GLICOCORTICÓIDES E O DESENVOLVIMENTO DA SÍNDROME DE CUSHING
INTRODUÇÃO
Os glicocorticóides são esteróides derivados do colesterol e desempenham várias funções no organismo. Esses esteróides estão relacionados ao metabolismo de carboidratos e gorduras, além de participar da supressão do sistema imune, atuando como anti-inflamatório. (GUYTON; HALL, 2017)
A síndrome de cushing (SC) é uma condição incomum associada à exposição prolongada e exagerada a glicocorticóides. O desenvolvimento do quadro clínico da SC pode ser tanto de origem endógena quanto exógena. No entanto, a forma exógena é mais frequente, e se caracteriza pelo uso de doses altas de glicocorticóides (ANDRADE, 2015). A forma endógena, por sua vez, refere-se a perda do controle de feedback negativo do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal ou a alteração no ciclo circadiano em relação a produção de cortisol (DAMASCENO et al., 2019).
A SC endógena pode ser subdividida ainda em hormônio adrenocorticotrófico dependente e ACTH-independente. Em relação a esses dois grupos, a ACTH-dependente é mais frequente, e é desencadeada, geralmente, por um adenoma corticotrófico que secreta ACTH, estimulando assim a síntese de cortisol pela adrenal. Já a ACTH-independente é causada normalmente por um tumor benigno na adrenal que produz de forma autônoma o cortisol e por mecanismo de feedback negativo suprime a liberação de ACTH pela hipófise anterior, levando a atrofia das células adrenocorticais (DAMASCENO et al.,2019).
Ademais, a SC está intimamente relacionada a complicações sistêmicas que levam ao desenvolvimento de doenças graves e ao crescimento de mortalidade mesmo após a remissão. As complicações mais comuns da síndrome são hipertensão e obesidade, além de reduzida qualidade de vida em relação à saúde (SCHERNTHANER-REITER et al., 2018). No entanto, pesquisas recentes mostram que pode haver uma correlação também da SC com lesões neurológicas (SANTOS et al., 2015) e com a COVID 19 (PIVONELLO et al.,2020).
O presente trabalho, portanto, tem como objetivo explanar sobre a síndrome de cushing, dando ênfase ao metabolismo dos glicocorticóides e a correlação da SC com outras comorbidades.
METODOLOGIA
Esse trabalho é uma revisão de literatura narrativa de cunho exploratório e qualitativo. Elaborado a partir de pesquisa nas bases de dados da BVS e no livro Tratado de Fisiologia Médica, com coleta de dados nos períodos entre 03/09/2020 até 09/09/2020. As palavras-chaves utilizadas foram “Síndrome de Cushing and Glicocorticoides” e “ Síndrome de Cushing and hipertensão”. Foram critérios de inclusão: artigos com textos completos, publicados nos últimos 5 anos (2015-2020) e nos idiomas português e inglês.
Ao total foram encontrados 152 artigos nas bases de dados da BVS, utilizando as palavras-chaves e os critérios mencionados. Observou-se após a leitura dos títulos e dos resumos que muitos não faziam parte do objetivo deste estudo. Assim, foram selecionados 4 artigos e um TCC para a elaboração do trabalho.
DESENVOLVIMENTO
A síndrome de cushing é provocada pelo excesso de glicocorticóides no organismo. O hipercortisolismo pode ocorrer por vários fatores, tais como: adenoma hipofisário, causando grande secreção de ACTH e consequente aumento na secreção de cortisol pela adrenal; adenomas no córtex da adrenal; hiperatividade do hipotálamo com aumento anormal na secreção de hormônio liberador de corticotropina, levando ao aumento de ACTH; e produção ectópica de ACTH por algum tumor em outra parte do corpo (GUYTON; HALL, 2017).
No entanto, a síndrome de cushing é geralmente associada à administração de glicocorticóides por motivos terapêuticos, por longo período de tempo. Uma característica frequente dessa condição é a mobilização de gordura da região inferior do corpo e a posterior deposição nas regiões torácica e abdominal. O excesso de esteroides causa ainda face edematosa e devido a alguns efeitos androgênicos de alguns dos hormônios pode surgir acne e hirsutismo (GUYTON; HALL, 2017).
Tendo em vista as várias ações dos glicocorticóides, no metabolismo da glicose o cortisol estimula a gliconeogênese pelo fígado. Isso se dá através da sua ação aumentando as enzimas que catalisam a conversão de aminoácidos em glicose; da mobilização de aminoácidos a partir dos tecidos extra-hepáticos, especialmente dos músculos; e dos seus efeitos antagônicos ao da insulina para inibir a gliconeogênese. O cortisol, ainda reduz a utilização celular de glicose por meio do seu efeito na translocação dos transportadores de GLUT4 para a membrana celular, especialmente nas células do músculo esquelético. Consequentemente, há uma elevação da concentração sanguínea de glicose (GUYTON; HALL, 2017).
Já no metabolismo das gorduras, os glicocorticóides atuam mobilizando as reservas de ácidos graxos do tecido adiposo. Essa mobilização tem como resultado a elevação de ácidos graxos livres no plasma, aumentando também sua utilização para geração de energia. No entanto, apesar do cortisol estar envolvido com a mobilização de ácidos graxos, em algumas pessoas que apresentam exposição exacerbada ao cortisol, no caso, por exemplo, dos portadores da Síndrome de Cushing, ocorre um tipo específico de obesidade com deposição de gordura preferencialmente no tórax e na cabeça, gerando sinais clínicos conhecidos como “giba de búfalo” e “face em lua cheia” (GUYTON; HALL, 2017).
Não menos importante, os glicocorticóides atuam no bloqueio da inflamação. Esse bloqueio ocorre através da ação do cortisol em etapas fundamentais do processo inflamatório. Dessa forma, o cortisol atua na diminuição da permeabilidade dos capilares, na redução da migração de leucócitos para a região inflamada, assim como na redução da proliferação das células de defesa, os linfócitos (GUYTON; HALL, 2017).
Mediante as diferentes ações do cortisol, torna-se evidente que quando em excesso no organismo pode desenvolver várias alterações fisiopatológicas. Logo, entre todos os agravos que acompanham a síndrome de Cushing - dislipidemia, resistência à insulina, lesões de pele, diabetes mellitus, depressão- o ganho de peso é o mais comum, presente em até 82% dos casos, sendo a obesidade descrita em aproximadamente 40% e o sobrepeso em 21-48% dos pacientes. No entanto, a hipertensão é a comorbidade mais prevalente, conhecida como comorbidade de apresentação, presente em 50-85% dos pacientes com a síndrome (SCHERNTHANER-REITER et al., 2018).
Por conseguinte, foi notado que lesões de substância branca são frequentes em imagens de ressonância magnética do cérebro de pacientes com risco cardiovascular aumentado. Tendo em vista que a SC está associada ao aumento do risco cardiovascular, pacientes com SC, portanto, estão suscetíveis a desenvolver alterações neuropsicológicas, envolvendo principalmente a memória (SANTOS et al., 2015).
Outra relação importante de ser ressaltada é o curso clínico da covid-19 em portadores da SC. Por um lado, a tendência é de que esses portadores desenvolvam a forma grave da doença, já que tendem a apresentar os fatores de risco para a COVID-19, como hipertensão, diabetes, obesidade. Por outro lado, os glicocorticóides em excesso estão relacionados à imunossupressão profunda, reduzindo a explosão de citocinas comum nos casos graves da COVID-19. Dessa forma, portadores de SC podem ter menor probabilidade de desenvolver a síndrome respiratória aguda grave (PIVONELLO et al.,2020).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, este trabalho elucida os fatores que causam a Síndrome de Cushing, classificados quanto sua origem endógena e exógena. Sendo esta última mais comum e relacionada a administração de glicocorticóides. Desse modo, o objetivo principal é esclarecer sobre a SC, enfatizando as diferentes atuações dos glicocorticóides no metabolismo e a íntima relação da síndrome com doenças como obesidade, hipertensão, lesões neurológicas, assim como com a atual COVID-19. Para tanto, foram reunidos revisões literárias que abordam sobre o tema, buscando informar e ampliar o conhecimento dos profissionais da área da saúde e dos demais interessados.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Neyla Beatriz Costa. SÍNDROME DE CUSHING ACTH DEPENDENTE POR PRODUÇÃO ECTÓPICA DE ACTH: RELATO DE CASO. Orientador: Daniela Yone Veiga Iguchi Perez. 2015. 33 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Residência de Clínica Médica) - Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo, São Paulo, 2015. Disponível em: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/sms-11233. Acesso em: 9 set. 2020.
DAMASCENO, Sergio Augusto Nader et al. Doença de Cushing: Revisão Integrativa: Cushing’s Syndrome: Integrative Review. Revista de Saúde, Rio de Janeiro, ano 2019, v. 10, ed. 2, p. 76-81, 9 dez. 2019. DOI https://doi.org/10.21727/rs.v10i2.2022. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/338052964_Sindrome_de_Cushing_Revisao_Integrativa. Acesso em: 5 set. 2020.
GUYTON, Arthur C.; HALL, John E. Tratado de Fisiologia Médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda, 2017. 3333 p. ISBN 978-85-352-6285-8.
PIVONELLO, Rosario et al. COVID-19 and Cushing’s syndrome: recommendations for a special population with endogenous glucocorticoid excess. The Lancet, [S. l.], ano 2020, v. 8, n. 8, 9 jun. 2020. Diabetes&Endocrinology, p. 654-656. DOI https://doi.org/10.1016/S2213-8587(20)30215-1. Disponível em: https://www.thelancet.com/action/showPdf?pii=S2213-8587%2820%2930215-1. Acesso em: 7 set. 2020.
SANTOS, Alicia et al. Cardiovascular risk and white matter lesions after endocrine control of Cushing‘s syndrome. European Journal of Endocrinology, Great Britain, ano 2015, v. 173, n. 6, dez. 2015. Clinical study, p. 765-775. DOI https://doi.org/10.1530/EJE-15-0600. Disponível em: https://eje.bioscientifica.com/view/journals/eje/173/6/765.xml?body=pdf-10417. Acesso em: 7 set. 2020.
SCHERNTHANER-REITER, Marie Helene et al. Factors predicting long-term comorbidities in patients with Cushing’s syndrome in remission. Springer, [S. l.], ano 2018, v. 64, 22 nov. 2018. Endocrine, p. 157-168. DOI https://doi.org/10.1007/s12020-018-1819-6. Disponível em: https://link.springer.com/content/pdf/10.1007/s12020-018-1819-6.pdf. Acesso em: 7 set. 2020.
COMISSÃO ORGANIZADORA E CIENTÍFICA
FACULDADE METROPOLITANA SÃO CARLOS
Avenida Governador Roberto Silveira, nº 910
Bom Jesus do Itabapoana-RJ CEP: 28.360-000
Site: www.famescbji.edu.br
Telefone: (22) 3831-5001
O conteúdo de cada trabalho é de responsabilidade exclusiva dos autores.
A reprodução dos textos é autorizada mediante citação da fonte.