Há uma década, vem sendo realizada pela pesquisadora uma ação de recuperação ambiental na nascente da microbacia Jequitinhonha, em Milho Verde-MG, e neste local será construída uma escola de arte: um espaço dedicado à arte e à natureza, propício a ser um ateliê aberto para criação e produção artística; a ser um espaço de pesquisa e reflexão sobre o fazer artístico; e a se curar e realizar exposições e residências artísticas. Para tanto, foi projetada esta pesquisa com o objetivo de criar guias pedagógicas que direcionarão este espaço de arte, guias que venham do poder erótico (LORDE, 2019) e tenham uma função ética estruturadora do pensamento por meio de palavras-alma, conceito trabalhado por Rolnik (2018), para melhor direcionamento de ações micropolíticas nesta escola de arte. Busca-se responder à seguinte questão: o que significa, de fato, uma ação educativa contracolonial, no campo das artes visuais? E a resposta exige um processo de autodecolonização (ESBELL, 2020; KILOMBA, 2019). Por Milho Verde estar em uma região quilombola, é necessária a atenção às relações raciais, motivo pelo qual a pesquisa está vinculada ao pensamento contracolonial (SANTOS, 2015, 2018, 2020) e inserida no Grupo de Pesquisa para Educação Decolonial PluriEtnoPopular da Universidade Estadual de Montes Claros (GDECO-ETNOPO/Unimontes). Tendo a branquitude como objeto de estudo, esta investigação é de cunho teórico e tem a proposta metodológica de campo-tema (SHUCMAN, 2020), que permitirá o desenvolvimento de uma autoetnografia (PATZDORF, 2022; RAIMONDI et.al, 2020). O referencial teórico decolonial, com recorte nas questões raciais, propiciará identificar e desvelar mecanismos que impõem relações raciais de poder, a partir do conhecimento do fenômeno histórico-social da construção e constituição da branquitude. Posto que a autoetnografia apresenta uma abordagem das experiências próprias a quem realiza a pesquisa, traçou-se uma trajetória de investigação que vai agenciar movimentos imanentes de ações artísticas da pesquisadora, concomitantes a movimentos de busca pela memória do espaço onde se dará a construção da escola de arte, a partir de diálogos e conversas informais, tidas como instrumentos nesta metodologia. O ensaio será a forma de escrita privilegiada, uma vez que este também se apresenta como um modo decolonial de produção científica (NASCIMENTO, 2021), e a dissertação resultante virá a ser uma narrativa do processo de autodecolonização. Apresentará a reflexão sobre a reavaliação e recriação de um papel de atuação sociocultural na comunidade constantes na investigação, que será, ao fim, um movimento não só de interpretação da realidade, mas de sua transformação.
Referências
ESBELL, Jaider. Autodecolonização: uma pesquisa pessoal no além coletivo. Uma pesquisa pessoal no além coletivo. 2020. Disponível em: http://www.jaideresbell.com.br/site/2020/08/09/auto-decolonizacao-uma-pesquisa-pessoal-no-alem-coletivo/.
KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Editora Cobogó, 2019.
LORDE, Audre. Usos do erótico: o erótico como um poder. In: LORDE, Audre. Irmã outsider: ensaios e conferências. Belo Horizonte: Autêntica, 2019. p. 67-74.
NASCIMENTO, Rafael Baioni do. O ensaio como forma e a narrativa como método: encontros com a teoria crítica e o feminismo negro. Educação, Escola & Sociedade, Montes Claros, v. 14, n. 16, p. 1-26, ago. 2021. Universidade Estadual de Montes Claros (UNIIMONTES).
PATZDORF, Danilo. Artista-educa-dor: a somatopolítica neoliberal e a crise da sensibilidade do corpo ocidental(izado). 2022. 174 p. Tese (Doutorado em Artes Visuais) – Escola de Comunicação e Artes. Universidade de São Paulo. São Paulo.
RAIMONDI, Gustavo; MOREIRA, Claudio; BRILHANTE, Aline; BARROS, Nelson. A autoetnografia performática e a pesquisa qualitativa na Saúde Coletiva: (des)encontros método+lógicos. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 36, n. 12, p. 1-13, dez. 2020. Fundação Oswaldo Cruz.
ROLNIK, Suely. Esferas da insurreição: notas para uma vida não cafetinada. São Paulo: N-1 Edições, 2018.
SANTOS, Antonio Bispo dos. Colonização, quilombos: modos e significados. Brasília, INCTI/UnB, 2015.
SANTOS, Antonio Bispo dos; MAYER, Joviano. Início, meio, início: Conversa com Antônio Bispo dos Santos. Indisciplinar, 6(1), p. 52-69, out. 2020. Escola de Arquitetura e Urbanismo. Universidade Federal de Minas Gerais.
SANTOS, Antonio Bispo. Somos da terra. Piseagrama, Belo Horizonte, número 12, p. 44-51, ago. 2018.
SCHUCMAN, Lia Vainer. Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: branquitude, hierarquia e poder na cidade de São Paulo. São Paulo: Veneta, 2020.
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