Introdução: O movimento irregular de pequenas partículas, como grãos de pólen imersos em um fluido, seja ele líquido ou gás, e visível com o auxílio de um microscópio, foi observado primeiramente pelo botânico inglês Robert Brown, que ao observar tais partículas em suspensão notou que, as mesmas, adquiriam uma espécie de movimento errático, o qual, posteriormente ficaria popularmente conhecido como Movimento Browniano (MB). Durante muito tempo, um esforço considerável por parte da comunidade acadêmica da época foi direcionado no sentido de elucidar a verdadeira essência do movimento observado. As propostas mais promissoras giravam em torno das seguintes hipóteses: i) atrações ou repulsões entre as partículas suspensas, ii) ações capilares ou higrométricas, iii) bolhas temporárias de ar no interior do fluido, iv) correntes de convecção no interior da solução, v) gradientes de temperatura ou algum tipo de perturbação mecânica e, por fim, vi) instabilidades desconhecidas no fluido (SILVA; LIMA, 2007). À época, o debate da ciência ainda não havia batido o martelo acerca da teoria atômica-molecular da matéria, de modo que as discussões mais importantes se dividiam entre os chamados energeticistas, termo utilizado por aqueles que se denominavam contra a hipótese atômica, como era o caso de Wilhelm Ostwald, Ernst Mach e Georg Helm. E, também, os atomistas, os defensores da hipótese atômica, resultando, portanto, em duas correntes de pensamento antagônicas que não encontravam um consenso. Na ausência de uma proposta mais realista para elucidar a essência do fenômeno observado, as hipóteses acima foram aos poucos eliminadas e, somente a partir de 1860, começou a tomar forma o ponto de vista moderno de que o zigue-zague das partículas brownianas poderia ser resultante das colisões com as moléculas do fluido (Pais, 1995). A partir de então, diversos experimentos de laboratório mostravam que o movimento era mais intenso quando se reduzia a viscosidade do meio ou o tamanho das partículas brownianas, e quando se elevava a temperatura da solução. Verificou-se também que suas trajetórias não apresentavam tangentes, ou seja, as curvas não seriam diferenciáveis, e que o movimento randômico aparentemente nunca cessava. No entanto, apesar de muitos esforços terem sido direcionados ao tema pela comunidade acadêmica da época, a verdadeira causa do fenômeno permaneceu um mistério até 1905, quando finalmente Einstein no seu artigo de 1905, pontua o que ficaria mais tarde claro como um desfecho da sua famosa tese de doutorado (Stachel, 2001; SILVA, 2004). Einstein, em seu artigo, utilizando a ideia de pressão osmótica e sua relação com a difusão, mostrou que o movimento browniano era causado pelos impactos constantes das moléculas do líquido com as partículas em suspensão, resultando em um movimento irregular e imprevisível. Formalmente, o resultado principal deduzido por Einstein se baseia numa relação muito simples, a qual pode ser escrita da seguinte forma, (l)2 = 2Dt, em que a quantidade (l)2 representa o deslocamente quandrático médio da partícula browniana, t é o tempo e D está ligado às propriedades do fluido tais como a temperatura e a viscosidade, denominado de coeficiente de difusão (Salinas, 2005). A descoberta de Einstein representou um grande avanço na ciência da época e foi considerada como um dos trabalhos intelectuais mais notáveis de todos os tempos. Sua solução, além de colocar um fim nas inúmeras especulações produzidas durante várias décadas, também serviu de base para se derivar o número de Avogadro, verificado com grande precisão durante os experimentos realizados pelo francês Jean Perrin. Além disso, também serviu como uma prova cabal da existência dos átomos e moléculas, estabelecendo assim, a teoria atômica-molecular da matéria como um ramo fundamental da ciência. Os estudos de Einstein sobre o movimento browniano constituem um dos pontos altos da sua longa tradição de pesquisa sobre a teoria cinética do calor e também serviram como ponto de partida para estabelecer os estudos dos fenômenos de flutuações como um novo campo da física teórica, já que os métodos criados por ele abriram novos horizontes não só para a física estatística, mas principalmente para uma teoria geral dos processos estocásticos. Resultados. Os resultados de Einstein elucidaram a essência do movimento observado por Brown em 1828. A relação (l)2 = 2Dt é modernamente conhecida como uma das primeiras versões de um teorema bastante conhecido na física, sendo este, o teorema da flutuação-dissipação, no qual uma quantidade quadrática média, aqui representada por (l)2, está intimamente ligada a um processo dissipativo, representado pela viscosidade do fluido. Além disso, a formulação de Einstein também abriu caminho para o surgimento de diversas outras áreas do conhecimento, como o cálculo estocástico em matemática e das equações diferenciais estocásticas. O formalismo apresentado, além de fornecer uma prova cabal sobre a realidade atômica da matéria, também foi utilizado como uma maneira alternativa para a derivação do número de Avogadro (NA), cujo valor atual é 6,02 x 1023 partículas por mol de uma determinada substância. Os resultados de Einstein descritos sucintamente aqui foram confirmados por um conjunto de experimentos realizados entre 1908 e 1914 pelo francês Jean Perrin, o que lhe rendeu o prêmio Nobel de física em 1926. Neste ponto, é interessante esclarecer que, posteriormente ao ano de 1905, diversos autores propuseram outros formalismos alternativos para explicar o fenômeno observado por Brown em 1828, os quais, pontuaremos suscintamente a seguir. A Abordagem de forças flutuantes de Langevin: Em 1908 o físico francês Paul Langevin propôs que o movimento de uma partícula browniana na ausência de um campo de força conservativa poderia ser explicado por meio de uma equação diferencial estocástica, a qual é atualmente conhecida como equação de Langevin. Os princípios básicos dessa abordagem, além da força viscosa imposta pela presença do fluido ao movimento da partícula, são baseados na ideia de forças flutuantes ou ruído branco, aqui definido como a força f(t), um termo que surge diretamente das colisões das moléculas do fluido com a partícula em movimento e sendo uma característica marcante de uma equação diferencial estocástica. As propriedades formais desse termo flutuante estão respaldadas no escopo da mecânica estatística, para a qual se define que <f(t)> = 0 e <f(t)f(t’)> = A?(t-t’), ou seja, em média a força flutuante é nula no intervalo de tempo t e possui uma correlação diferente de zero para dois tempos distintos, onde A é uma constante e ? é a função delta de Dirac. Portanto, embora seguindo uma perspectiva totalmente diferente daquela adotada por Einstein, os resultados de Langevin se reduzem àqueles obtidos pelo tratamento de Einstein no limite assintótico ou de tempos longos. Outro resultado importante é A abordagem via Equação de Fokker-Planck: O mesmo problema da partícula browniana na ausência de um campo de força conservativa também foi abordado por Adriaan Fokker e Max Planck entre 1914 e 1917 por meio de uma equação diferencial parcial descrevendo a evolução temporal de uma função densidade de probabilidade p(x,t), a qual, é modernamente conhecida como equação de Fokker-Planck. Na linguagem moderna, a solução desta equação fornece a probabilidade de encontrar uma partícula browniana em um intervalo de coordenada entre a posição x e x+l), quando em t0 = 0 iniciou seu movimento do ponto x0 = 0. Por fim, outra maneira interessante de descrever o movimento da partícula browniana foi proposta por M. Kac em 1947, cuja abordagem é centrada em termos do problema envolvendo a caminhada aleatória, um problema de caráter extremamente universal em física. Na sua forma mais geral, esse problema é facilmente entendido considerando-se sua versão mais simples em uma dimensão, tal como originalmente investigado Kac. Considerações finais: A história da ciência se faz de fato importante para a compreensão de fatos científicos, como também pontuar que, durante o processo de construção e desenvolvimento das teorias básicas da física, não existe linearidade como muito se é pensado pelo senso comum. Dessa forma, o presente trabalho mostra um panorama resumido acerca da história do movimento browniano, desde a sua concepção por Robert Brown em 1828 até a derivação de Einstein em 1905. Ao ser pontuado diversas formulações que se sucederam ao ano de 1905 por outros físicos, foi possível notar que os resultados influenciam até hoje o âmbito das ciências, seja na teoria estocástica ou na teoria cinética dos gases, como também entre diversas outras áreas do conhecimento, seja na biologia, química, matemática ou engenharia, mostrando que à medida que se explora e entende a natureza dessa questão, se é possível responder questões intrigantes e, dessa forma, avançar não apenas no ramo da física, mas principalmente em todas as áreas da ciência para as quais esse problema está ligado.
Bibliografia.
SILVA, J.M. Um estudo na teoria do movimento browniano com viscosidade variável. 2004. Dissertação (Mestrado em Física) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, [S. l.], 2004. Disponível em: https://repositorio.ufrn.br/bitstream/123456789/16556/1/JoaoMS.pdf. Acesso em: 4 abr. 2024.
SILVA, J.M; LIMA, J.A.S. Quatro abordagens para o movimento browniano. Revista Brasileira de Ensino de Física, [s. l.], ano 25, v. 29, n. 1, p. 35, 2007. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbef/a/TRWLppxWyjNYXgNB5XTHTzm/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: 4 abr. 2024.
Stachel, J. O ano miraculoso de Einstein: cinco artigos que mudaram a face da física. Rio de Janeiro/RJ. Editora da UFRJ, 2001.
Salinas, S. Einstein e a Teoria do Movimento Browniano. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 27, n. 2, p. 263-269, (2005).
PAIS, A. Sutil é o Senhor: a vida e a ciência de Albert Einstein. Rio de Janeiro/RJ, Editora Nova Fronteira, 1995.
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