FORMAÇÃO DOCENTE E O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA NO CURSO DE QUÍMICA DO CENTRO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE

  • Autor
  • Vitória Regina Ferreira Mendes
  • Co-autores
  • Albaneide Fernandes Wanderley
  • Resumo
  •  

    INTRODUÇÃO:

     

    A definição de inclusão, vinda do termo latim includere significa entrar em lugar fechado, porém, no contexto social atual, a palavra inclusão assumiu um significado voltado a integralização absoluta de pessoas que possuem necessidades especiais ou específicas. Em termos gramaticais, é substantivo feminino, na aplicação prática é a capacidade de um indivíduo entender e reconhecer o outro, ainda que diferente de si. (FARIAS, et al, 2009). A Lei Nº 13.146, de 6 de julho de 2015, Art. 1º declara que é instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), que tem como objetivo garantir e promover condições de igualdade a uma pessoa com deficiência, visando a sua cidadania e inclusão social (BRASIL, 2015). 

    Estando entre as deficiências asseguradas pela lei de inclusão, o Transtorno do Espectro Autista (TEA) é caracterizado, pela dificuldade na socialização, com pouca comunicação, podendo ser ela verbal ou não-verbal, além de interesses bastante específicos, em que cada indivíduo dispõe do seu próprio objeto de estima (HELENO et. al, 2020). Os desafios enfrentados pelos autistas na sociedade são diversos, pois muitos não conseguem desenvolver uma comunicação clara e objetiva, levando em consideração o fato de ser uma deficiência sem traços físicos claros, isso os sujeita ainda mais ao preconceito, prejudicando o seu desenvolvimento acadêmico, ingresso no mercado de trabalho, entre outros espaços aos quais sejam de interesse do indivíduo (BENTES, 2016).

    Há uma forte ligação entre a inclusão dos alunos com deficiências e as necessidades de adaptação da instituição de ensino, em que as aptidões educativas de estudantes psicóticos ou autistas são desconsideradas, por haver maior comprometimento do déficit cognitivo, ao mesmo ponto em que as escolas e os professores não são preparados para recebê-los. Desse modo, ainda que a interação de pares, principalmente de mesma idade, demonstre grande influência para o crescente desenvolvimento de novas habilidades, a falha no processo de inclusão pode retardar essa evolução. (CARMARGO, 2009). Com isso, é necessário reconhecer a importância da preparação do docente para assumir uma sala de aula inclusiva, tendo em mente que o mesmo deverá mediar o conhecimento com equidade, atentando as necessidades de cada um deles/delas, de modo que alcancem autonomia e possam se desenvolver o pensamento crítico e reflexivo. Observando que na Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2018), que apresenta competências gerais e específicas, nota-se que algumas destas competências estão relacionadas a inclusão, podemos citar a competência geral 4 (quatro)  que incentiva o uso de diferentes linguagens - verbal (oral ou visual-espacial), corporal, visual, sonora e digital para se expressar em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo, destaca-se também a competência 9 (nove), que versa sobre o exercício da empatia, do diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, competência importante para se fazer respeitar e promover o respeito ao outro e aos direitos humanos. 

    Ainda fazendo referência a BNCC, a área de Ciências da Natureza é abordada temáticas envolvendo Química, Física e Biologia, que oportuniza a obtenção de conhecimentos práticos, para identificação e realização de tarefas do dia a dia dos estudantes, além de conhecimentos mais abrangentes no que diz respeito às três temáticas propostas: Matéria e Energia, Vida e Evolução e Terra e Universo. Neste contexto, é possível concluir que o ensino de Química é de grande importância para o desenvolvimento de todos os cidadãos sendo eles típicos ou atípicos, para compreensão do mundo em que vivem, assim, se faz necessário uma adaptação no currículo dos cursos de formação de professores para o exercício de uma sala de aula como espaço de inclusão. 

    David Rodrigues (2014), em seu trabalho intitulado de “Os desafios da equidade e da inclusão na formação de professores”, faz uma análise sobre a educação personalizada, evidenciando-a como uma prática fortemente ligada à equidade e inclusão, essa educação refere-se ao suporte que os sistemas educativos são capazes de mobilizar para prevenir, evitar e enfrentar as dificuldades e o insucesso. São medidas tomadas pesando nas habilidades que o aluno já possui e nas que ele pode vir a desenvolver. Levando em conta que o momento onde o futuro docente vem a ser lapidado é em sua graduação, deve-se considerar que a mesma venha a contribuir para a formação de um profissional capaz de aplicar a equidade em sua sala de aula. Nessa perspectiva, o trabalho proposto visa analisar a formação docente no curso de Química-Licenciatura do CFP/UFCG para o ensino à estudantes autistas. 

     

    METODOLOGIA:

     

    O procedimento metodológico utilizado para a realização desta pesquisa baseou-se em uma abordagem qualitativa (BAUER; GASKELL, 2003), que consiste em um conjunto de práticas interpretativas e materiais a partir de considerações feitas após um estudo das ementas das disciplinas que compõem o Projeto Pedagógico do Curso (PPC) do curso de Licenciatura em Química, ofertado pela Universidade Federal de Campina Grande, no campus de Cajazeiras – PB (UFCG-CZ).

    Optando por analisar o seguimento empregado pelas disciplinas ofertadas pela instituição, para que fossem investigadas as possíveis lacunas no fluxograma do curso, este ensaio pode ser descrito como exploratório (GIL, 2002). 

    Utilizou-se das seguintes palavras-chave para realizar uma pesquisa no ementário e identificar as disciplinas que oferecem uma formação para Transtorno do Espectro Autista: inclusão, inclusiva, educação inclusiva, autismo, transtorno do espectro autista, TEA, transtorno, transtorno global do desenvolvimento.

     

    RESULTADOS E DISCUSSÃO:

     

    O ementário utilizado pelo curso data no ano de 2011, sendo dividido em: componentes básicos obrigatórios, com o total de 39 disciplinas; componentes complementares obrigatórios, com apenas 4 disciplinas; e componentes complementares optativos, em que são ofertadas 8 disciplinas, as quais os estudantes precisam cursar no mínimo duas optativas que atinjam o total de 8 créditos e 120 horas. 

    Das disciplinas que constituem o componente curricular obrigatório, apenas uma é selecionada quando faz-se uso dos filtros, correspondendo à apenas 2,56% do currículo obrigatório: Inclusão, Inclusiva, Autismo, Transtorno do Espectro Autista, TEA, Transtorno, Transtorno global do desenvolvimento. Entre os componentes complementares obrigatórios e os complementares optativos, fazendo uso dos mesmos filtros, não foi possível encontrar disciplina que apresentasse alguma dessas palavras-chave em suas ementas.

    A disciplina obtida por meio dos filtros utilizados foi “Educação Etnicorracial e Diversidade”, contendo a palavra-chave: inclusão em sua ementa que diz o seguinte: “Desenvolvimento de estudos relacionados com a formação do Povo Brasileiro, em especial, os Afrodescendentes e os Indígenas. As condições históricas e materiais em que se dão as vidas dos Afrodescendentes e dos Indígenas no Brasil Contemporâneo. O sentido da inclusão dos Afrodescendentes e dos povos Indígenas. A Educação dos Povos do Campo”. Sendo a educação assegurada pela Lei Nº 11.645, de 10 março de 2008. que determina a obrigatoriedade do ensino étnico racial na educação básica e também no ensino técnico e superior. 

    A Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) também tem a sua obrigatoriedade garantida pela Lei Nº 10.436, de 24 de abril de 2002, sendo essa a segunda língua oficial do país. Ainda que LIBRAS não tenha sido coletada através da filtragem utilizada, a disciplina proporciona aos seus discentes uma nova perspectiva, bem diferente da que estão acostumados, colocando-os cara a cara com o desafio de se aperfeiçoar para além dos conteúdos de química, atingindo uma preparação para verdadeira sala de aula, onde os discentes apresentam as mais diferentes necessidades e o papel do professor é ofertar a melhor qualidade de ensino, sendo mediador do conhecimento. 

    As disciplinas destacadas acima fazem parte da grade curricular que corresponde a formação pedagógica. Ainda que elas proporcionem uma visão voltada para a diversidade, a ementa de nenhuma delas oferece preparação ao docente para desenvolver atividades com os estudantes que estejam no espectro (estudantes com TEA) ou que possuam algum outro Transtorno Global do Desenvolvimento.

    Sabóia (2024) destaca que os bloqueios na aprendizagem na disciplina de química se assemelham ao Ensino de Ciências, porém, por ser apresentada aos estudantes apenas no ensino médio, ainda requerendo bagagem que comportem noções de matemática associadas aos fenômenos da natureza, já exige do docente metodologias que atendam ao público de alunos típicos. Para estudantes atípicos, a necessidade de desenvolver atividades metodológicas adaptadas é superior. Por este motivo faz-se essencial uma capacitação docente que atenda a demanda especial dos discentes com TEA, para que não haja prejuízos em sua formação acadêmica advindos da deficiência dos seus professores. 

     

    CONCLUSÃO:

     

    Considerando o encadeamento dos preceitos teóricos seguidos pelos dados analisados ao longo deste trabalho, pôde-se afirmar que existe uma vacância na capacitação docente ofertada pela instituição, ao se analisar que apenas duas disciplinas: uma com ementa mais e específica (Língua Brasileira de Sinais) e outra muito abrangente (Educação étnico racial e diversidade), não sejam suficientes para promover a preparação necessária para o futuro professor atender as demandas de uma sala de aula inclusiva, principalmente com estudantes com TEA.

    Além disso, vale salientar que o Ementário utilizado pelo curso data do ano de 2011, estando a mais de 10 anos sem alteração, faz-se necessária uma reestruturação da proposta curricular ofertada para satisfazer a demanda social atual.

     

    AGRADECIMENTOS:

     

    Agradecemos à Universidade Federal de Campina Grande, ao Centro de Formação de Professores, à Unidade Acadêmica de Ciências Exatas e da Natureza e à Coordenação do curso de Licenciatura em Química pelo apoio no desenvolvimento desta pesquisa.

    REFERÊNCIAS:

     

    BAUER M. W., GASKELL G. Pesquisa Qualitativa com texto, imagem e som – Um manual prático. Tradução de Pedrinho A. Guareschi. 2ª edição. Editora Vozes. Petrópolis, 2003. ISBN 85.326.2727-7.

    BENTES, C. C. A. et al. A família no processo de inclusão social da criança e adolescente com autismo: Desafios na sociedade contemporânea. Intertem@ s Social ISSN 1983-4470, v. 11, n. 11, 2016.

    BRASIL. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena” - LEI Nº 11.645, de 10 março de 2008.

    _______. Câmara dos Deputados. SÉRIE Legislação N° 200. Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. 

    _______, Lei 10.436, Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília 24 de abril de 2002.

    BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.

    CAMARGO, Síglia Pimentel Höher; BOSA, Cleonice Alves. Competência social, inclusão escolar e autismo: revisão crítica da literatura. Psicologia & sociedade, v. 21, p. 65-74, 2009.

    FARIAS, I. R.; SANTOS, A. F.; SILVA, É. B. Reflexões sobre a inclusão linguística no contexto escolar. Educação inclusiva, deficiência e contexto social: questões contemporâneas [online]. Salvador: EDUFBA, p. 39-48, 2009.

    GIL, A. C. (2002) Como elaborar projetos de pesquisa. 4ª ed. São Paulo: Atlas S/A.

    HELENO, A. L. Z. L. et al. TEA - TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: CONCEITOS E INTERVENÇÕES DA SAÚDE E DA EDUCAÇÃO. Revista Científica Integrada, v.04, ed. 04. Julho de 2020. Disponível em: . Acesso em: 05 de abril de 2023.

    RODRIGUES, D. Os desafios da equidade e da inclusão na formação de professores. Revista de Educación Inclusiva, v. 7, n. 2, 2017.

     

    SABÓIA, L.L; LIMA, M.L.S.O. O AUTISMO NO ENAINO DE QUÍMICA BRASILEIRO: UMA REFLEXÃO. Química Nova, Vol. 47, No. 1, e-20230084, 1-8, 2024.

     

     

  • Palavras-chave
  • TEA, autismo, ensino, docência, formação, química.
  • Modalidade
  • Comunicação oral
  • Área Temática
  • Química, Ensino de Química e Tecnologias Aplicadas
Voltar

Congresso Nacional de Ciência e Tecnologia em uma Perspectiva Interdisciplinar buscou reunir discentes, docentes, pesquisadores e profissionais nas mais diversas áreas do conhecimento e que tem interesses em comum no debate e interações a respeito da Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente nos contextos da Educação 5.0. Além disso, por ser um evento de caráter multidisciplinar, permitiu a divulgação de estudos e experiências concluídas ou em andamento relacionadas a referida temática, fomentando a pesquisa científica na região e promovendo oportunidades de disseminação da informação e atualizações na área. Os anais reunem vinte trabalhos publicados no formato de resumos expandidos e foram analisados criteriosamente pela comissão científica em pares, de modo a garantir a excelência científica. 

  • Ciências Biológicas, Ensino de Biologia e Tecnologias Aplicadas
  • Física, Ensino de Física e Tecnologias Aplicadas
  • Química, Ensino de Química e Tecnologias Aplicadas
  • Matemática, Educação Matemática e Tecnologias Aplicadas
  • Educação inclusiva no Ensino das Ciências
  • Educação Ambiental, Sustentabilidade e suas implicações no contexto do Semiárido Brasileiro
  • Tecnologias Educacionais e Formação de Professores
  • Gênero e educação para as relações étnico-raciais no Ensino de Ciências
  • Gênero e educação para as relações étnico-raciais no Ensino de Ciências
  • Iniciação Científica na Educação Básica

Comissão Organizadora

Everton Vieira da Silva - Presidente

Edilson Leite da Silva

Diego Marceli Rocha

Jefferson Antônio Marques

Délio Jackson Dantas Duarte

Albaneide Fernandes Wanderley

Comissão Científica

Albaneide Fernandes Wanderley

André Pereira da Costa

Caio Fabio Teixeira Correia 

Darlei Gutierrez Dantas Bernardo Oliveira 

Diego Marceli Rocha

Edilson Leite da Silva

Eudes Leite de Lima

Everton Vieira da Silva

Ezequiel Fragoso Vieira Leitão

Fernando Antônio Portela da Cunha

Francisco José de Andrade

Gustavo de Alencar Figueiredo

Hugo da Silva Florentino

Jefferson Antônio Marques

Letícia Carvalho Benitez

Marcos Antônio G. Pequeno

Maria do Socorro Pereira

Sílvio Felipe Barbosa de Lima

Udson Santos

Veralucia Santos Barbosa
 

 

Unidade Acadêmica de Ciências Exatas e da Natureza - UACEN

Centro de Formação de Professores - CFP

83 3532-2090

E-mail: uacen.eventos@gmail.com/uacen.cfp@gmail.com