No cenário atual, observa-se uma crescente normalização do consumo de alimentos ultraprocessados, marca registrada da dieta ocidental contemporânea, estudo epidemiológico que envolveu a análise de dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) nos anos de 2015 e 2020 demonstra aumento significativo no consumo de hambúrgueres e embutidos (83,3%), biscoitos (39,1%) e bebidas açucaradas (25,5%) no Brasil. Dessa forma, esses produtos, altamente industrializados e formulados para maximizar a palatabilidade, apresentam elevados teores de açúcares e gorduras, o que favorece seu consumo excessivo e contribui significativamente para o desenvolvimento de doenças metabólicas e obesidade. Em um estudo recente do UK Biobank, o consumo de AUP (Alimentos Ultraprocessados) foi relacionado a um maior risco de múltiplos indicadores de obesidade.Tal padrão alimentar como se observa está diretamente associado ao aumento da prevalência de obesidade, diabetes tipo 2 e disfunções intestinais, e consequentemente mortes prematuras atribuíveis ao consumo desses alimentos ??no Brasil, segundo a Revista Americana de Medicina Preventiva (2023). Com o intuito de mitigar os efeitos deletérios provocados por esses hábitos alimentares modernos, o presente estudo investigou os efeitos da suplementação com butirato — um ácido graxo de cadeia curta (AGCC) produzido pela microbiota intestinal a partir da fermentação de fibras alimentares. O butirato tem sido amplamente reconhecido por suas propriedades anti-inflamatórias Em uma revisão recente de Bridgeman et al., de 14 estudos que examinaram os efeitos do butirato na obesidade em animais alimentados com HFD, o butirato reduziu significativamente o ganho de peso em 10 estudos, além de seu papel na manutenção da homeostase imunológica e na preservação da integridade da barreira intestinal, aspectos essenciais à prevenção de distúrbios metabólicos .
Para simular os padrões alimentares característicos da dieta ocidental, camundongos da linhagem C57BL/6 foram alimentados com uma dieta do tipo cafeteria, composta por 25% de amendoim,(DaColônia Alimentos Naturais® LTDA, Rio Grande do Sul, Brasil), 25% de chocolate ao leite (Nestlé, São Paulo, Brasil), 12,5% de bolacha maisena (Marilan, Marília, SP, Brasil) e 37,5% de ração Nuvilab® (Curitiba, Paraná, Brasil), além de receberem suplementação com butirato encapsulado. O encapsulamento foi adotado com o objetivo de facilitar a manipulação do butirato e melhorar sua aceitação pelos animais. Essa tecnologia foi desenvolvida por meio de gelificação iônica com hidroxietilcelulose (HEC), feita em colaboração com o grupo de pesquisa em Nanomateriais e Nanotecnologia da UNIFESP-SJC. Os animais foram distribuídos em quatro grupos experimentais: dieta padrão (DP), dieta de cafeteria (DC), dieta de cafeteria suplementada com butirato encapsulado (BUTHEC; 8 g/kg) e dieta de cafeteria suplementada com fibra (FIBRA; 9,6 g/kg). Durante o período experimental, foram avaliados quanto ao consumo alimentar e ao ganho de peso corporal. E ao final do tratamento, amostras de tecido (intestinos, fígado e fezes) foram coletadas para análises. A expressão gênica foi analisada por qPCR, com foco em genes relacionados à inflamação, à integridade da barreira intestinal e ao metabolismo hepático.
Os resultados demonstraram que o grupo BUTHEC apresentou maior consumo alimentar quando comparado aos demais grupos. (BUTHEC vs. CF: p = 0,0038; BUTHEC vs. FIBRA: p = 0,00385), Porém, apresentou menor ganho de peso comparado ao grupo FIBRA (p=0.0326). A análise da expressão gênica revelou que a suplementação com butirato promoveu aumento significativo da expressão de Alpi (p =0.03826) e Tjp1 (p =0.0329).), além de reduzir a expressão dos receptores Ffar2(p = 0.0419) e Ffar3 ( p = 0.0136) no íleo, em relação ao grupo alimentado com dieta de cafeteria sem suplementação. A elevação da expressão de Alpi, cuja regulação é induzida tanto por butirato quanto por fibra alimentar, está associada à neutralização de endotoxinas bacterianas, sugerindo uma importante ação anti-inflamatória local. Já a indução específica de Tjp1 pelo butirato aponta para uma possível melhora na integridade da barreira intestinal, com redução da permeabilidade intestinal e, consequentemente, da inflamação sistêmica.No fígado, o butirato promoveu uma regulação negativa da expressão do gene Cd36 (BUTHEC vs. CF p=0.0317), relacionado à captação e metabolismo de lipídios. Essa modulação pode ter contribuído para a redução do ganho de peso observada no grupo BUTHEC, ao limitar o acúmulo de lipídios hepáticos e promover uma maior eficiência metabólica.
Por fim, esses dados reforçam o potencial benéfico do butirato à saúde, demonstrado pela redução do ganho de peso corporal em animais submetidos a uma dieta hipercalórica, além da atenuação de processos inflamatórios, dos níveis glicêmicos e de comorbidades associadas à obesidade. Atuando diretamente na modulação da expressão gênica intestinal e hepática, o butirato também exerce um papel regulador sobre o sistema imunológico e a microbiota intestinal, promovendo um ambiente intestinal mais equilibrado e menos suscetível ao desenvolvimento de doenças metabólicas crônicas, como obesidade, diabetes tipo 2 e esteato-hepatite associada à disfunção metabólica (MASH). Os resultados ressaltam o potencial terapêutico do butirato mesmo diante de padrões alimentares desequilibrados, típicos do estilo de vida contemporâneo, indicando sua viabilidade como estratégia eficaz e acessível para mitigar os efeitos deletérios da dieta ocidental moderna.
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Estudantes de biologia da Universidade Estadual de Campinas.
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