Introdução
A prevalência de distúrbios psiquiátricos manifestados pelos estudantes de medicina é consideravelmente importante, notadamente sob a perspectiva da saúde coletiva. Processo de adoecimento esse que inicia-se pelo atual modelo de ensino biomédico, afasta-se de aspectos psicológicos, enfatizando a formação técnica, negligenciando elementos essenciais para o equilíbrio entre as dimensões biológicas, psicológicas e sociais do processo saúde-doença (Conceição et al., 2019).
Como fator agravante para a situação, o vírus SARS-CoV-2 ocasionou inúmeros efeitos deletérios para a formação médica em todos os ciclos. Diversos prejuízos continuam sendo agregados, e impactam não somente o contexto acadêmico e, consequentemente, o desempenho profissional, mas também afetam a todos por meio da toxicidade cultural (NEVES, 2022), um objetivo também fundamental deste estudo.
Objetivos da pesquisa
Analisar as taxas de suicídio existentes entre os discentes do curso de medicina no Brasil, investigando em conjunto o impacto da toxidade cultural no desenvolvimento de transtornos mentais nesse meio.
Metodologia
Trata-se de uma revisão bibliográfica não sistemática, exploratória-descritiva, qualitativa, que tem como objetivo analisar a relação entre as taxas de suicídio entre estudantes de medicina no Brasil e os possíveis fatores histórico-culturais associados. A pesquisa, baseada em literatura científica e documentos oficiais, foi organizada em diferentes eixos, com foco na educação médica (EM), visando compreender a complexidade e os impactos da toxidade cultural na formação desses estudantes.
Resultados da pesquisa
Os achados da maioria dos estudos realizados no Brasil revelam um cenário semelhante em todas as escolas médicas. A entrada do estudante no ambiente universitário envolve vários processos que os expõem a situações exaustivas, especialmente durante a formação médica, que é um dos cursos mais disputados no país.
Segundo Neves (2022), a graduação em medicina pode provocar uma toxicidade cultural que gera estresse nos estudantes e resulta em diversos transtornos mentais, incluindo ansiedade, raiva, depressão, sentimentos de inadequação e esgotamento físico e mental.
Ward e Outram (2016) evidenciaram também que médicos e estudantes de medicina apresentam taxas mais elevadas de sofrimento psicológico, exaustão, diagnóstico de transtornos mentais, ideação suicida e tentativas de suicídio em comparação com outros profissionais de saúde e a população em geral. Identificaram que 9% dos estudantes de medicina no Brasil já tentaram tirar a própria vida, sendo que 7% são mulheres e 2% são homens, revelando uma qualidade de vida adversa que as estudantes de medicina experimentam ao longo da graduação e se estende até a residência médica (MARCON et al., 2019).
Inclusive durante o período pandêmico, a fadiga — presente em 48% nos alunos que utilizavam plataformas de videoconferências —, a exposição às informações sobre COVID-19 e a distância física da família foram associadas a sintomas de ansiedade (PERISSOTTO, T. et al., 2021; SOBRAL et al., 2022;).
Em uma análise abrangente, verificou-se que 76% dos alunos universitários experimentaram consequências negativas na saúde mental em três aspectos importantes: (1) elevação do nível de estresse e ansiedade, totalizando 87%; (2) busca por algum tipo de suporte para problemas relacionados à saúde mental, atingindo 21%; (3) manifestação de ideação suicida, correspondendo a 17% (CHEGG, 2021).
Relação do objeto de estudo com a pesquisa em Educação e Grupo de Trabalho do COPED
A análise das taxas de suicídio entre os discentes do curso de medicina no Brasil não pode ser ignorada, inclusive sobretudo englobam problemáticas como classe social, raça e gênero (BERALDI et al., 2015; LUNA; TEIXEIRA; LIMA, 2021; PANTOJA, 2021; SOUZA et al., 2020). A toxidade cultural na EM não afeta todos os estudantes de maneira igual, sendo que aqueles pertencentes a grupos sociais historicamente marginalizado, o que demonstra um sofrimento maior com o estresse e as demandas acadêmicas (ÁVILA, 2014; FREDRICH et al., 2022).
A falta de diversidade na formação médica também é um problema estrutural que afeta diretamente o acesso a cuidados de saúde de qualidade (GOMES, 2016). A formação de profissionais de saúde que reflitam a sociedade brasileira é fundamental para que se possa atender de maneira mais efetiva as demandas e especificidades de diferentes grupos sociais.
Considerações finais
A constatação das desigualdades presentes na formação médica no Brasil, principalmente em relação à diversidade racial, classe social e de gênero, aponta para a necessidade de políticas e programas que possam reduzir essas disparidades. Nesse sentido, as universidades e o governo têm um papel fundamental na criação de ambientes inclusivos e diversificados, incluindo ações afirmativas que possibilitem a inclusão de estudantes de baixa renda e de minorias étnico-raciais, bem como a promoção de debates e discussões sobre a diversidade cultural e a valorização da pluralidade.
Ademais, a criação de redes de apoio efetivas e abrangentes, que respeitem os direitos humanos e promovam a colaboração democraticamente, é imprescindível para garantia de uma formação médica mais equitativa e inclusiva. Somente assim será possível formar profissionais capazes de lidar com as demandas de uma sociedade cada vez mais diversa e plural, oferecendo atendimento adequado e de qualidade a todos, sem discriminação ou preconceito.
Comissão Organizadora
CLÁUDIA APARECIDA FERREIRA MACHADO
Francely Aparecida dos Santos
Pedro Aurélio Cardoso da Silva
Raiana Alves Maciel Leal do Carmo
Victória Lobo
Comissão Científica