O Encontro Brasileiro Internacional de Ciência Cognitiva (EBICC) tem acontecido no Brasil desde 1995, organizado pela Sociedade Brasileira de Ciência Cognitiva (SBCC). A décima quarta edição do Encontro (XIV EBICC) ocorrerá de 17 a 20 de setembro de 2024, abordando o tema “Narrativa e Relevância”, na Reitoria da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Prédio Dom Pedro I. A programação do evento contará com importantes pesquisadores na área, vindos de diversos países e variados estados brasileiros, e incluirá conferências, mesas redondas, sessão de pôsteres e premiação dos melhores trabalhos.
Os conceitos de narrativa e relevância, separadamente ou em conjunto, organizam campos abrangentes e transdisciplinares de produção intelectual. Eles já receberam várias definições e teorizações diferentes: numa perspectiva analítica, Richard Walsh definiu a narrativa como uma “articulação semiótica de uma sequência temporal linear”; na interface entre a filosofia da linguagem e a linguística cognitiva, Dan Sperber e Deirdre Wilson situam a atribuição de relevância no cerne da construção do significado pelos participantes de um processo comunicacional. Essas definições dos termos podem ser facilmente associadas num modelo em que a “articulação semiótica” da informação é orientada pela relevância atribuída aos conteúdos envolvidos, noção imediatamente aplicável a incontáveis contextos de produção e experiência.
Abre-se assim um campo vasto de exploração. Certo uso de senso comum tende a enfatizar a condição de “construção” das narrativas, como tem sido recorrente do debate político contemporâneo. Mas a definição de Walsh vai além dos usos atuais da linguagem, ao situar a narrativização como uma capacidade elementar de ordenação sequencial da informação, identificável em inúmeros domínios da ação humana. Seja em esforços individuais de produção de sentido, seja em contextos de interação interpessoal, a relevância identificada em elementos destacados da informação disponível sugere modos adequados e eficientes de construção de descrições, explicações e interpretações de processos naturais, sociais, culturais e históricos. E além da produção de conhecimento, a narrativização é amplamente empregada na produção de estórias que dão sentido à realidade compartilhada, em mitos, ficções, na produção humorística.
Entende-se, pois, que os temas do nosso evento podem ser concebidos como ações e produtos, como verbos e substantivos: falar de narrativa e relevância é remeter a processos de narrativização e atribuição de relevância – pelos agentes envolvidos –, assim como aos resultados desses processos – para os mesmos agentes, ou para aqueles que vierem a conhecer esses resultados em contextos apartados dos contextos que lhes deram origem. Pois narrativas têm portabilidade, podendo subsistir no tempo e viajar pelo espaço, gerando efeitos que transcendem aos seus contextos de produção e às suas motivações iniciais.
Por tudo que foi dito, os processos, ações e produtos envolvidos na narrativização e na atribuição de relevância envolvem capacidades mentais diversas, como a imaginação, a memória, a percepção, a categorização, a criatividade, a resolução de problemas, e assim por diante. Compreendendo como essas capacidades surgem na cognição, podemos compreender e debater a integração desses temas no ensino, na comunicação pública e na atividade intelectual, oferecendo desenvolvimento de recursos humanos para variados setores de produção, assim como contribuir com o desenvolvimento da produção artística e cultural na sociedade. Para que esses objetivos sejam alcançados, diversas questões precisam ser discutidas:
- O que são a narrativa e a relevância, e como elas se associam na teoria e na prática?
- Quais funções cognitivas estão envolvidas em uma e outra, e na associação entre elas?
- Quais modelos cognitivos conseguem descrevê-las?
- Como podemos utilizar modelos cognitivos da narrativa para a educação?
Compreender a cognição é uma tarefa que leva consigo aspectos éticos. Esse tipo de conhecimento traz possibilidades de garantir a liberdade do ser humano e de expandir nossas perspectivas de como utilizar nossos recursos de formas ecologicamente sustentáveis. Entretanto, qualquer ferramenta que descreve o comportamento humano também pode ser utilizada para o controle autoritário, para um uso inconsequente no mercado e para soluções que visam interesses individuais desconsiderando o bem coletivo. Recentemente, experimentos de produção narrativa pelo recurso à inteligência artificial foram iniciados, de possibilidades ainda indiscerníveis. Assim, precisamos nos questionar sobre como garantir que o conhecimento desenvolvido no atual evento possa contribuir na direção da inovação responsável, prever consequências futuras e planejar caminhos de ação que direcione o desenvolvimento científico para o caminho da ética. Essas propostas devem promover consequências tangíveis que incentivem, por exemplo, o desenvolvimento open source de recursos da comunicação e informação, e outras formas de garantir o acesso e poder público perante o conhecimento. Alguns problemas relacionados para serem discutidos nesse âmbito são:
- Quais são as consequências sociais das produções narrativas?
- Quais são as consequências potenciais da produção de narrativas por meios tecnológicos?
- Como ficaria a responsabilidade moral da disseminação social de narrativas produzidas por máquinas criativas? - Como podemos direcionar o conhecimento narrativo em direção à ética?
- Como podemos oferecer conhecimento e poder ao público em relação a narrativas de ampla circulação social, nos domínios da política, da cultura e da ciência?
Temas:
Narrativa e Complexidade
Flexibilidade Cognitiva
Modelagem e Simulação da Narrativa
Bases neurobiológicas e linguísticas da Narrativa e da Relevância
Linguagem e Processos Cognitivos Gerativos
Inteligência Artificial, Machine Learning
Narratividade e Relevância
Arquiteturas Cognitivas - Cognição incorporada, Redes Neurais, Processamento Preditivo Ética e Design Responsável
Responsabilidade Moral e Inovação
Design Social
Informação e Responsabilidade Moral
Consciência, Percepção e Intuição
Algoritmos e Democracia
Responsabilidade e Tecnologias de Informação
Cérebro e Liberdade
Processos Narrativos na Arte
Narrativa e Educação
Linguística Cognitiva
Mídia e Cognição
Comunicação on-line
Pragmática e cognição
Processamento de linguagem
Áreas básicas envolvidas: Filosofia; Psicologia; Inteligência Artificial; Neurociência; Linguística; Literatura; Design; Biologia; Artes; Educação; Antropologia; História; Ciências Sociais, dentre outras.
O evento ocorrerá na Reitoria da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Prédio Dom Pedro I:
R. XV de Novembro, 1299 - Centro, Curitiba - PR, 80060-000.