senso de responsabilidade através de hábitos saudáveis.
Diante dessa realidade, medidas de intervenção com enfoque na saúde mental constituem-se fundamentais para o enfrentamento às mudanças irreparáveis que podem ser provocadas pela COVID-19, principalmente nessa faixa etária da população.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
ALCOBIA, I. et al. O olhar das crianças/adolescentes sobre a pandemia Covid-19 e a psicologia. Revista INFAD de Psicología. International Journal of Developmental and Educational Psychology. v. 2, n. 1, p. 249-256, 2020. Disponível em: <encurtador.com.br/ahQR4>. Acesso em: 3 set. 2020.
ALMEIDA, R. S. et al. Pandemia de COVID-19: guia prático para promoção da saúde mental de crianças e adolescentes. Residência Pediátrica, v. 10, n. 2, p. 1-4, 2020. Disponível em: <encurtador.com.br/mrDMZ>. Acesso em: 5 out. 2020.
DUTRA, J. L.C. et al. Os efeitos da pandemia de covid-19 na saúde mental das crianças. Pedagogia em Ação, v. 13, n. 1, p. 293-301, 2020. Disponível em: <encurtador.com.br/hCEG8>. Acesso em: 3 out. 2020.
GASTAUD, M. B. et al. Como cuidar da saúde mental das crianças em quarentena? Pensamento Contemporâneo Psicanálise e Transdisciplinaridade. v. 2, n. 1, p. 79-94, 2020. Disponível em: <encurtador.com.br/kmnJY>. Acesso em: 17 set. 2020.
HOPKINS, University Johns. Coronavirus Resource Center: Global Map, [S. l.], 2020. Disponível em: <coronavirus.jhu.edu/map.html>. Acesso em: 17 set. 2020.
LINHARES, M. B. M.; ENUMO, S. R. F. Reflexões baseadas na Psicologia sobre efeitos da pandemia COVID-19 no desenvolvimento infantil. Estudos de Psicologia (Campinas), v. 37, 2020. Disponível em: <encurtador.com.br/dklxP >. Acesso em: 3 set. 2020.
MINISTÉRIO DA SAÚDE (Brasil). Fundação Oswaldo Cruz. Crianças na Pandemia Covid-19: Saúde Mental e Atenção Psicossocial na Pandemia Covid-19, [S. l.], 8 maio 2020. Disponível em: < encurtador.com.br/ehqwG >. Acesso em: 3 out. 2020.
PEREIRA, M.et al. Isolados e conectados: atendimento psicossocial de crianças e seus familiares em tempo de distanciamento social. Health Residencies Journal-HRJ, v. 1, n. 2, p. 23-43, 2020. Disponível em: <escsresidencias.emnuvens.com.br/hrj/article/view/11>. Acesso em: 3 out. 2020.
RIBEIRO, E. G. et al. Saúde Mental na Perspectiva do Enfrentamento à COVID-19: Manejo das Consequências Relacionadas ao Isolamento Social. Revista Enfermagem e Saúde Coletiva-REVESC, v. 5, n. 1, p. 47-57, 2020. Disponível em: <revesc.org/index.php/revesc/article/view/59>. Acesso em: 17 set. 2020.
SANTOS, M. et al. Saúde mental de crianças e seus cuidadores diante da pandemia da COVID-19. Health Residencies Journal-HRJ, v. 1, n. 5, p. 107-119, 2020. Disponível em: <escsresidencias.emnuvens.com.br/hrj/article/view/14>. Acesso em: 3 out. 2020.
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