Introdução
A perspectiva de gênero é evidenciada pelos movimentos feminista e de mulheres na década de 1970, “em linhas gerais, gênero é uma construção sociológica, político cultural do termo sexo, não é uma variável demográfica, biológica ou natural apenas, mas traz toda uma carga cultural e ideológica.” (COSTA, 2011, p. 80).
Dessa forma, há uma distinção entre sexo e gênero, enquanto o primeiro indica diferenças anatômicas, gênero refere-se a uma construção social que delimita as condutas apropriadas aos papéis de gênero feminino e masculino, concepção que diferencia no tempo e no espaço. Este conceito está presente na afirmação de Simone de Beauvoir (1980, p. 46) quando diz que “[...] ninguém nasce mulher, torna-se mulher.”
Historicamente, as relações entre homens e mulheres são marcadas pela desigualdade que reforça “[...] a submissão e a violência numa relação desigual que exclui e segrega.” (COSTA, 2011, p. 77). Tais relações são estabelecidas hierarquicamente, subjugando as mulheres aos homens. Na Geografia, os estudos sobre gênero “consideram as relações sociais e os movimentos de diferentes opções sexuais que estão se consolidando e como contribuem para a reprodução do espaço.” (COSTA, 2011, p. 78)
A temática foi incorporada primeiramente pelas ciências sociais, mas estas deram pouca importâncias às implicações espaciais. Assim, emergiu a Geografia Feminista ou de Gênero que enfoca o estudo de gêneros nas análises espaciais tendo em que vista “[...] o espaço pode revelar a luta de classe, e a estrutura de poder entre os gêneros” (REIS, 2015, p. 12). Dessa forma, a Geografia enquanto ciência que estuda a organização e produção do espaço deve abranger a perspectiva de gênero compreendo-a como “parte das práticas espaciais que permite desvendar a base da organização geográfica das sociedades”. (REIS, 2015, p.12).
Ao docente é atribuído a responsabilidade de evidenciar a perspectiva de gênero no ensino de Geografia para os educandos compreenderem a dinâmica da sociedade - como a hierarquização dos gêneros - e suas implicações na produção e reprodução do espaço. Algumas geógrafas de viés feminista (tal como Gillian Rose, Gill Valentine, Linda McDowell, Sarah Holloway, Cindi Katz, Doreen Massey, Rosalyn Deutsche etc) passaram a criticar as abordagens geográficas que, de certo modo, ignoraram o gênero como elemento de diferenciação social ao considerar “a sociedade como um conjunto neutro, assexuado e homogêneo” e sem “levantar as profundas diferenças que existem entre homens e mulheres na utilização do espaço.” (REIS, 2015, p. 12).
Em concordância com Reis (2015), a Geografia, por vezes, tem negligenciado as questões de gênero no processo de ensino-aprendizado, “desconsiderado que os sujeitos têm gênero, assim, é impossível fugir de discussões que envolvam esses temas” (ESCOUTO; TONINI, p. 189, 2018). Então são questões fundamentais para a formação de cidadãos conscientes. Mas como responsabilizar esta deficiência no ensino aos professores da educação básica se não tiveram uma formação que lhes ofertasse suporte à questão?. Partindo deste questionamento, esta pesquisa tem o objetivo de contribuir ao debate sobre a importância dos estudos de gênero no processo de ensino-aprendizagem de Geografia, levantando a discussão da opacidade desta nos cursos de Licenciatura em Geografia e suas implicações na educação básica. A metodologia consistiu em análise bibliográfica das temáticas: Geografia e Gênero (REIS, 2015; COSTA, 2011; VIANNA E UNBEHAUM, 2006) e gênero na educação (ESCOUTO; TONINI, 2018; BRANDÃO; LOPES, 2018).
A ausência das discussões de Gênero nos Cursos de Formação de Professor de Geografia
No espaço escolar, os estudos sobre gêneros “[...] ajudariam no processo educativo de convivência com a diversidade sexual, de gênero e racial.” (BRANDÃO; LOPES, 2018 p. 100). Ao esclarecer sobre gênero desde o ensino fundamental, a gestão escolar e os professores contribuem para uma convivência harmoniosa dos educandos no contexto escolar e social, uma vez que diminuiriam as tensões e conflitos motivados pela desinformação, como o bulliyng praticado àqueles que apresentam comportamentos tidos como destoantes dos papéis de gênero atribuídos, impactando na diminuição do abandono escolar.
Brandão e Lopes (2018) citando Cleomar Manhas (2014) mencionaram uma pesquisa da Fundo das Nações Unidas para a Infância- Unicef, publicizada em 2010, com estudantes do ensino fundamental no Brasil que apontaram, dentre os principais motivos do abandono escolar, as desigualdades de gênero. Por isso, em concordância com Seffner (2017, p. 28) a escola deve “[...] se esforçar em ampliar os laços de solidariedade entre todos e todas, pois o espaço público é ambiente de negociação dos marcadores sociais da diferença”. É, sobretudo, por meio da educação que as almejadas transformações sociais podem ser alcançadas, como a diminuição das diversas desigualdades sociais e o rompimento de estereótipos de gêneros.
Nessa perspectiva, ressalta-se a responsabilidade dos docentes em ensinar os alunos a aprender a lidar com opiniões contrárias e com a diversidade através da luta contra o preconceito na escola, reforçando o respeito e a solidariedade mútua. A temática gênero na educação passou a ser uma demanda social pois aborda problemas como a cultura do estupro, a desigualdade salarial entre homens e mulheres, feminicídio e assassinatos de pessoas LGBTQIA+, “esses são alguns problemas que tem que ser reconhecidos e enfrentados para acabar com a cultura machista, racista e homofóbica que existe nesse pais” (ESCOUTO; TONINI, 2018, p. 189-190). Em concordância com Costa (2011, p. 79) “´[...] a Geografia, assim como outras ciências sociais, tem na escola o compromisso de contribuir para formar o “ser humano inteiro”, discurso lido em muitos momentos, mas muito difícil de realizar na prática do espaço social denominado “escola”.
Apesar da relevância das questões de gênero na educação, a menção a gênero foi retirada da Base Nacional Comum Curricular. Então, conforme defendem Escouto e Tonini (2018, p. 190) “[...] já que a educação vem perdendo campo nessas temáticas, é preciso que a educação superior se mobilize para reverter esse triste quadro de intolerância e preconceito que vem sendo aumentado.” Aproveitando-se de sua autonomia e pautados na importância das discussões sobre gênero na escola, as universidades devem se mobilizar e, em espacial, o curso de Geografia, adequando os currículos à temática, para desenvolver uma formação preparada para combater com os diversos preconceitos presentes na nossa sociedade.
Considerações Finais
Para que as implicações da hierarquização de gêneros sejam amenizadas, a educação deve exercer protagonismo na transformação deste contexto ao promover conhecimentos e saberes em prol do respeito às diversidades de gêneros. As questões de gênero deveriam ser ofertadas nos cursos de formação de professores de Geografia, enfatizando o trabalho masculino e feminino na produção e reprodução do espaço, possibilitando a compreensão dos educandos da importância dos gêneros na sociedade, superando, assim o viés conversador, neutro, assexuado e homogêneo que até então apresenta resquícios na ciência geográfica.
Comissão Organizadora
CLÁUDIA APARECIDA FERREIRA MACHADO
Andrey Guilherme Mendes de Souza
Fátima Rita santana Aguiar
Comissão Científica