Por mais estruturada e organizada que seja uma entrevista clínica, é bem descrito que o bom vínculo de uma Equipe de Saúde da Família (ESF) para com o usuário influi diretamente no quanto este se mostrará motivado, disposto e confortável em colaborar com o cuidado de saúde. Deste modo, a efetividade do cuidado é diretamente relacionada com uma relação de confiança entre os envolvidos e a competências como o domínio da habilidade de realizar perguntas, e a aplicação do método clínico centrado na pessoa. Este relato de experiência tem como objetivo descrever como o vínculo e a confiança, se não bem estabelecidos, podem prejudicar o processo de cuidado, através da ótica de um residente em medicina de família e comunidade. Trata-se de um paciente, 48 anos, sexo masculino, marceneiro como única ocupação, sempre residindo em zona urbana, que alcança o diagnóstico e o tratamento adequado para Blastomicose após 09 meses de sintomas e 07 meses desde a primeira consulta pela ESF. O paciente evoluiu com importante comprometimento pulmonar e do estado geral, desnutrição, e perda ponderal de 26 quilogramas. Tendo como primeira hipótese diagnóstica a Tuberculose, o paciente foi direcionado ao serviço centralizado de atenção à doença, segundo protocolo do município. Contudo, o paciente interrompe o seguimento devido à fatores como a distância do domicílio, frustração com o processo de cuidado e desmotivação, decorrentes de sucessivas exigências para se realizar a coleta de escarro, com dificuldade técnica significativa por parte do paciente. Interrogado por novos membros da ESF, paciente queixa pela primeira vez, após 03 meses do primeiro contato e após idas sucessivas ao pronto atendimento, de dor intensa em cavidade oral, comprometendo a alimentação. É então identificada uma extensa lesão oral, que direciona a equipe para o diagnóstico correto, por meio de realização de biópsia da lesão e testes sorológicos, permitindo o tratamento e a recuperação do paciente. Ao observar que o próprio paciente não considerava relevante ou oportuno relatar sua dor em cavidade oral, e que o sintoma foi tardiamente investigado, podemos relacionar que o desfecho clínico e motivacional só foi obtido a partir do momento em que o paciente consegue relatar sua dor. Portanto, um olhar integral e a compreensão das experiências do doente podem guiar melhor a entrevista clínica, do mesmo modo que uma relação de confiança permitiria ao paciente retornar precocemente para comunicar alguma limitação, permitindo a elaboração de um novo plano de cuidado.