Em 1991 começou a mais grave crise econômica da história de Cuba após a revolução da década de 50. Sofrendo com o desmantelamento da União Soviética e vítima de um forte embargo econômico dos Estados Unidos, tal período chegou à ser definido pelo governo cubano como “período especial em tempos de paz”, dada a sua peculiaridade. Carente de recursos tecnológicos, uma das soluções encontradas neste campo baseou-se na construção de uma rede nacional de computadores através do compartilhamento de conhecimentos e recursos em comunidades de prática.
Assim surgiu, no começo dos anos 2000, a SNET, ou “street network”, a primeira rede de computadores da ilha, concebida e criada de forma comunitária. Justificava-se pelo desejo dos jovens de jogar, em ambiente “online”, os jogos aos quais já tinham acesso em ambiente “off-line”. Os jogos chegavam ao país das mais diversas formas, seja através de meios legais, seja através de contrabando, mas o cerne da questão era a vontade de se jogar em rede.
Para que isso se tornasse possível, inicialmente foram colocados em rede um pequeno número de computadores, especialmente dos fãs do jogo “World of Warcraft”. O sucesso foi imediato. O que se configurou inicialmente como uma topologia de rede local passou a se expandir por quarteirões e bairros inteiros, onde as comunidades de prática organizavam, promoviam e auto regulavam o acesso. O governo cubano não tinha interesse em intervir, visto que esta rede local estaria, à priori, desconectada do restante da Internet mundial. Contudo, com o aumento crescente de usuários e diversificação de funcionalidades além dos jogos o governo cubano iniciaria em 2019 uma série de ações que acabariam por estatizar a SNET, tornando-a hoje parte do sistema formal de acesso à Internet da ilha.
Independente do fim inesperado da SNET, este movimento de apropriação e ressignificação do conhecimento na forma de desobediência e compartilhamento não aconteceu exclusivamente no que diz respeito à Internet. Ernesto Oroza, pesquisador cubano da área de design, cunhou o termo “desobediência tecnológica” (Oroza, 2010), para representar as várias práticas de inventividade, reaproveitamento e inovação utilizadas pelos cubanos no sentido de garantir tudo que precisavam para sua sobrevivência.
Para se entender a situação atual, onde o acesso à Internet é permitido, porém controlado, e partindo-se do pressuposto que este mesmo acesso só foi possível graças à SNET comunitária, é necessária não somente uma revisão histórica, mas também uma pesquisa atualizada sobre a questão das redes de acesso em Cuba. Estas reflexões fazem parte de um estudo de doutoramento ainda em andamento onde, propondo-se um percurso metodológico através de um estudo de casos múltiplos incorporados – cujo objetivo vai além da descrição ou exploração, buscando explicações voltadas à produção de resultados generalizáveis a outras realidades –, em associação com uma estratégia de pesquisa histórica (Yin, 2001), pretende-se confirmar se a SNET foi totalmente absorvida pelo governo ou ainda persiste na sua forma original, porém agora na clandestinidade.
Comissão Organizadora
Ulepicc-Brasil
Comitê Científico
Anderson David Gomes dos Santos (UFAL)
Aianne Amado Nunes da Costa (USP/UFS)
Ana Beatriz Lemos da Costa (UnB)
Arthur Coelho Bezerra (IBICT/UFRJ)
Carlos Eduardo Franciscato (UFS)
Carlos Peres de Figueiredo Sobrinho (UFS)
César Ricardo Siqueira Bolaño (UFS)
Chalini Torquato Gonçalves de Barros (UFRJ)
Eloy Santos Vieira (UFS)
Fernando José Reis de Oliveira (UESC)
Florisvaldo Silva Rocha (UFS)
Helena Martins do Rêgo Barreto (UFC/UFS)
Janaine Sibelle Freires Aires (UFRN)
Manoel Dourado Bastos (UEL)
Marcelo Rangel Lima (UFS)
Rafaela Martins de Souza (Universidade de Coimbra)
Renata Barreto Malta (UFS)
Rodrigo Moreno Marques (UFMG)
Rozinaldo Antonio Miani (UEL)
Verlane Aragão Santos (UFS)