CONHECIMENTOS E PERCEPÇÕES DE ESTUDANTES DE MEDICINA EM
RELAÇÃO À CIÊNCIA E AO CONTEÚDO CIENTÍFICO NO CURRÍCULO
BORGES, Thaís Rigueti Brasil
Professora da Faculdade Metropolitana São Carlos
thaisrigueti@gmail.com
RANGEL, Bárbara Andrade Barcelos
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Biociências e Biotecnologia da Universidade Estadual do Norte Fluminense e Graduanda de Medicina da Faculdade de Medicina de Campos
Bolsista CNPq
barbarabarcelosr@gmail.com
DE OLIVEIRA, Júlia Resende
Graduada em Ciências Biológicas na Universidade Estadual do Norte Fluminense e Graduanda de Medicina da Estácio de Sá
resende.cbio@gmail.com
RANGEL, Ana Luísa Ferreira de Rezende
Graduanda de Medicina da Faculdade Metropolitana São Carlos
anarezendemed@gmail.com
RAMOS, Lucas Crizostomo
Graduando de Medicina da Faculdade Metropolitana São Carlos
lucascrizostomo15@hotmail.com
INTRODUÇÃO
As competências científicas são de grande importância para a medicina; não apenas para conduzir pesquisas confiáveis, mas também para uma abordagem profissional mais eficiente (PENÃ & PACO, 2004). Problemas emergentes com consequências potencialmente catastróficas requerem pronta resposta de profissionais da saúde. Exemplos destes incluem a pandemia da COVID-19, surtos de Zika, Dengue, Ebola, Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV), epidemias de influenza, aumento rápido da resistência global aos antibióticos, movimentos anti-vacinas e notícias médicas falsas que podem oferecer riscos à saúde da população (DE CARVALHO & MATEUS, 2018). Para enfrentar esses desafios, não basta que os médicos (as) tenham acesso a conhecimentos científicos atualizados, esses profissionais precisam ser cientificamente rigorosos.
Através de uma pesquisa transversal utilizando questionário on-line, avaliou-se os conhecimentos e atitudes de 127 estudantes de medicina em relação à ciência em 15 instituições de ensino. Foram identificadas as principais fontes de informações científicas, bem como as percepções e atitudes em relação à ciência e a opinião dos participantes sobre o treinamento científico no currículo. Os resultados obtidos neste trabalho fornecem insights sobre a autopercepção, atitudes e fontes de informação dos estudantes de medicina em relação à ciência. Além disso, sugerem melhorias potenciais no treinamento científico no currículo.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi realizada uma pesquisa transversal online durante 25 de setembro e 05 de outubro de 2020 para obter informações sobre os conhecimentos e atitudes de estudantes de medicina em relação à ciência. Além disso, buscou-se entender suas percepções sobre o conteúdo curricular atual e receber sugestões para aprimorar a formação de competências científicas. Os participantes foram contatados através de representantes de estudantes de medicina locais e dos canais de redes sociais, como whatsapp e instagram.
Um instrumento de pesquisa foi desenvolvido utilizando a ferramenta “formulário google” tendo como referência os trabalhos de Penâ & Paco, 2004 e Urquijo-Morales, 2012. A pesquisa cobriu as características, consciência, fontes de informação e conhecimento e percepções dos acadêmicos de medicina relacionadas a ciência. A viabilidade e o tempo necessário para responder à pesquisa foram avaliados em outros 4 participantes. Esses participantes não foram incluídos na pesquisa.
Refinamentos foram feitos conforme necessário para facilitar a melhor compreensão e organizar as questões antes que a pesquisa final fosse distribuída para a população do estudo por meio de um link URL.
O instrumento de pesquisa foi composto por 28 questões fechadas e seu tempo de conclusão foi de aproximadamente 5 minutos. Todas as questões apresentavam respostas em escala do tipo Likert abordando os seguintes tópicos: (i) Fonte de informação científica, (ii) a importância de possuir competências científicas como médico e (iii) a opinião dos alunos sobre o atual sistema de educação médica.
A confidencialidade das informações pessoais foi mantida durante todo o estudo, tornando as informações dos participantes anônimas e pedindo aos mesmos que fornecessem respostas honestas. A participação de estudantes de medicina na pesquisa foi voluntária e não foi compensada. O termo de consentimento eletrônico estava disponível na página inicial da pesquisa.
O questionário foi testado para remover qualquer ambiguidade, em 4 estudantes de medicina, cujas respostas não foram incluídas na análise final dos dados. Algumas pequenas mudanças no texto foram feitas após as respostas do estudo piloto.
DESENVOLVIMENTO
Por muito tempo, a medicina foi baseada apenas em experimentos pessoais, autoridades com títulos acadêmicos e nas teorias fisiopatológicas (ATALLAH et al, 1998). Desde o Relatório Flexner (REGAN-SMITH, 1998 apud PENÃ & PACO, 2004), um objetivo fundamental da educação médica tornou a medicina uma profissão científica. Contudo, sabe-se que a incerteza é congruente à prática médica, por isso a medicina deve ser entendida como uma área interdisciplinar que utiliza a ciência aplicada (PENÃ & PACO, 2004). Sendo assim, a ciência vem impulsionando novos horizontes, traçando novas vertentes que influenciam no diagnóstico, prognóstico e tratamento de pacientes (SILVA et al, 2011).
A pandemia de COVID-19, surtos de Zika, Dengue, Ebola, Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV), epidemias de influenza, aumento rápido da resistência global aos antibióticos, os perigos das notícias falsas na saúde evidenciam os desafios da atuação médica que requerem um profissional capacitado e com respaldo científico (DE CARVALHO & MATEUS, 2018). Além disso, há outro problema crítico que a medicina e a ciência precisam enfrentar neste momento crucial: a propagação de informações imprecisas online e as pseudociências (MESQUITA et al, 2020).
No final de março de 2020, mais de 2.100 iranianos foram envenenados pela ingestão oral de metanol. O Irã, como um país islâmico, tem severas restrições ao álcool, mas, neste caso, pacientes disseram que mensagens de mídia social sugeriram que poderia prevenir a infecção de SARS-CoV-2 pelo consumo de álcool. Quase 900 destes pacientes foram internados na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), e 296 morreram (taxa de mortalidade de 13,5%) (SOLTANINEJAD, 2020).
A notícia falsa de que a vacina contra sarampo, caxumba, rubéola (MMR) causa autismo é uma grande desinformação em saúde pública, este equívoco foi criado por um artigo fraudulento publicado na Lancet (WAKEFIELD et al, 1998). Esta desinformação foi amplamente disseminada na mídia social e, combinada com teorias da conspiração e outras crenças, fortalecendo o movimento antivacinação. Como consequência, em 2020, muitos países, incluindo Reino Unido, Grécia, Venezuela, e o Brasil, perderam seu status de eliminação do sarampo (SWIRE-THOMPSON & LAZERET, 2020; MEDEIROS, 2020).
Diante dos inúmeros desafios de saúde pública enfrentados pelos médicos (a), é pertinente que o currículo do curso de medicina preze pela educação científica. Assim, os estudantes cuja grade curricular promova o entendimento de pesquisa científica, que incentivem a leitura e redação científica, estarão com habilidades e competências necessárias para a atuação profissional. (PIROLA et al, 2020).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No total, 127 estudantes de medicina de 15 Instituições de ensino superior participaram desta pesquisa preliminar. A maioria dos alunos concordou que eles devem conduzir um projeto de pesquisa durante seus estudos, que as instituições de ensino superior devem fornecer formação científica desde o primeiro ano e que a análise crítica de publicações científicas são uma competência fundamental para os médicos. No entanto, os alunos avaliaram suas competências científicas como insatisfatórias, principalmente no que diz respeito a redação científica apesar da maioria receber incentivo a fazer pesquisa e ler artigos científicos em sua instituição.
Os dados da pesquisa também apontaram que 21% dos alunos não tinham certeza sobre a afirmação “A vacina conjunta contra a rubéola, caxumba e sarampo, conhecida como tríplice viral (MMR, na sigla em Inglês), pode provocar o autismo” que é considerada uma notícia falsa. A maioria dos alunos também não tinha certeza sobre a frase “A homeopatia pode ser utilizada como primeira linha de tratamento de algumas doenças crônicas e infecciosas por apresentar ampla comprovação científica”. O que evidencia as incertezas dos estudantes sobre assuntos que exigem competências científicas.
As competências científicas são essenciais para todos os futuros profissionais da saúde. O treinamento apropriado durante os estudos médicos deve fornecer aos alunos o conhecimento e habilidades necessárias para coletar e interpretar resultados de pesquisas, bem como realizar pesquisas por conta própria. Além disso, faz-se de grande importância motivar os alunos a participarem de pesquisas científicas durante a prática clínica, matricular-se em programas de pós-graduação stricto-sensu, preocuparem-se com a divulgação científica e o combate às notícias falsas ou mesmo considerar a carreira de cientista (clínico).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse estudo fornece insights sobre a autopercepção dos estudantes de medicina em relação à ciência, e faz recomendações para melhorias potenciais no treinamento científico no currículo. O estudo demonstra que as competências científicas são de grande importância para os estudantes de medicina. Os alunos não carecem de motivação para a prática científica e têm inúmeras ideias para melhorar as oportunidades de ensino científico. Portanto, os resultados sugerem que a formação científica deve seguir uma abordagem holística baseada em três pilares: (i) um currículo científico básico, (ii) projetos de pesquisa intracurriculares e (iii) programas especiais de pesquisa para estudantes fortemente interessados ??em pesquisa médica.
REFERÊNCIAS
ATALLAH, Alvaro Nagib; CASTRO, Aldemar Araujo. Medicina baseada em evidências: o elo entre a boa ciência e a boa prática. Revista da imagem; v.20, n.1, p. 5-9, 1998.
DE CARVALHO, Mariana Freitas Canielo; MATEUS, Cristielle Andrade. Fake news e desinformação no meio digital: análise da produção científica sobre o tema na área de ciência da informação. Múltiplos Olhares em Ciência da Informação, v. 8, n. 2, 2018.
MEDEIROS, E. A. S. Entendendo o ressurgimento e o controle do sarampo no Brasil. Acta Paul Enferm, 2020.
MESQUITA, C. T; OLIVEIRA, A.; SEIXAS, F.L.; PAES, A. Infodemia, Fake News and Medicine: Science and The Quest for Truth. Int J Cardiovasc Sci. 2020.
PENÃ, A.; PACO, O. Attitudes and Views of Medical Students toward Science and Paseudoscience. Med Educ Online; v.9, n.4, 2004.
PIROLA, Sarah Beatriz de França Bortolato et al. A importância da iniciação científica na graduação de medicina. Revista Corpus Hippocraticum; v.1, n.1, 2020.
REGAN-SMITH M. Reform without change: update. Acad Med; v. 73, p. 505-507, 1998.
SILVA, Simone Cerqueira et al. As contribuições da ciência do desenvolvimento para a psicologia da saúde. Ciência & Saúde Coletiva; v.16, n.1, p. 1599-1609, 2011.
SOLTANINEJAD K. Methanol Mass Poisoning Outbreak: A Consequence of COVID-19 Pandemic and Misleading Messages on Social Media. Int J Occup Environ Med.; v. 11, n. 3, p. e1–e3, 2020.
SWIRE-THOMPSON B., LAZER D. Public Health and Online Misinformation: Challenges and Recommendations. Annu Rev Public Health.; v.41, n. 1, p. 433–451, 2020.
WAKEFIELD A.J, MURCH S.H, ANTHONY A., LINNELL J., CASSON D.M., MALIK M. et al. Hiperplasia linfóide-nodular ileal, colite inespecífica e transtorno invasivo do desenvolvimento em crianças. Lanceta. n. 351, p. 637–41. 1998.
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