Ecossistemas tropicais abertos são sistemas altamente inflamáveis, evoluíram mediante a presença de fogo e apresentam atributos para rápida recuperação após queimadas naturais ou antrópicas. Com origem nos raios das primeiras chuvas após períodos de seca, as queimadas naturais consomem a biomassa acima do solo e a vegetação nativa rebrota a partir de gemas protegidas tanto por estruturas aéreas (e.g., gemas protegidas por bainhas foliares na base de graminóides ou pela casca espessa em arbustos e árvores) quanto por estruturas subterrâneas, insuladas do calor das chamas pelo solo. Apesar da extensa literatura sobre os efeitos do fogo em savanas, estudos elucidando atributos que garantem resiliência ao fogo têm foco no estrato lenhoso ou, quando investigam campos, focam principalmente nas fisionomias secas. Além disso, estudos buscando compreender a diversidade funcional das estruturas abaixo do solo são escassos para campos no geral, e praticamente inexistentes para espécies de campos úmidos. Diante desse cenário, neste trabalho buscamos elucidar e contrastar os mecanismos que garantem a resiliência em diferentes fisionomias campestres do Cerrado a distúrbios naturais, focando no tipo de estrutura subterrânea que assegura a rebrota após eventos de queima. Sabendo que ambos os sistemas evoluíram mediante a queimadas frequentes, mas que apresentam distintos regimes de queima — sendo o fogo menos frequente e com menor intensidade em campos com maior conteúdo de água —, hipotetizamos que haverá diferenças na proporção de estruturas subterrâneas lignificadas encontradas em cada sistema, com maior ocorrência destas em campo seco, onde a disponibilidade de água no solo é menor ao longo do ano e o fogo é mais intenso. Para estes fins, utilizamos uma base de dados previamente coletados em experimentos de queima prescrita em campos sazonalmente úmidos (Alto Paraíso de Goiás, Goiás, Brasil) e campos secos (Águas de Santa Bárbara, São Paulo, Brasil) do Cerrado. Analisamos 142 espécies rebrotadoras para o campo seco, e 73 rebrotadoras para o campo sazonalmente úmido. Verificamos, na base de dados do speciesLink e Flora do Brasil, o quanto essas espécies são representantes das fisionomias estudadas, considerando o Cerrado como um todo, para permitir discussões mais amplas sobre estratégias funcionais. Nossos resultados mostraram que a riqueza de tipos de estruturas subterrâneas em campo seco é superior a observada em campos sazonalmente úmidos, embora rizomas, sóboles, raízes tuberosas e xilopódios sejam encontrados em ambos os sistemas. Ainda que espécies com rizomas e xilopódios tenham sido os tipos de estruturas subterrâneas mais abundantes nas duas fitofisionomias, os xilopódios são os mais representativos dos campos secos, enquanto os rizomas herbáceos foram mais representativos dos campos sazonalmente úmidos. Quanto às estruturas subterrâneas lignificadas, estas são mais abundantes em campo seco quando comparados aos campos sazonalmente úmidos. Os resultados corroboram com a nossa hipótese e podem ser explicados pela diferença de filtros ambientais atuantes sobre as fisionomias campestres. Mesmo que o regime de fogo exerça forte papel na formação das comunidades nos campos sazonais, o regime hídrico parece desempenhar papel igualmente importante enquanto filtro para as espécies rebrotadoras dessas fitofisionomias. Nosso estudo contribui com o conhecimento sobre a ecologia dos ecossistemas abertos tropicais, podendo auxiliar em (i) estratégias de restauração ao apontar grupos funcionais que podem ser utilizados na recuperação dessas fitofisionomias e, também, (ii) nos permitiu entender os componentes que garantem a resiliência desses ecossistemas após distúrbios naturais e antrópicos.
Comissão Organizadora
Estudantes de biologia da Universidade Estadual de Campinas.
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