Polyplacophora (Mollusca) da Antártica: aspectos taxonômicos e morfológicos de duas espécies coletadas pelo Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR)
Departamento de Biologia Animal – Instituto de Biologia (DBA-IB-UNICAMP)
A Antártica é caracterizada por uma vasta diversidade de organismos marinhos, destacando-se, dentre aqueles da fauna bentônica, os moluscos, com cerca de 300 espécies, principalmente de Gastropoda e Bivalvia. Desde o século XIX, estes animais vêm sendo coletados por expedições científicas de diversos países, enriquecendo coleções pelo mundo todo, incluindo o Brasil, que iniciou suas explorações em 1982 com a implementação do Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR). Assim, no Museu de Diversidade Biológica (MDBio) do IB-UNICAMP, estão sendo reunidas numerosas amostras de Mollusca coletadas desde as primeiras expedições brasileiras, dentre eles os Polyplacophora, popularmente chamados de quítons. Estes são moluscos conhecidos por ocorrerem na região entremarés a até águas profundas, em geral, sobre substrato rochoso, vivendo aderidos em seu modo de vida bentônico epifaunal. São caracterizados pela concha formada por oito placas, presentes em seu corpo achatado dorso-ventralmente; contornando-as, existe o manto expandido em forma de um cinturão, que pode cobri-las parcial ou totalmente, e cuja epiderme apresenta espículas e escamas que podem ter diferentes padrões de tamanho, forma e disposição, importantes na taxonomia desse grupo e na identificação das espécies. Apesar das espécies antárticas de Polyplacophora estarem bem descritas originalmente, algumas complementações tornam-se necessárias nos dias atuais. Com auxílio de novas tecnologias e equipamentos é possível explicitar e evidenciar características que antes estavam apenas no campo imaginário das descrições originais, ou que ainda não tinham sido descritas, auxiliando na análise dos aspectos taxonômicos e morfológicos da classe a fim de contribuir para o fomento dos estudos taxonômicos destes animais, que muitas das vezes não são tão visados dentro do ramo da malacologia. Desse modo, neste estudo objetivou-se detalhar e ilustrar as principais características de duas espécies de Polyplacophora da Antártica, Callochiton bouveti Thiele, 1906 (Callochitonidae) e Nuttallochiton mirandus (Thiele, 1906) (Mopaliidae), buscando aumentar os conhecimentos científicos acerca dessas espécies, melhor entender a diversidade do grupo como um todo e, mais especificamente, suas características taxonômicas e morfológicas; além disso, enriquecer a coleção do MDBio através da identificação e depósito dos espécimes. Os exemplares de Polyplacophora foram coletados através de expedições feitas pelo Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR) durante os anos de 1982 a 1988; no momento, essas amostras estão preservadas em álcool 70%. Após a identificação das espécies, os indivíduos foram medidos, fotografados e analisados minuciosamente sob estereomicroscópio a fim de observar suas características gerais, como a disposição das placas e do cinturão, bem como o posicionamento das espículas do manto. Posteriormente, as placas foram retiradas para uma análise da sua ornamentação na face dorsal, de suas apófises e placas de inserção, e de detalhes da face ventral. Além disso, foi retirada partes do cinturão para uma visão aprofundada das escamas e espículas; igualmente, a rádula de alguns exemplares foi removida e seus dentes analisados. Fotografias foram feitas com auxílio de uma câmera acoplada ao estereomicroscópio. Callochiton bouveti é a espécie mais abundante nas amostras, com 13 espécimes coletados entre 96 e 275 metros de profundidade ao longo do Estreito de Bransfield, próximo às Ilhas Shetland do Sul. Possui tamanho relativamente pequeno, entre 7 e 20 mm de comprimento. Suas placas apresentam as áreas jugal, pleural e lateral distintas, com quatro a cinco listras demarcando as áreas pleurais, facilitando sua identificação; possuem uma aparência granulosa e porosa. As espículas apresentam-se diferenciadas quando comparadas nas faces dorsal e ventral do cinturão, com tamanhos, disposições e agrupamentos diferentes, sendo mais grosseiras no dorso e mais delicadas e refinadas no ventre. Em um dos exemplares, este de 15 mm, foi possível contabilizar o número de brânquias, sendo 20 dispostas de cada lado da cavidade do manto (também chamada de sulcos palial), 40 brânquias no total. Existem outras duas espécies de mesmo gênero que já foram encontradas na Antártica: C. gaussi Thiele, 1908 e C. steinenii (Pfeffer, 1886). Nuttallochiton mirandus, com 9 indivíduos coletados entre 96 e 280 metros de profundidade, apresenta uma morfologia completamente diferente de C. bouveti. É uma espécie que alcança tamanhos maiores (e mesmo quando comparado com outras espécies viventes na Antártica), sendo que nas amostras examinadas há indivíduos com até 50 mm de comprimento. Possui uma coloração levemente rosada e as placas são quilhadas, sendo a cefálica ornamentada sinuosamente em sua borda anterior. Costelas estão dispostas radialmente nas áreas jugais das placas, característica marcante que diferencia essa espécie de outra do mesmo gênero, N. hyadesi (Rochebrune, 1889), que possui as costelas nas áreas centrais das placas dispostas longitudinalmente. Ambas as espécies são características da Antártica, ou seja, são comumente encontradas no oceano que banha o continente; entretanto, N. mirandus é conhecida por ser estritamente antártica. Apesar de serem espécies frequentes, o estudo delas é importante para o entendimento da taxonomia dos Polyplacophora, fornecendo dados para compreender a diversidade morfológica do grupo, nos auxiliando também no entendimento de como vivem e interagem com seu habitat, que por sua vez é extremamente interessante, com características únicas relacionadas ao clima extremo.
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