Os encontros, o corpo-rua, e a pesquisa: uma reflexão bioética sobre pessoas em situação de rua.

  • Autor
  • Túlio Batista Franco
  • Co-autores
  • Emerson Elias Merhy , Mírian Ribeiro Conceição , Román Goldenzweig , Pedro Victorino Carvalho de Souza , Herbert Tadeu Pereira de Matos Junior
  • Resumo
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    Este trabalho apresenta reflexões bioéticas emergentes da pesquisa nacional "Práticas e saberes que vêm das margens: encontros e desencontros com a atenção e a formação em saúde", discutindo questões fundamentais na investigação com pessoas em situação de rua através do conceito "corpo-rua". Propõe uma abordagem metodológica que reconhece a indissociabilidade entre corpo e rua, compreendendo que toda pesquisa é implicada e caracterizada por encontros afetivos entre pesquisadores e pesquisados, produzindo conhecimentos coletivos onde dimensões sociais e afetivas são indivisíveis. Utilizamos o referencial spinoziano para compreender os afetos como produtores de conhecimento do segundo gênero (causal) e terceiro gênero (ciência intuitiva), este último acessível exclusivamente através da imersão nos cenários cotidianos. O conceito "corpo-rua" expressa a fusão intensiva entre pessoas e territórios urbanos, inspirado na concepção de "povos-floresta" proposta por Eliane Brum, reconhecendo que a rua produz o corpo simultaneamente ao corpo produzir a rua, formando singularidades que constituem multidões urbanas. A análise revela como biopolíticas contemporâneas operam através de linhas racistas e coloniais nas políticas assistenciais, evidenciando que 76,7% das pessoas em situação de rua em Niterói se autodeclaram pretas ou pardas, configurando um cenário de brutalismo racial estrutural. Contrapondo-se a essas biopolíticas regulatórias, identificamos linhas de biopotência e resistência contra colonial manifestas no protagonismo dessas pessoas na produção de redes vivas de cuidado e desenvolvimento de saberes próprios, exemplificados pela "Rualogia" conceituada por Vanilson Torres, líder do Movimento Nacional da População em Situação de Rua. A pesquisa cartográfica exige pesquisadores "in-mundo", capazes de emaranharem-se nos fluxos afetivos dos encontros, produzindo interferências e conhecimentos através de narrativas de vida que circulam pela tradição oral. Esta abordagem metodológica questiona a assepsia da pesquisa tradicional, propondo um conhecimento incorporado que reconhece as pessoas em situação de rua como co-produtoras de saber sobre suas próprias realidades existenciais. O trabalho contribui para o debate bioético contemporâneo evidenciando como questões de interseccionalidade, racismo estrutural e colonialidade atravessam práticas de pesquisa e cuidado, demandando epistemologias descoloniais que valorizem saberes populares e a agência de sujeitos historicamente subalternizados no contexto urbano brasileiro. (Fomento: CNPq por meio da chamada - Nº 21/2023 - Estudos Transdisciplinares em Saúde Coletiva)

  • Palavras-chave
  • corpo-rua; bioética; pessoas em situação de rua
  • Modalidade
  • Pôster
  • Área Temática
  • Divulgação científica
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