Atualmente, professores têm relatado o mal-estar e a insegurança que rondam o fazer docente dos últimos tempos: aos velhos desafios da profissão somam-se outros, relacionados à tentativa de controle da palavra pública e da produção de imagens sobre o que significa ser professor. Assim, perguntamos: como propiciar ao professor a produção de imagens mais benfazejas de si, oportunizando estratégias de fortalecimento da identidade docente e de combate ao discurso da desvalorização? No intuito de refletir sobre essa questão, discutimos a crise na profissão docente dos últimos tempos e apresentamos possibilidades de estratégias de fortalecimento da identidade do professor, delineando possibilidades de apoio mútuo e ressignificação deste fazer profissional.
Palavras-chave: professor; identidade docente; resistência.
Começo de conversa
Delineando um cenário e propondo alternativas
O que determina o prestígio ou desprestígio de uma profissão? Hoyle (1987 apud BIZARRO; BRAGA, 2005) apresenta aspectos como o tamanho do grupo profissional e sua origem social, a proporção de mulheres, a qualificação acadêmica de acesso e o status do cliente como aspectos definidores do status de dada profissão. Embora esses critérios justifiquem parcialmente o desprestígio da profissão de professor, a nosso ver, a explicação é primordialmente histórico-social.
No início deste século, Saul Jesus (2004) discutia as razões para o que ele considerava uma crise de identidade e desmotivação na profissão docente. Avaliava, entre outras coisas, que o declínio da imagem social do professor decorria de mudanças em sua função, formação e remuneração, pois de agente cultural que instruía as elites ele passa a operário responsável pela massificação da educação.
Soma-se a isso mudanças de valores proporcionados por políticas neoliberais, que progressivamente fizeram sobrepor os valores do individualismo e do capital aos valores do humanismo e da intelectualidade. Como explica o autor, foi assim que, historicamente, à medida em que a escola para todos perdeu prestígio, o professor, devido à contratação em massa, à crescente perda de autonomia, à formação precária veladamente admitida, ao distanciamento das elites, à juvenilização/feminização de seu corpo e à remuneração cada vez menor, assistiu, progressivamente, ao achatamento de seu estatuto e fazer social.
Esse histórico é mais do que suficiente para desencadear uma crise de identidade e desmotivação profissional, pois o professor confronta-se cotidianamente com imagens sociais que o colocam num espaço de menos-valia, de tal maneira que o próprio professor acaba se vendo condicionado a enxergar-se com olhos externos, produzindo autoimagens fundadas na avaliação que o outro faz de si, fragmentando, assim, a sua construção identitária. Com isso, o discurso do desprestígio da profissão docente tem se fortalecido de tal maneira que começa a afetar até mesmo aqueles que deveriam desconstrui-lo, isto é, o próprio professor.
Assim, a naturalização de discursos sobre a desvalorização do professor produz efeitos em sua identidade profissional e frequentemente acaba por levar o docente a se vê predominantemente como “aquele que ganha pouco e que é desrespeitado pelos alunos”. Se outras imagens não se sobrepuserem a essa, se outros modos de ver e fazer a profissão não se fortalecerem em detrimento daqueles que ecoam na mídia e nos dizeres coletivos sobre a profissão de professor, veremos em pouco tempo uma identidade profissional deteriorada e esvaziada de sentidos próprios, dominada pelo olhar do outro.
Por óbvio, o combate ao discurso da desvalorização do professor precisa situar-se no campo político, por meio do estabelecimento de políticas públicas que ressignifiquem o papel da escola e do professor na construção de sociedades democráticas. Contudo, é possível também que o próprio grupo se organize na busca de estratégias de fortalecimento da identidade e atividade docente, fomentando um processo de produção de imagens mais benfazejas de si, de modo a propiciar vínculos mais felizes do sujeito com o seu fazer profissional.
Juntos a Bernardo (2014), vislumbramos três pilares capazes de sustentar esse acontecimento: i) o fortalecimento da formação profissional, que envolve a organização do grupo em comunidades reflexivas que promovam trocas de saberes, discussão de problemas e atualização profissional; ii) o adentramento definitivo do professor na cultura digital, de modo a sintetizar a necessidade da classe apropriar-se da linguagem organizacional e didática do paradigma tecnológico do século XXI e iii) o fomento à participação política, visando a possibilidade de o próprio professor contribuir para o debate e proposição de soluções.
Por fim, o fortalecimento da identidade docente e a produção de imagens positivas de si passam necessariamente pelo fortalecimento da categoria (que se dá via união do grupo) e pela ampliação da participação política daqueles que formam os cidadãos (os professores). União e participação política criam consciência de classe, base necessária não apenas à resistência, mas também a uma (re)ação coletiva.
Referências
BERNARDO, Julio Cesar Oliveira. Profissão professor: diversidade, adversidade e transformação social. #Tear. Revista de Educação, Ciência e Tecnologia, Canoas, v. 3, n. 2, p. 17-27, 2014.
BIZARRO, Rosa; BRAGA, Fátima. Ser professor em época de mal-estar docente: que papel para a universidade. Revista da Faculdade de Letras: Línguas e Literaturas, Lisboa, II série, vol. 22, 2005, p. 17-27, 2014.
JESUS, Saul Neves de. Desmotivação e crise de identidade na profissão docente. Revista Katálysis, Santa Catarina, vol. 7, n. 2, p. 192-202, 2004.
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