Autores: Guilherme Santos de Freitas¹, Tassiana Cristina Talpo¹, Kelly Cristina Pereira Bem¹, Guilherme Augusto da Silva Nogueira², Helena Cristina de Lima Barbosa¹.
¹ Laboratório do Pâncreas Endócrino e Metabolismo, Instituto de Biologia, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo.
² Laboratório de Sinalização Celular, Departamento de Fisiopatologia Médica, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo.
INTRODUÇÃO: A obesidade corresponde a uma condição em que há um desequilíbrio entre a ingestão e o gasto energético, resultando em excesso de gordura corporal, sendo um importante fator de risco para diversas doenças crônicas. Entre seus efeitos, destaca-se o acúmulo de triglicerídeos e colesterol no fígado, levando à esteatose hepática e aumento do processo inflamatório que estimula a liberação de citocinas pró-inflamatórias, como TNF-Alfa, contribuindo para a disfunção metabólica hepática. A glicogênese é essencial para o armazenamento de glicose e o controle glicêmico e, quando os níveis de glicose no sangue aumentam, o fígado converte o excesso de glicose em glicogênio para reserva energética. O sistema nervoso central, em especial o hipotálamo, é capaz de regular o metabolismo hepático por meio do sistema nervoso autônomo, influenciando nos processos de gliconeogênese, glicogenólise, glicogênese e lipogênese hepática, contribuindo para a regulação da homeostase energética. A irisina, uma adipomiocina liberada na corrente sanguínea após a contração muscular decorrente do exercício físico, está relacionada a múltiplos efeitos benéficos no metabolismo, tais como a captação de glicose pelo músculo esquelético e o browning do tecido adiposo. No fígado, o tratamento periférico com irisina apresentou inibição da síntese de colesterol hepático. Além de sua ação na periferia, a irisina também é capaz de atravessar a barreira hematoencefálica e o tratamento central crônico com irisina mostrou reduzir triglicerídeos e colesterol plasmáticos, além de induzir a expressão gênica de UCP1 no BAT de ratos, indicando seus efeitos periféricos via um mecanismo central de ação. Até o momento, não existem informações sobre os efeitos centrais da irisina na modulação do metabolismo hepático.
OBJETIVOS: Este estudo tem como objetivo identificar os efeitos periféricos hepáticos do tratamento crônico intracerebroventricular (ICV) com irisina, em camundongos submetidos ao modelo de obesidade induzida por dieta, em relação ao metabolismo glicêmico e marcadores inflamatórios.
MÉTODOS: No presente estudo foram utilizados camundongos machos C57BL/6J, com 4 semanas de idade, que foram distribuídos em 3 grupos experimentais: CTL, alimentados com dieta controle com 10% de calorias provenientes de lipídeos, e tratados ICV com veículo (salina 0,9%); HFD, alimentados com dieta hiperlipídica com 45% de calorias provenientes de lipídeos, e tratados ICV com veículo; HFD-Iri, alimentados com dieta hiperlipídica, e tratados ICV com irisina (300 ng/dia). Após 13 semanas nas respectivas dietas, foi realizada a cirurgia de canulação do ventrículo lateral direito, com base nas coordenadas estabelecidas no Atlas de Coordenadas Estereotáxicas: anteroposterior (AP) -0,34 mm; médio-lateral (ML) -1,0 mm; dorso-ventral (DV) -2,2 mm, em relação ao bregma. Decorridos 4 dias de recuperação, os animais foram submetidos ao tratamento ICV por 7 dias consecutivos, com administração de 2 uL de veículo ou irisina, utilizando uma agulha gengival 22G acoplada a uma seringa Hamilton. Com o fim do tratamento, foi realizada a eutanásia dos animais e o fígado foi coletado e armazenado a -80º C. Tamanho da amostra: CTL (n = 9), HFD (n = 8) e HFD-Iri (n = 10) animais. Os dados foram analisados por One-way ANOVA (p<0,05), seguido pelo pós-teste de Tukey. Os procedimentos experimentais foram aprovados pela Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Universidade Estadual de Campinas (Protocolo CEUA/UNICAMP nº 5995-1/2022).
RESULTADOS: Como esperado, o grupo HFD exibiu o fenótipo de obesidade, apresentando um maior peso corporal (40,8 ± 2,2 g), maior índice de Lee (33,05 ± 0,57 g/mm) e maior perda de peso corporal durante o período de tratamento (5,97 ± 0,77 g), quando comparado com o grupo CTL (respectivamente, 27,78 ± 0,79 g; 31,4 ± 0,22 g/mm e 2,16 ± 0,56 g). Em relação à expressão gênica, observou-se no fígado aumento na expressão das enzimas glicogênio sintase 2 (GYS2), glicogenina (GYG), glucoquinase (GCK) e da citocina pró-inflamatória fator de necrose tumoral alfa (TNF-Alfa) (respectivamente, 1,61 ± 0,12; 1,26 ± 0,07; 2,47 ± 0,32 e 2,0 ± 0,23, fold change of CTL) e diminuição na expressão da enzima fosfoenolpiruvato carboxiquinase 1 (PCK1) (0,45 ± 0,08, fold change of CTL), em comparação ao grupo CTL. O tratamento ICV crônico com irisina não promoveu diferenças no peso corporal (39,56 ± 1,2 g), índice de Lee (32,28 ± 0,38 g/mm) e na perda de peso durante o período de tratamento (-5,9 ± 0,65 g/mm), quando comparado com o grupo HFD. Já em relação à expressão gênica no fígado, o grupo HFD-Iri não apresentou diferenças significativas na expressão das enzimas GYGS2, PCK1 e GCK (respectivamente, 1,5 ± 0,08; 0,49 ± 0,07 e 2,0 ± 0,12, fold change of CTL), quando comparado com o grupo HFD, mas observou-se diminuição da expressão de GYG e TNF-Alfa (1,01 ± 0,06 e 1,2 ± 0,13, fold change of CTL), comparado com HFD, observando-se valores semelhantes àqueles encontrados no grupo CTL.
CONCLUSÃO: O tratamento ICV crônico por 7 dias com irisina em camundongos obesos promoveu no fígado uma redução na expressão de genes relacionados à glicogênese e inflamação, sugerindo um potencial efeito anti-inflamatório e modulador do metabolismo glicêmico hepático, via mecanismo central de ação, o que poderia contribuir para a proteção do fígado contra as alterações metabólicas e inflamatórias observadas na obesidade, além de repercutir positivamente no controle da homeostase energética. Mais estudos são necessários para confirmar nossos resultados e para elucidar de forma precisa os mecanismos envolvidos por trás dessa modulação, confirmando assim o potencial terapêutico da irisina no contexto de alterações hepáticas induzidas pela obesidade.
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