Estratégias de Evolução Laboratorial Adaptativa em melaço de cana-de-açúcar para a otimização de uma plataforma microbiana de fermentação de alta gravidade

  • Autor
  • Wanessa Rebecca Maia Dutra
  • Co-autores
  • Thiago Inácio Gaspar , Gonçalo Amarante Guimarães Pereira , Fellipe da Silveira Bezerra de Mello
  • Resumo
  • Em um contexto de mudanças climáticas, a busca por fontes energéticas renováveis tem se intensificado globalmente para reduzir a dependência de combustíveis fósseis e as emissões de gases de efeito estufa. O Brasil se destaca nesse cenário, produzindo, junto aos Estados Unidos, cerca de 70% do bioetanol mundial. Desde a década de 1970, com o Proálcool, o país consolidou sua posição como referência na produção de biocombustíveis a partir da cana-de-açúcar. Atualmente, programas como o RenovaBio e a Lei dos Combustíveis do Futuro fortalecem essa liderança, incentivando o uso de novas biomassas. Entre elas, o melaço de cana-de-açúcar se destaca como subproduto de alta disponibilidade, renovabilidade e de baixo custo, gerado na indústria do açúcar. Este substrato é formado nas etapas finais da cristalização da sacarose e contém açúcares fermentescíveis (glicose, sacarose e frutose), compostos nitrogenados e sais. Nesse contexto, as altas concentrações de açúcares, baixos pHs e elevadas temperaturas oriundas do processo industrial tornam esse meio desafiador para a fermentação por Saccharomyces cerevisiae. Diante disso, surge a necessidade de aprimorar cepas capazes de suportar essa complexidade, enfrentando estresses simultâneos. Uma alternativa promissora é a evolução laboratorial adaptativa (ELA), por permitir o aperfeiçoamento de fenótipos sem edição direta do genoma. A aplicação da ELA à fermentação visa desenvolver cepas mais robustas frente às condições industriais. Entretanto, muitas abordagens atuais utilizam meios sintéticos, que não representam os desafios reais do processo.

    Este projeto tem como objetivo adaptar e comparar três estratégias distintas de ELA em cepas híbridas de S. cerevisiae previamente construídas, com foco na fermentação de melaço em alta gravidade (>200g/L de açúcares redutores totais ou ART). Busca-se o desenvolvimento de linhagens superiores para aplicação industrial. Para isso, as cepas serão expostas a estresses relevantes usando o próprio melaço como substrato e agente seletivo. Ao longo da evolução, serão monitorados o consumo de açúcares e a produção de etanol, visando à seleção da abordagem mais eficiente. As cepas finais serão testadas em biorreatores sob condições que simulam o ambiente industrial e serão sequenciadas para identificação de mutações benéficas fixadas.

    Três estratégias distintas serão aplicadas: Multishock, Exposição Contínua e Exposição Periódica. Na Multishock, as células serão cultivadas por 10 passagens em meio ótimo (YPD) para permitir o surgimento de mutações e aumento da variabilidade genética e, na última passagem, expostas a um choque de estresse osmótico e etanol. Na Exposição Contínua, haverá passagem seriada em concentrações crescentes de açúcares. Na Exposição Periódica, as leveduras serão alternadas entre meios com alto estresse osmótico e YPD, permitindo seleção e recuperação celular. Para ambas evoluções líquidas, o processo inicia-se com melaço diluído a 200 g/L de ART e se encerra quando houver crescimento e consumo satisfatórios em 350 g/L de ART. Para validação da eficiência das cepas finais, fermentações serão realizadas em biorreatores de 3,6 L com volume de 2 L de melaço B e C, com controle de oxigênio dissolvido.

    Até o momento, foram realizadas evoluções pela estratégia Multishock. Nesse processo, uma linhagem híbrida F1_PH2, oriunda do cruzamento entre as linhagens F1, com alto rendimento 12,5% de etanol (v/v) em alta densidade, marca inédita para fermentação de melaço, e PH2 altamente tolerante a baixos pHs, foi utilizada. Para a Multishock, adaptações foram feitas para uso em meio sólido, gerando as populações MA, MB e MC.

    A população MA foi submetida a 10 passagens em YPD e, ao final, transferida para 4 placas com 350 g/L de ART, e com variações de 12, 13, 14 e 15% (v/v) de etanol, sendo exposta de forma simultânea ao choque osmótico e de etanol. O aparecimento de colônias apenas na placa com mais estressores (350g/L de ART e 15% EtOH) levou à designação de uma população MA15%. Já na MB foi cultivada diretamente em 350 g/L de ART, com elevação gradual da concentração de etanol até 15%, ou seja, deu-se inicialmente um choque osmótico na população, com aumento gradual da concentração de etanol, até 15% (v/v). Ao atingir crescimento estável nessa condição, a população foi nomeada MB15%. Enquanto isso, a população MC passou por um processo adaptativo brando, com 10 passagens em 200 g/L de ART, intercaladas por rounds de 20 segundos de luz UV, para induzir mutações e evitar trade-offs abruptos associados às condições extremas de 350 g/L de ART.

    Após os ciclos de evolução, todas as populações foram submetidas à fermentação em altíssima gravidade. MB15% apresentou o melhor desempenho, produzindo aproximadamente 7,77% mais etanol que a cepa comercial Ethanol Red — uma diferença absoluta de 5,58 g/L. A partir dessa população, foram isolados 285 indivíduos para triagem. Por meio de análises de crescimento, o clone G10 foi selecionado, com produção de etanol de 6,4%, rendimento (yield) de 0,39 g/g e eficiência 27% superior à da cepa parental.

    Os resultados confirmam a eficácia da abordagem Multishock na melhoria do desempenho fermentativo em meios industriais complexos. A utilização do próprio melaço como meio seletivo se mostrou essencial para uma seleção realista de características adaptativas. Nos próximos passos, as estratégias de Exposição Contínua e Periódica seguirão com novos isolados, buscando validar e ampliar os ganhos obtidos. Novas fermentações serão conduzidas em biorreatores, com diferentes níveis de gravidade e controle de parâmetros industriais. O sequenciamento genômico das cepas adaptadas permitirá identificar mutações fixadas, fornecendo subsídios para estratégias futuras de melhoramento racional de leveduras.

    Este projeto, portanto, contribui de forma significativa para o avanço da biotecnologia aplicada à produção de etanol, promovendo uma abordagem inovadora e realista frente aos desafios industriais impostos pelo uso de substratos como o melaço.

  • Palavras-chave
  • Melaço de cana-de-açúcar, Evolução Laboratorial Adaptativa, Etanol
  • Modalidade
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Comissão Organizadora

Estudantes de biologia da Universidade Estadual de Campinas. 

 

 

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