A INTERDISCIPLINARIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL
INTRODUÇÃO
Considerando que vivemos em uma sociedade em constante mudança, as escolas devem fornecer aos alunos meios para exercer suas autonomias, exercitar sua cidadania e desenvolver sua criatividade. No entanto, segundo Rocha Filho, Borges, Basso (2007), a formação tradicionalmente deficiente levou os professores no Brasil a agir em nome das políticas de educação.
No cotidiano, os professores enfrentam dificuldades decorrentes de um processo fragmentado de ensino-aprendizagem, fenômeno que deixa de atender às demandas da sociedade moderna (LÜCK, 2001; PAVIANI, 2008). Estas dificuldades decorrem da maneira como o conhecimento é atualmente organizado em disciplinas. A organização atual confere rigidez, artificialidade e falsa autonomia às disciplinas, impedindo alterações na estrutura pedagógica processo e produção de novos conhecimentos (PAVIANI, 2008).
Entende-se por "interdisciplinaridade" algo como o surgimento de discernimento e compreensão de um domínio de problemas através da integração de epistemologias, conceitos e métodos de diferentes disciplinas de alguma maneira nova. Nos últimos 50 anos, a interdisciplinaridade se tornou um tópico importante por si só, no discurso acadêmico sobre produção de conhecimento, e deu origem a novos estudos que tratam das características e desafios definidores dessas atividades.
Além disso, a interdisciplinaridade não é apenas uma coisa: diz-se que existem várias 'interdisciplinares', desde espessamento metodológico até enriquecimento teórico, locais convergentes e uma mudança geral para novas posições que enfrentam o problema de como o significado é produzido (JACOBS; FRICKEL, 2009).
Contribuir para a construção de uma atitude reflexiva é um dos principais objetivos de uma proposta interdisciplinar e, nesse sentido, a organização de um trabalho dinâmico entre professores, estudantes e comunidade é fundamental para o sucesso da abordagem interdisciplinar.
MATERIAL E MÉTODOS
O método utilizado para a elaboração deste trabalho foi o uso de pesquisa bibliográfica investigativa qualitativa, baseando-se artigos científicos e livros que abordam o tema supracitado, concebendo uma análise histórica e as análises dos autores.
DESENVOLVIMENTO
Na busca de direcionar os estudos da infância para a interdisciplinaridade, vale lembrar que o disciplinarianismo e o interdisciplinarismo não são adversários: eles não devem competir entre si; pelo contrário, existe um senso de interdependência entre eles (JACOBS; FRICKEL, 2009).
Como o objetivo da colaboração interdisciplinar é recorrer a conhecimentos disciplinares em duas ou mais disciplinas, para que uma pessoa seja interdisciplinar, é preciso primeiro ter proficiência na própria disciplina. Consequentemente, para fazer prosperar os estudos interdisciplinares da infância, precisamos ter uma forte sociologia da infância, sólidos estudos históricos da infância, uma geografia próspera das crianças e assim por diante. Mas isso, por sua vez, exige que a subdisciplina construa e alimente fortes conexões com sua 'disciplina mãe' e desenvolva uma forte identidade disciplinar. Pode haver problemas se esta rota não for seguida (JACOBS; FRICKEL, 2009).
As teorias de aprendizagem situadas sugerem que problemas complexos do mundo real, como os associados à interdisciplinaridade, podem melhorar o aprendizado porque envolvem os alunos em tarefas autênticas semelhantes às que se espera que eles desempenhem como trabalhadores ou como cidadãos. Informações incorporadas em um contexto estruturado - isto é, em um conjunto de relacionamentos significativos são mais fáceis de lembrar (ROGOFF, 2003).
Portanto, é visto um projeto educacional que se articula com os projetos sociais e de treinamento, o que cria uma conexão direta entre formação e produção, entre educação e compromisso político. Assim, os movimentos mais articulados entre teoria e prática também são contemplados nos pressupostos da interdisciplinaridade, uma vez que essa abordagem instiga e exige uma postura reflexiva que valida certos princípios teóricos, confrontando-os com a adequação de hipóteses explicativas aos diferentes contextos sócio-históricos vivenciados pelas escolas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Segundo Paviani (2008, p. 14), a interdisciplinaridade surge como “um sintoma da crise de disciplinas, de conhecimento excedente e fragmentado e de especialização em detrimento de uma visão global”. No cenário brasileiro, os documentos que orientam a educação básica incluem contextualização e interdisciplinaridade como componentes do processo educacional.
Quando tentamos definir interdisciplinaridade, percebemos que uma definição direta do termo não existe porque um escopo de explicações o traduz, o que torna a interdisciplinaridade polissêmica. Os vários significados da interdisciplinaridade decorrem
de uso indiscriminado do termo no ensino, pesquisa, prática profissional, mídia, congressos e seminários e títulos de literatura científica, que apontam para múltiplos significados e a consequente falta de um significado preciso aceito pela comunidade de ensino e pesquisa (PAVIANI, 2008, p. 14).
O Ensino Fundamental, segundo descrita na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), com nove anos de duração, é a etapa mais longa da Educação Básica, atendendo estudantes entre 6 e 14 anos. Como indicado nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de Nove Anos (Resolução CNE/CEB nº 7/2010),
essas mudanças impõem desafios à elaboração de currículos para essa etapa de escolarização, de modo a superar as rupturas que ocorrem na passagem não somente entre as etapas da Educação Básica, mas também entre as duas fases do Ensino Fundamental: Anos Iniciais e Anos Finais.
Para entender melhor como o processo de aprendizagem pode ser influenciado através de interdisciplinaridade, podemos recorrer a vários teóricos relacionados com conteúdo de aprendizado e cognição. Ainda no final dos anos 90, Greeno e colaboradores (1997) descreveram três perspectivas gerais sobre a natureza do conhecimento, pensamento e aprendizado que moldaram o pensamento e a prática educacional americana. Cada perspectiva observada, coloca em voga diferentes aspectos da aprendizagem:
A perspectiva associacionista/comportamentalista enfatiza o desenvolvimento de habilidades; a perspectiva domínio estrutural/cognitiva enfatiza a compreensão conceitual e as estratégias de resolução de problemas e raciocínio; e a perspectiva situacional enfatiza a participação em práticas de investigação e criação de sentido de uma comunidade e o desenvolvimento da identidade do indivíduo como pensador e aprendiz. (GREENO, et al., 1997, p. 87)
Os professores podem promover o aprendizado ajudando aos alunos a acessar conhecimentos prévios e conectar novas informações aos conhecimentos e entendimentos existentes. A interdisciplinaridade oferece aos alunos mais oportunidades para organizar e armazenar seu aprendizado.
King e Kitchener (1994) destacam que problemas bem estruturados têm respostas corretas únicas que podem ser encontradas, enquanto problemas mal estruturados exigem, o uso de julgamento/pensamento reflexivo. Na sua definição, o pensamento crítico envolve diferentes tipos de raciocínio (por exemplo, dedutivo e indutivo) e é frequentemente caracterizado como um conjunto de habilidades que podem ser aprimoradas pela aprendizagem de um conjunto de regras ou comportamentos. O julgamento reflexivo, por outro lado, é "o resultado de uma interação entre as habilidades conceituais e os ambientes do indivíduo que promovem ou inibem a aquisição dessas habilidades" (p. 18).
Muitas das teorias que discutimos até agora se originaram em escolas de pensamento que conceituam a aprendizagem como um ato de cognição individual. As visões situadas ou socioculturais da aprendizagem, em contraste, enquadram a cognição como uma interação social e, portanto, argumentam que a cognição é poderosamente moldada pelos contextos sociais e culturais multidimensionais e sobrepostos nos quais ocorre (VYGOTSKY, 1978).
As abordagens construtivistas do ensino colocam o aluno no centro da aprendizagem. Teoria de aprendizagem construtivista tem duas premissas básicas: "(1) a aprendizagem toma como ponto de partida os conhecimentos, atitudes e interesses que estudantes trazem para a situação de aprendizagem, e (2) a aprendizagem resulta da interação entre essas características e experiência de maneira que os alunos construam seu próprio entendimento"(HOWE, BERV, 2002, pp. 30-31). O desenho atual do currículo escolar geralmente reforça a distribuição de conteúdo fragmentados das diferentes áreas do conhecimento, uma consequência da superespecialização. Segundo Gerhard, Rocha Filho:
“o conhecimento é separado em conteúdos relativamente compartimentados, mesmo no contexto de uma determinada disciplina, e os conteúdos são apresentados de maneira dissociada e desconectada” (2012, p.127)
Na opinião de Paviani (2008), as disciplinas são arranjos lógicos e políticos. Considerando que um único ser humano não pode conter todos os tipos de conhecimento, a organização do conhecimento em disciplinas foi adotada para obter conhecimentos detalhados. No entanto, essa estratégia culminou em um processo fragmentado de ensino-aprendizagem que falha em estimular o pensamento crítico e a curiosidade intelectual (SANTOMÉ, 1998). Para expandir essa discussão, Lück afirma que:
Na tentativa de fazer os alunos aprenderem, os professores dão importância ao conteúdo em si e não à sua relação com a situação em que ele surge, gerando a dissociação clássica entre teoria e prática: o que é aprendido não corresponde à realidade (LÜCK, 2001, p. 21).
Seguindo as propostas dentro dos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento alinhados e atendendo aos seguintes parâmetros presentes na BNCC (2017):
As características dessa faixa etária demandam um trabalho no ambiente escolar que se organize em torno dos interesses manifestos pelas crianças, de suas vivências mais imediatas para que, com base nessas vivências, elas possam, progressivamente, ampliar essa compreensão, o que se dá pela mobilização de operações cognitivas cada vez mais complexas e pela sensibilidade para apreender o mundo, expressar-se sobre ele e nele atuar. [...]
Haja vista é importante que se considere o aprofundamento da reflexão crítica dos alunos sobre os conhecimentos, a dimensão da área linguística é proposta não como ponto final do processo mas sim o caminho para que a compreensão dos modos de se apresentar e interagir com o meio social, constituindo-se por ações críticas de descobertas e conclusões.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A interdisciplinaridade pode ter sucesso porque oferece aos indivíduos mais oportunidades de conectar novos conhecimentos aos conhecimentos existentes. Esse processo pode ocorrer quando professores e alunos para resolver problemas complexos ultrapassam os limites ou acessam memórias e experiências relevantes que facilitam a compreensão de novos conceitos e ideias. Em ambos os casos, os alunos estão integrando novas ideias com ideias na memória de trabalho. Desenvolver estudos da infância no sentido de maior multidisciplinaridade e até interdisciplinaridade, fornece uma lição oportuna a ser aprendida em todo o campo dos estudos da infância.
Assim, a educação buscada com interdisciplinaridade caracteriza-se como participativa e transformadora, cujo objetivo é desenvolver no indivíduo e no grupo a capacidade de analisar criticamente a realidade, decidir ações conjuntas para solucionar problemas e modificar situações, organizar e tomar ação e avalie-a criticamente.
A ação educacional não envolve apenas a transformação do conhecimento, mas também a transformação dos sujeitos do processo, acadêmicos e não acadêmicos. A interdisciplinaridade como forma de interação entre conhecimentos é um elemento capaz de operacionalizar a teoria e a prática. Eles configuram trocas entre áreas do conhecimento, interação de modelos e conceitos complementares, bem como a integração de metodologias, instrumentos e técnicas para uma consistência teórica e operacional que estrutura o trabalho coletivo.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Conselho Nacional de Educação; Câmara de Educação Básica. Resolução nº 7, de 14 de dezembro de 2010. Fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9 (nove) anos. Diário Oficial da União, Brasília, 15 de dezembro de 2010, Seção 1, p. 34. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb007_10.pdf>.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Curricular Comum: documento preliminar. Secretaria da Educação Fundamental. Brasília, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_publicacao.pdf.
DA ROCHA FILHO, João Bernardes; BASSO, Nara; BORGES, Regina. Transdisciplinaridade: a natureza íntima da educação científica. Edipucrs, 2007.
GREENO, James. The Middle-School Mathematics through Applications Project Group. Theories and practices of thinking and learning to think. American Journal of Education, v. 106, n. 1, p. 85-126, 1997.
HOWE, R. K.; BERV, J. Constructing constructivism, epistemological and pedagogical. (Ed. DC Pihilips). Constructivism in Education: Opinions and Second Opinions on Controversial Issues (pp: 19-40). 2000.
JACOBS, Jerry A.; FRICKEL, Scott. Interdisciplinarity: A critical assessment. Annual review of Sociology, v. 35, p. 43-65, 2009.
KING, Patricia M.; KITCHENER, Karen Strohm. Developing Reflective Judgment: Understanding and Promoting Intellectual Growth and Critical Thinking in Adolescents and Adults. Jossey-Bass Higher and Adult Education Series and Jossey-Bass Social and Behavioral Science Series. 94104-1310, 1994.
LUCK, Heloísa. Pedagogia da interdisciplinaridade. Fundamentos teórico-metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2001.
PAVIANI, Jayme. Interdisciplinaridade: conceitos e distinções. Caxias do Sul: Educs, 2008.
SANTOMÉ, Jurjo Torres; SCHILLING, Cláudia. Globalização e interdisciplinariedade: o currículo integrado. 1998. Brazil: Artmed.
VYGOTSKY, Lev Semenovich. Mind in society: The development of higher psychological processes. Harvard university press, 1980.
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