Este estudo integra modelagem de nicho ecológico correlativa com dados fisiológicos de experimentos em laboratório, de avaliação da tolerância e performance de bivalves diante de mudanças de salinidade. Este método foi aplicado para avaliação do nicho salino e a vulnerabilidade a mudanças de salinidade potencialmente causadas por alterações climáticas, para a espécie nativa Anomalocardia flexuosa (capítulo 1) e a espécie exótica potencialmente invasora Mytilus galloprovincialis no Brasil (capítulo 2). Foi utilizado o contexto de previsão de mudanças climáticas para a década de 2090. O capítulo 3 relata a investigação das respostas fisiológicas de diferentes tecidos de M. galloprovincialis à variação de salinidade e à exposição a 100µg/L de cobalto, com o objetivo de identificar biomarcadores que melhor refletem desafios à homeostase causadas por metal potencialmente tóxico na água. A tese integra respostas de tolerância a parâmetro abiótico e a estressor toxicológico, com foco no animal e sua fisiologia. No primeiro capítulo, uma população de A. flexuosa da Baía de Paranaguá, sul do Brasil, foi exposta à diferentes salinidades por 24h. Foram avaliadas a abertura das valvas, atividade de escavação, osmolalidade da hemolinfa, teor hídrico do pé e atividade da lactato desidrogenase (LDH) no músculo adutor. Os resultados indicaram que as salinidades entre 22 e 37‰ permitem a manutenção da homeostase e a estabilidade do metabolismo, demonstrado pela atividade no sedimento, capacidade de permanecer com as valvas abertas e estabilidade do teor hídrico tecidual. Salinidades abaixo de 22‰ induzem estresse osmótico, refletido em redução metabólica, fechamento de valvas e reduzida capacidade de escavação no substrato. Aplicando-se modelagem de nicho (Maxent, AUC = 0,97), previu-se que as áreas mais adequadas para A. flexuosa na costa brasileira tendem a se deslocar para o norte, potencialmente pelo aumento previsto da precipitação nessa região e redução de salinidade. A análise indicou que a região sudeste permanece adequada no futuro, mas é projetada uma redução da qualidade do habitat. No segundo capítulo, o potencial invasor de M. galloprovincialis na Zona Econômica Exclusiva (EEZ) do Brasil foi avaliado por meio da análise das respostas fisiológicas a variação de salinidade, integradas a modelos de nicho correlativos. A PCA identificou a glândula digestiva como o órgão mais responsivo a mudanças salinas, com a atividade da succinato desidrogenase (SDH) como biomarcador principal. A atividade da SDH foi maior na salinidade controle (30‰), intermediária em 25‰ e 35‰, e significativamente reduzida em 20‰, sugerindo uma zona de conforto salino entre 25 e 40‰. As projeções de adequabilidade (GLM, AUC = 0,84) indicam que 34,56% da EEZ é atualmente adequada para a sobrevivência de M. galloprovincialis, com uma ligeira expansão para 36,48% prevista até 2090. Este estudo demonstra a importância da integração de dados ecofisiológicos com a modelagem de nicho para prever e potencialmente contribuir para mitigar os impactos das mudanças climáticas em regiões costeiras. O framework utilizado pode ser adaptado e aplicado a outros invertebrados, contribuindo para o desenvolvimento de estratégias de conservação baseadas em características ecofisiológicas.
Comissão Organizadora
PPGZOO
Júlia Maria Junkes Serenato
Comissão Científica
Lucas Mantelo Cruz
André da Costa Tavares
Maria Clara Itoh Nascimento
Murilo dos Reis Araújo
Daniel Rivadeneira
Naiane Arantes Silva