Os tubarões e raias são um grupo de grande diversidade ecológica, com representantes de variados hábitats, preferências alimentares, comportamentos sociais e modos de reprodução, refletidos em variações na organização do encéfalo desses animais, conceituadas como “cerebrótipos”. Apesar de serem um grupo basal para estudo da neurobiologia de vertebrados, os elasmobrânquios carecem de pesquisas específicas na área, sobretudo no caso das raias. Dessa forma, o presente trabalho buscou identificar correlações entre a caracterização encefálica e aspectos ecológicos de duas espécies de raias de hábitos distintos: a raia-viola Pseudobatos horkelli, bentônica e sugerida ser pouco social, e a ticonha Rhinoptera bonasus, bentopelágica e de comportamento social, por meio da análise da densidade celular no encéfalo das espécies. Para isso, os encéfalos (três por espécie) foram retirados e fixados em formaldeído 4% em solução salina tamponada com fosfato, mantidos armazenados em solução de álcool 70% até o manejo. O tecido nervoso foi então dissecado nas regiões do telencéfalo, diencéfalo, medula oblonga (com a ponte), cerebelo e mesencéfalo. Todas as regiões foram pesadas e tiveram seu número de células e índice de densidade celular (células por mg) estimados de acordo com o protocolo do Fracionador Isotrópico. Os dados foram comparados por análise de variância (ANOVA) para densidades intraespecíficas entre as regiões e teste t para interespecíficas, após ter sido validada a normalidade e homocedasticidade. Nos resultados preliminares, apenas o diencéfalo apresentou diferença significativa entre as espécies (p=0,03). Em R. bonasus, espécie bentopelágica que se desloca em grandes cardumes, a região do diencéfalo exibiu maior densidade celular que em P. horkelii, possivelmente relacionada à alta demanda de processamento de estímulos sensoriais advindos do habitat pelágico, como a detecção de vibrações na água pela linha lateral. Na análise intraespecífica, o diencéfalo de R. bonasus exibiu valores de densidade intermediários entre o cerebelo (maior densidade) e as restantes regiões (menor densidade), que foram agrupadas juntas. No caso de P. horkelii, as densidades compuseram dois grupos, o primeiro contendo o cerebelo, de maior densidade, e o segundo, as demais regiões, sugerindo uma organização celular semelhante entre elas. Em ambas as espécies, o cerebelo se destacou das demais regiões por exibir alta densidade celular, o que condiz com dados de outros vertebrados em literatura. Em R. bonasus, o adensamento do cerebelo parece ter relação com controle motor fino necessário para o uso dos lobos cefálicos característicos da espécie, movimentados durante o forrageamento. Em P. horkelii, a alta densidade celular na região pode representar um mecanismo compensatório de um cerebelo menor e menos foliado, pelo aumento de células funcionais, mas redução de seu tamanho. Estes dados indicam que a densidade celular encefálica pode ser um parâmetro que explica aspectos ecológicos particulares de cada espécie e elucida padrões de funcionalidade não perceptíveis em escala macroscópica (e.g. tamanho e estado de foliação). Pensando nisso, a análise de mais espécimes e espécies em andamento visa enriquecer os resultados e ampliar o entendimento acerca da neuroecologia de batoides.
Comissão Organizadora
Estudantes de biologia da Universidade Estadual de Campinas.
Em caso de dúvida, envie um email para contato@caeb.com.br