Desde muito cedo, o ser humano compreendeu-se aberto ao transcendente, passível de autêntica relação com o divino. O fenômeno religioso, atestado nas mais diversas culturas, figura no cenário histórico há milênios, constatando que este anseio pelas realidades divinas compõe o imaginário humano. Ao longo da história, muitas foram as religiosidades com as quais homens e mulheres estabeleceram relações com as divindades nas quais acreditavam, disso resulta um ponto comum do fenômeno religioso: o divino e o humano se comunicam. Esta comunicação pode se dar por meio de mediadores especializados, destinados a esta função, tais como oráculos, mensageiros, sacerdotes. Porém, em algumas expressões de fé, é comum encontrar textos sagrados que merecem atenção especial, pois são reconhecidos como palavras divinas. São exemplo disto, o judaísmo, o cristianismo e o islamismo, chamadas por alguns de religiões do livro.
No cenário cristão, a Bíblia recebe status de Palavra de Deus, sendo compreendida como conjunto de livros de inspiração divina, os quais comportam autoridade normativa para direcionar, exortar e corrigir a caminhada daquele que crê. Contudo, durante muitos séculos, esta inspiração foi assumida de forma mecânica e engessada, resultando em uma má compreensão da inerrância bíblica, entendida de forma literal. Disso derivam interpretações historicistas e fundamentalistas dos textos que representam verdadeiros riscos à comunidade crente e não-crente.
No século XX, o Concílio Vaticano II, convocou o catolicismo a uma volta às fontes, a fim de redescobrir princípios basilares de sua fé e recuperar o dinamismo inicial próprio do cristianismo nascente. Através da Constituição Dogmática Dei Verbum, o Concílio recordou o caráter humano-divino da Escritura e animou seus adeptos a se aproximarem dos textos bíblicos com criticidade e constância, abrindo espaço para métodos exegético-hermenêuticos até então vistos com certa desconfiança. Além da Dei Verbum, a segunda metade do século XX possui outro marco expressivo para o estudo bíblico católico. Trata-se do documento A interpretação da Bíblia na Igreja, promulgado em 1993, através do qual a Igreja Católica orienta seus fieis a realizarem leituras críticas e contextualizadas do texto, a fim de superar abordagens engessadas e literais da Bíblia.
A Sagrada Escritura é um universo polissêmico, cuja leitura revela-lhe infinita em possibilidades hermenêuticas que repercutem nos diversos âmbitos da sociedade e do conhecimento. A Bíblia é um cancioneiro das estradas que oferece uma legibilidade da vida e do mundo permitindo releituras diversas, seja no campo teológico, filosófico ou das ciências da religião.
Celebrando os trinta anos do documento A interpretação da Bíblia na Igreja, a Faculdade Católica do Rio Grande do Norte, em parceria com o Departamento de Filosofia da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, realiza a V SEMANA NACIONAL DE TEOLOGIA, FILOSOFIA E ESTUDOS DE RELIGIÃO – V COLÓQUIO FILOSÓFICO: FILOSOFIA E RELIGIÃO, com o tema: “Bíblia e Sociedade: Hermenêuticas éticas, políticas e estéticas”, que acontecerá de 9 a 11 de outubro de 2023.
O tema é artisticamente representado na releitura do ícone da Trindade, na qual cada personagem, com feições humanas diversas, evoca uma das dimensões presentes no tema. Ao centro, um homem segura uma balança, símbolo do equilíbrio e da justa medida, reportando à ética. À esquerda, uma mulher toca harpa, expressão da harmonia e melodia, aludindo à estética; por fim, à direita, uma pessoa cadeirante põe em evidência as dimensões política e inclusiva. Ao centro está a Palavra de Deus, ponto de partida para o diálogo que será tecido ao longo do evento. Ao fundo, elementos urbanos, evocam a sociedade com a qual se dialoga, a fim de propor novas hermenêuticas nas dimensões citadas.
SUBMISSÃO DE TRABALHO: ENCERRADO.