Luciana Tavares Perdigão, Fundação Cecierj (doutora), lperdigao@cecierj.edu.br
Alessandro Câmara de Souza, Universidade Federal Fluminense (doutorando), camarasouza@gmail.com
A atuação de ledores e transcritores é central para garantir o direito à acessibilidade de pessoas com deficiência visual (PcDV), especialmente no contexto educacional. Estudos recentes apontam lacunas críticas nessa formação, como carga horária reduzida, ausência de regulamentação legal e escassez de práticas por área de conhecimento (AGUIRRE, 2019; PEREIRA; MARTINS, 2021). Em resposta a esse cenário, a Fundação Cecierj, por meio da Diretoria de Extensão e do Programa de Formação Continuada de Professores, ofertou em 2025.1 a disciplina “Ledor e Transcritor”, com 30 horas de carga horária, voltada à Educação Especial e Inclusiva. Este trabalho apresenta os resultados da avaliação aplicada aos cursistas ao final da formação.
Foi utilizado um questionário online, aplicado via Moodle, para avaliar a percepção dos cursistas sobre a formação recebida. A amostra contou com 14 participantes. As perguntas abordaram aspectos como a sensação de preparo, adequação da carga horária e sugestões para melhoria do curso. As respostas abertas foram analisadas por categorização temática qualitativa.
Dos 14 participantes que responderam ao questionário de avaliação, 12 (86%) afirmaram sentir-se preparados para atuar como ledores e transcritores após a formação, enquanto 2 (14%) declararam ainda não se considerarem plenamente aptos. Embora o índice de aprovação seja alto, a existência de uma parcela que não se sente segura aponta para limitações que merecem atenção, especialmente no que diz respeito à profundidade do conteúdo e à carga horária do curso.
Em relação à carga horária ideal para uma formação de qualidade, 9 cursistas (64%) consideraram que seriam necessárias mais de 30 horas, enquanto 5 (36%) julgaram que as 30 horas oferecidas foram suficientes. Esse resultado dialoga com os achados da literatura, que destacam a necessidade de práticas mais extensas, com simulações por área de conhecimento e aprofundamento técnico, como leitura de gráficos, fórmulas e descrição de imagens (AGUIRRE, 2019; JUNQUEIRA et al., 2017; ADERALDO et al., 2020).
Nas respostas abertas, os participantes elogiaram a estrutura do curso, o material didático e a proposta pedagógica. No entanto, muitas das sugestões de melhoria convergiram para a ampliação da carga horária, inclusão de feedbacks mais detalhados nas atividades e a criação de espaços de interação, como fóruns ativos ou encontros síncronos com os tutores. Essas observações reforçam o que apontam Leria et al. (2023) e Pereira e Martins (2021): a formação de ledores e transcritores demanda não apenas conteúdo, mas também escuta, prática e acompanhamento qualificado.
A avaliação evidencia, portanto, que o curso ofertado cumpre um papel relevante na formação inicial desses profissionais, mas que ainda há desafios estruturais a serem enfrentados. A diferença entre os que se sentiram plenamente preparados e aqueles que não, bem como a maioria indicando a necessidade de maior carga horária, reforça a importância de investir em formações continuadas, práticas supervisionadas e diretrizes nacionais que estabeleçam padrões mínimos para a atuação do ledor e do transcritor no campo da educação inclusiva.
Os resultados da avaliação da disciplina indicam que a formação ofertada contribuiu significativamente para a preparação dos cursistas, mas também revelam pontos de aprimoramento que dialogam diretamente com as críticas identificadas na revisão de literatura. A ampliação da carga horária, o aprofundamento prático por áreas específicas e a regulamentação normativa são medidas urgentes para fortalecer a atuação dos ledores e transcritores. A experiência analisada reforça a importância de investir em políticas públicas de formação continuada que combinem fundamentos pedagógicos e domínio técnico, promovendo uma acessibilidade que seja, de fato, sinônimo de equidade.
AGUIRRE, D. Á. As capacitações de ledores e transcritores para inclusão e acesso em processos seletivos à educação superior: a percepção dos egressos. Dissertação (Mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2019.
ADERALDO, A. L. M.; FRANCO, E. A. B.; OLIVEIRA, M. S. C. Introdução à formação de audiodescritores: descrição de imagens em provas do ENEM. Linguagem em (Dis)curso, v. 20, n. 1, p. 99–118, 2020.
JUNQUEIRA, S. R. A.; MARTINS, M. B. G.; LACERDA, C. B. F. Política de acessibilidade e Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Revista Brasileira de Educação Especial, v. 23, n. 3, p. 457–472, 2017.
LERIA, C. G. et al. Perspectivas de pessoas com deficiência visual sobre a acessibilidade no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Revista Educação Especial, v. 36, e84416, 2023.
PEREIRA, M. M.; MARTINS, V. L. A importância do ledor/transcritor como mediador da leitura e da escrita para pessoas com deficiência visual no contexto do ENEM. Educação em Perspectiva, v. 12, p. 128–141, 2021.
RETORTA, M. S. Prova de inglês do ENEM: desafios para candidatos com deficiência visual. PACK Educacional, v. 16, n. 1116, p. 58–74, 2021.