Análise do Encarceramento Feminino no Estado da Bahia em 2018
Este ensaio tem por objetivo avaliar o encarceramento feminino no Estado da Bahia. O tema é importante por versar sobre um aumento considerável do número de mulheres encarceradas cautelarmente; ademais, discute-se uma inovação: o Habeas Corpus de nº 143.641 (São Paulo), cuja relatoria foi do Ministro Ricardo Lewandowski, no qual concedeu a ordem para que as mulheres grávidas, puérperas ou com filhos até 12 anos pudessem ter prisão domiciliar. Em suma, faz-se uma análise da Lei n° 12.403/2011, bem como dos dados do INFOPEN/SEAP do Estado da Bahia.
Palavras-chave: Encarceramento feminino. Prisões cautelares. Habeas Corpus, Mulher.
Amanda Barreto Meirelles do Nascimento; Luciano Bandeira Pontes; Nungi Santos e Santos.
Graduada em Direito pela Universidade Católica do Salvador (UCSal/BA); pós-graduada em Direito e Magistratura (EMAB/UFBA); pós-graduada em Prevenção da Violência, Promoção da Segurança e Cidadania (UFBA); Mestranda em Direito, Governança e Políticas Pública.
“Mulheres de presidiários”: conjugalidade e trabalho feminino nos mercados ilegais
A bibliografia sobre organização social das atividades criminais e suas formas de sociabilidade trata principalmente do papel desempenhado pelos homens no “mundo crime” e pouco aborda a presença das mulheres nesses espaços. No entanto, durante a realização de uma pesquisa etnográfica no bairro da África na cidade de Igarapé-Miri, no estado do Pará, notou-se que a participação feminina é central na organização do tráfico de drogas e nos fluxos entre o dentro e o fora das prisões. As “mulheres de presidiários”, como se intitulam, vendem as drogas, fazem as cobranças e vigiam o negócio dos olhares da polícia; ademais, quando seus parceiros se encontram presos, os auxiliam na entrada de objetos nas prisões (drogas, celulares, chips, etc). O presente trabalho, portanto, investiga como a conjugalidade articula a presença feminina nesses mercados ilegais, e quais sentidos adquire nessas situações. Através das técnicas de observação participante e entrevistas semi-estruturadas focadas na trajetória de vida, buscou-se compreender quais os sentidos que as relações de conjugalidade assumem entre as “mulheres de presidiários” e seus companheiros. Os resultados parciais da presente pesquisa apontam para relações conjugais pautadas pelo “compromisso” - termo utilizado pelos homens para afirmar o caráter contratual do vínculo entre os parceiros, onde as demonstrações de afeto desempenham uma função secundária. O “compromisso” firmado tem como consequência a obrigação do trabalho não remunerado das mulheres nos mercados ilegais, e, em caso de descumprimento desta função, a exposição a toda a sorte de violências, que vão desde castigos corporais e humilhações até a própria morte.
Palavras-chave: Conjugalidade; divisão sexual do trabalho; prisão; mercados ilegais.
Amanda Laysi Pimentel dos Santos, Gustavo Ferreira de Queiroz
Graduada em Direito pelo Instituto de Ciências Jurídicas (ICJ) da Universidade Federal do Pará (UFPA) e Mestranda em “Direito Constitucional e Teoria do Estado” pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
Diálogos antes da Tranca: as experiências de um projeto universitário de remição de pena por leitura na prisão
O objetivo deste trabalho é mapear e compreender o processo de consolidação e as interações ocasionadas pela entrada do Grupo “Cárcere, Expressão e Liberdade” (CEL) no cotidiano da Penitenciária Masculina de Franca – unidade em que desenvolvemos o Projeto “Me Livro” – de remição de pena pela leitura, direito subjetivo da pessoa presa acessado através da literatura. Sistematizaremos as dinâmicas relacionais entre universidade e prisão por meio das obras, a partir dos limites e disputas enfrentados no ambiente prisional. Realizaremos, inicialmente, uma pesquisa empírica documental em direito, com um caráter exploratório, através da interpretação dos relatórios de visita do CEL na unidade, elaborados pelos seus integrantes universitários. Em um segundo momento, realizaremos entrevistas semidirigidas com os atores do sistema de justiça criminal envolvidos nesta dinâmica, para verificação da sua percepção acerca deste direito. Entre os abordados, citamos: integrantes da administração da unidade prisional, juízes, promotores e defensores que oficiam na cidade, além de estudantes participantes do CEL. O propomos como método de análise dos resultados obtidos com o campo a Teoria Fundamentada nos Dados. Contamos com referenciais teóricos preliminares para produção e análise de dados do campo, sem que estes sejam lidos como pautas às observações as quais praticaremos. São as Criminologias Crítica e Clínica Social, em especial de Alessandro Baratta e de Alvino Augusto de Sá; das funções transformadora e de garantia de direitos humanos da Universidade Pública e da Extensão Universitária, em apontamentos de Boaventura de Souza Santos; e da educação popular pela cidadania e pela autonomia de um indivíduo politicamente situado na sociedade, a partir de Paulo Freire e Bell Hooks.
Palavras-chave: Criminologia, Prisão, Remição de Pena, Universidade Pública, Extensão Universitária
Eduardo Matheus Ferreira Lopes.
Mestrando e Graduado (2017) em Direito pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista. Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
A vila e a prisão: Novas perspectivas do conceito de prisionização
Este artigo pretende discutir os processos de apreensão e atualização dos estudos sobre os efeitos do sistema prisional em determinados grupos da sociedade, a prisionização. Como campo escolhido temos a chamada “vila”, um grupo de casas destinadas aos gestores do complexo penitenciário Campinas-Hortolândia, no interior do Estado de São Paulo. Através da análise das micro-relações entre os moradores e ex-moradores desta localidade e da maneira pela qual a prisão e a prisionização contribuem para a organização do seu cotidiano, foi possível observar que as relações se mostram como um esforço constante das famílias em reforçar e ressignificar os elementos da instituição familiar e de comunidade, por meio de adaptações que reagem ao cotidiano prisional. Essas adaptações são incorporadas ao cotidiano e normalizadas, transformando-se de objetos de disrupção da ordem em elementos que fazem parte da constituição da própria comunidade. Através de entrevistas e da reconstrução da memória coletiva do grupo, foi possível perceber que a influência da prisão gera não apenas uma mudança no discurso sobre a insegurança no plano consciente, mas também um processo profundo de subjetivação da lógica prisional, reorganizando as estratégias para garantia da coesão e solidariedade do grupo.
Palavras-chave: Prisões, Sistema Prisional, Prisionização, Memória.
Eduardo Rossler.
Graduação em Ciências Sociais (UFSCar), Mestre em Sociologia (PPGS-UFSCar), Membro do GEVAC.
Entre ser menor infrator e Cidadão de Direito: Processos de aplicação de medidas socioeducativas e a construção da cidadania.
O presente artigo busca refletir sobre a aplicação das medidas socioeducativas no Brasil e a construção da cidadania no sistema jurídico brasileiro por meio de uma análise antropológica sobre a legislação da política de atendimento a criança e ao adolescente e os dados sobre a aplicação efetiva destas no Rio de Janeiro. Para a compreensão desse processo, realizou-se um estudo acerca da história das primeiras legislações que fundamentaram o atendimento a esse segmento no país, desde o primeiro Código Criminal até os dias atuais com a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990. Com a análise da proposta de tornar crianças e adolescentes em cidadãos com proteção integral buscamos compreender como a responsabilidade penal juvenil cria contradições ao exercício efetivo dessa política a favor das crianças e adolescentes evidenciando em suas práticas a forma como a igualdade jurídica é construída no Brasil. A metodologia de pesquisa utilizada foi o estudo do direito penal juvenil e da aplicação das medidas socioeducativas aos adolescentes por meio dos documentos institucionais do acompanhamento do cumprimento das medidas socioeducativas no Rio de Janeiro e pelo relatório apresentado pela Defensoria pública sobre casos de audiências de apresentação de adolescentes. Ao estabelecer cidadania a crianças e adolescentes sob a condição de arcarem juridicamente com a responsabilidade penal dos seus atos estabelecemos de forma legítima o encarceramento de crianças e adolescentes. Como um dispositivo legal, o Estatuto da Criança e do Adolescente implementou diversas mudanças, mas não tem sua aplicação integral na realidade, assim as medidas socioeducativas continuam sendo uma forma de tutela do Estado e supressão do direito à cidadania.
Palavras-chave: Cidadania- medidas socioeducativas- direitos sociais- conflitos
Francielly Silva Costa Alves Rocha
Bacharel em Ciências Sociais pela UERJ, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia na UFF e membro do grupo de Pesquisa de Conflitos, Moralidades,e Justiça do INCT-InEAC.
Estado, Direito e Classe Social: Uma etnografia das práticas jurídicas em audiências criminais
A intencionalidade da presente não se relaciona ao desenvolvimento de argumentos atrelados à origem ou às discussões no interior das classes sociais, como tem feito inúmeros cientistas socias e sociólogos especialistas no assunto. O texto tem o escopo de relacionar uma análise de classe no estudo do espaço judiciário, mais especificamente, em um segmento deste espaço, as audiências criminais, como sugere Heitor Geraldo (2013), ou seja, verificar como se manifesta nas práticas jurídicas determinadas práticas cuja explicação remonta à análise de classe. O marco teórico da pesquisa fora, dentre outros, Pierre Bourdieu, Garapon, Adorno, Dias, Frederico de Almeida, Sinhoreto, Heitor Geraldo, Jessé Souza, Ghringhelli. Relacionando três categorias de análise -Estado, Direito e Classe Social -, a pesquisa teve como problema de pesquisa: em que medida nas audiências judiciais criminais é possível identificar práticas (e/ou comportamentos) cuja explicação crítica remonta à classe social? Partiu-se da hipótese que o tratamento no interior das audiências criminais é fundamentado por uma questão de classe, na medida em que há taxação entre superior e inferior, de extrema classificação, cuja explicação se legitima pela desigualdade social atrelada ao crime, ao sujeito acusado e aos atores envolvidos no cenário jurídico. Por meio de uma análise etnográfica das práticas e comportamentos em quatro audiências criminais no Fórum Criminal de Belém, capital do Pará, chegou-se à conclusão de que passando pela posição cênica destinada ao Acusado e ao Ministério Público (MP), pelo comportamento do magistrado e do representante do MP e a própria presença física do acusado, há elementos configuradores de uma tarifação social, debatido ao longo do artigo.
Palavras-chave: Estado; Direito; Etnografia; Subclasse
Francisco Geraldo Matos Santos, Jean François Yves Deluchey
Doutorando em Direito (PPGD/UFPA). Mestre em Ciência Política (PPGCP/UFPA). Especialista em Direito Processual Penal e Direito Público pela Faculdade Damásio. Pesquisador no Grupo de Pesquisa CESIP (CNPQ/PPGD).
Atendimento socioeducativo em meio aberto na cidade de São Paulo: o caso das adolescentes em Liberdade Assistida
A presente pesquisa de mestrado se dedica a compreender como gênero estrutura as relações em cinco Serviços de Medida Socioeducativa em Meio Aberto (SMSE/MA) no município de São Paulo. O estudo tem como foco central analisar o potencial da medida socioeducativa de liberdade assistida em romper ou contribuir para a manutenção dos papéis de gênero em que as adolescentes nesse regime de atendimento estão imbricadas. Nesse sentido, busca analisar se a atuação dos técnicos responsáveis pelo acompanhamento delas colabora para conformar as meninas a esses papéis. Em relação à metodologia do estudo, a observação não-participante foi a estratégia metodológica adotada para acompanhar a rotina de atividades (como oficinas, grupos mensais de familiares e de adolescentes, confraternizações, etc.) dos SMSE selecionados. Além disso, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os técnicos de medida socioeducativa e entrevistas exploratórias com funcionários da Fundação CASA que atenderam meninas em medidas socioeducativas e/ou atuaram na liberdade assistida quando ainda era de responsabilidade dessa Fundação antes da municipalização dos serviços. Por fim, em relação aos resultados é preciso ressaltar como a pesquisa ainda está em andamento é possível apontar os resultados que são esperados. Os resultados do estudo corresponderão a um estudo da bibliografia essencial para o tema que permitirá reconstruir historicamente a atuação do Sistema de Justiça Juvenil quanto ao atendimento dispensado as adolescentes em instituições de controle social a partir das produções acadêmicas das Ciências Sociais e de documentos oficiais disponíveis. Os dados empíricos do trabalho de campo (inclusive as entrevistas) permitirão tratar adequadamente das questões centrais da pesquisa.
Palavras-chave: Gênero; Liberdade assistida; adolescentes autoras de ato infracional; práticas socioeducativas.
Laís Silva Vieira.
Mestranda em Ciências Sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Possui bacharelado e licenciatura em Ciências Sociais pela UNIFESP (2016).
Do cárcere à rua: o papel da prisão para a consolidação dos coletivos criminais de Porto Alegre
Durante os anos 80, um grupo de presos, alocados no Presídio Central de Porto Alegre, entabulou um pacto visando à união em nome de dois objetivos principais: a elaboração de planos conjuntos para a fuga e a contribuição financeira, feita por aqueles já libertos, aos companheiros que seguiam encarcerados. Como resultado, surgiu a Falange Gaúcha. Embora tenha inaugurado algumas das características que viriam a conformar o que se entende por facções, o grupo foi atravessado por incessantes conflitos desde a sua criação - o que impediu que assumisse forma sólida e durável. Em decorrência de uma disputa entre duas de suas alas, a Falange foi extinta na primeira metade da década de 90, e os presos vencedores transmutaram-se em um novo grupo, chamado os Manos - que, pouco depois, passou a antagonizar com outro, os Brasa. Até meados dos anos 2000, suas lideranças se encontravam mais próximas dos assaltos a bancos, cargas e carros-fortes, bem como possuíam interesses essencialmente internos - privilegiando o controle das galerias prisionais e almejando o monopólio do poder na prisão. Todavia, devido a transformações nos mecanismos de controle social e nas dinâmicas do crime, os agrupamentos passaram a se estruturar em torno do tráfico de drogas, o que contribuiu para que suas atividades se articulassem entre o espaço prisional e o urbano, tornando-os indissociáveis quanto à obtenção de interesses. Hoje, no Central, sete grupos diferentes dividem entre si o domínio de doze galerias prisionais. Lançando mão de entrevistas feitas com presos, policiais em ofício no presídio e operadores do sistema judiciário, esse trabalho propõe analisar o papel desempenhado pela prisão, entre a década de 80 e o momento aual, na constituição e consolidação dos grupos criminais em Porto Alegre.
Palavras-chave: Coletivos criminais. Prisão. Violência.
Marcelli Cipriani Rodrigues, Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo
Marcelli Cipriani - Mestre em Ciências Sociais pela PUCRS, pesquisadora do GPESC / Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo - Sociólogo, professor e pesquisador da Escola de Direito da PUCRS, bolsista PQ CNPq nível 1, membro do comitê gestor do INCT-InEAC.
MARIAS DO CÁRCERE: análise das políticas criminais voltadas as mães e gestantes do sistema penitenciário
Este trabalho acadêmico visa investigar as politicas criminais preventivas e repressivas voltadas a mulher no cárcere e analisar sua aplicação no ciclo político criminal. Nesse intuito, o recorte abrange as mulheres mães e gestantes, principalmente as que se encontram em prisões processuais mesmo após o HC Coletivo 143.641/SP impetrado pela Defensoria Pública da União e pelo Coletivo de Advogados Dos Direitos Humanos, deferido pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal que ordenou que mulheres gestantes e mães com filhos de até 12 anos incompletos pudessem cumprir prisão domiciliar conforme previsto no CPP em seu artigo 318, incisos IV e V. Inserida no contexto da qualidade de eficiência da aplicação das políticas penitenciárias para as mulheres encarceradas, a estrutura da penitenciária merece ser investigada como um fator influente nos resultados obtidos. Dados colhidos pelo INFOPEN Mulheres mostram que das 103 unidades exclusivamente femininas apenas 49 contam com Centro de Saúde ou Berçario; até 2016 das 886 gestantes que haviam somente 269 tinham lugar adequado para elas e seus bebês. O trabalho comtempla, também, análise de regras internacionais, como Bangkok e Tóquio, e legislações nacionais vigentes: Lei 13.434/2017 que somente então proibiu mulheres de darem a luz algemadas, Convenção de Belém que é instrumento específico de proteção a mulher no cárcere, dentre outros.Com a finalidade de achar justificativas para que essas diretrizes não sejam cumpridas e desrespeitadas. Ademais, analisar se o machismo intitucionalizado, o preconceito e o sexismo somam nessa problemática, afinal essas mulheres delinquentes deixaram de fazer seu papel na sociedade. O objetivo do trabalho é retirar esse véu de invisibilidade que a sociedade e o sistema pôs nas Marias.
Palavras-chave: Encarceramento, Mulheres, Mães, Gestantes, Políticas Prisionais.
Márcia Andreia Soares da Silva
Graduada em Direito. Advogada. Pós-Graduada em Direito UNIDERP/SP. Pesquisadora PPGDP/UFG. Agente Pastoral Carcerária DF. Integrante Comissão de Direitos Humanos/OABDF. Integrante IBCCRIM.
Em torno do discurso da “criminalização da pobreza”: práticas, ativismos e crítica sociológica
O proposito deste trabalho é colocar em discussão os usos, em contextos tanto políticos quanto institucionais, da expressão “criminalização da pobreza”, bem como suas consequências, sejam políticas, jurídicas, penais, ou no campo da produção do conhecimento. Tal categoria aparece em grande medida em variados campos de ativismo político, e na produção de políticas (entre as quais as de segurança pública), onde não raro figura em contraposição à palavra de ordem da “descriminalização da pobreza”, muitas vezem em tom de denúncia. É assim que a noção de “criminalização da pobreza” aparece nos estudos de doutorado desenvolvidos pelos proponentes do presente trabalho. Por isso, para além de seu usos e abusos no campo da política e mesmo em ambientes acadêmicos, nos interessa realizar um rastreamento da categorias, viando responder a alguma perguntas. Que práticas ou políticas podem aparecer associadas ou denunciadas pelo discurso ativista ou acadêmico em torno da “criminalização da pobreza”? Em que medida o acionamento militante do termo atrai significados e agenciamentos que comprometem seu potencial como categoria analítica? Quais são os efeitos morais da apropriação dessa categoria? Seria polissêmica demais, e por isso carente da necessária precisão de uma ferramenta analítica? Para isso, nos propomos a confrontar dados etnográficos por nós produzidos com a produção teórica contemporânea das ciências sociais.
Palavras-chave: Segurança Pública; Criminalização da Pobreza; Praticas Policiais; Crítica Sociológica
Marcos Verissimo, Astrid Johana Pardo Gonzalez.
Doutor em Antropologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF); professor assistente no Departamento de Segurança Pública da UFF; professor da rede pública de ensino do estado do Rio de Janeiro.
O Sistema Penitenciário do Estado do Ceará: um estudo a partir da Cadeia Pública de Redenção.
O presente trabalho objetiva-se em destacar a importância e atuação de políticas de ressocialização no sistema penitenciário, atuação dos agentes de segurança pública e participação da comunidade nesse processo. Apresentando fragmentos dos resultados de pesquisa sobre o sistema penitenciário do estado do Ceará, tendo como objeto de estudo a Cadeia Pública de Redenção, localizado no interior do estado do Ceará, sendo esse um dos 13 municípios que compõem o Maciço de Baturité. Para situar a realidade da cadeia pública, o presente trabalho inclui a organização do material de imprensa escrita sobre violência e segurança pública em Acarape e Redenção, dados da SEJUS e INFOPEN sobre os números de presos e suas penas, e as políticas públicas aplicadas ao sistema das cadeias. Esta apresentação é um recorte específico, oriundo da participação como bolsista voluntária em dois projetos de pesquisa PIBIC/UNILAB, nos períodos de fevereiro a Agosto de 2017; e de Novembro de 2017 a Junho de 2018, realizando estudo mais amplo a respeito da situação do Maciço de Baturité no processo de crescimento da criminalidade violenta, da estrutura e operação das organizações de Segurança Pública e da atuação das prefeituras dos municípios de Acarape e Redenção.
Palavras-chave: Cadeias Públicas, Sistema Penitenciário, Ceará, Redenção
Maria Cleovania de Souza Silveira, Antonio Micael Pontes da Silva, Francisco Thiago Rocha Vasconcelos.
Possui Curso técnico Profissionalizante em Informática através do Protejo E-jovem, promovido pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia / Secretaria da Educação do Estado do Ceará e Centro de Pesquisa e Qualificação Tecnológica (2011).
Aos olhos da justiça: Juventude em conflito com a lei e família
O presente artigo tem por objetivo analisar quais as representações e os sentidos criados pelos operadores da justiça (juiz, promotor, defensor público) em relação aos adolescentes/jovens que cometeram atos infracionais, em uma Vara da Infância e da Juventude localizada no Rio de Janeiro. Atenta-se que o problema sociológico que norteou a pesquisa consistiu na análise da seleção desses “tipos suspeitos” e seu direcionamento ao sistema de justiça socioeducativo, que se traduz através de um caráter marcadamente punitivo, principalmente, sobre os jovens negros, pardos, periféricos e pobres. Entretanto, outra questão que se mostrou relevante como problema a ser investigado foi a classificação, ou rotulação das famílias que os constituem, a partir de uma construção valorativa e moralizante, capaz de definir a trajetória criminal desses jovens. Para tanto, a realização da pesquisa baseou-se na observação não participante das audiências realizadas com jovens na condição de infratores, pesquisa bibliográfica, além da realização de entrevistas semiestruturadas com os operadores da justiça. A biografia sociológica sobre crime, violência e infração também são analisadas, bem como, a questão do discurso punitivista e da moralidade presentes na fala dos operadores referente a categorização das famílias como “estruturada” e “desestruturada”. Observou-se como os jovens são retratados como objetos de direito, criminosos “natos”, sujeito do e para o crime, provindos de famílias consideradas descentralizadas. Assim, a ausência da figura de um pai (considerado como aquele que impõe a ordem) e a presença de uma mãe que não consegue controlar os “impulsos” infracionais de seu filho, são condições presentes no imaginário dos operadores da justiça.
Palavras-chave: Punição; Moralidade; Juventude; Família
Mariana Ingrid de Oliveira Pereira Paz, Nalayne Mendonça Pinto
Graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ. (2014). Mestra em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ. (2017) Doutoranda em Ciências Sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Mulheres encarceradas: cruzamentos de redes prisionais e familiares
Com o uso de técnicas de pesquisa quantitativa e qualitativa empregadas em um trabalho de campo no Complexo Penitenciário Feminino Estevão Pinto (Piep), em Belo Horizonte (MG), busquei responder à pergunta: se e como os fluxos estabelecidos entre as presas e seus familiares impactam nas dinâmicas prisionais. A literatura da sociologia das prisões têm apontado para a alta porosidade dos cárceres brasileiros, marcados por inúmeros fluxos com o ambiente externo, em especial com familiares. Esses são conformadores da rotina prisional na medida em que o Estado não é capaz de garantir os itens básicos de sobrevivência a todas as pessoas em privação de liberdade e, assim, os itens entregues por familiares são essenciais para a rotina interna. No caso das mulheres, porém, os familiares têm sido considerados nos estudos mais enquanto ausências do que enquanto presenças, já que ressalta-se seu "abandono", medido pelas filas vazias nos dias de visita. O que os dados colhidos em campo mostraram, porém, é que não há abandono em termos de cortes de vínculo, mas sim reestruturações familiares que, se não permitem visitas semanais, não deixam de garantir inúmeros fluxos, de fora para dentro e vice-versa, que são essenciais para compreender o cotidiano prisional das mulheres e o impacto do seu encarceramento nas vidas das suas famílias. Foram identificados três tipos de redes diferentes (baseadas em arranjos externos, baseadas em arranjos internos e baseadas no entrelaçamento de teias internas e externas), construídas a partir do cruzamento de teias familiares e prisionais, que ajudam a compreender essas dinâmicas.
Palavras-chave: Encarceramento feminino, sobrevivência no cárcere, fluxos prisionais.
Natália Cristina Costa Martino
Mestre em sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pesquisadora do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp/ UFMG). É graduada em jornalismo pela mesma universidade (2007).
O processo de desinstitucionalização das mulheres egressas no Estado de São Paulo
O objetivo central desta pesquisa consistiu em compreender a trajetória de mulheres que já passaram pelo sistema prisional do estado de São Paulo, tendo como objeto que articula essa relação, os efeitos da prisão no processo de desinstitucionalização. Os objetivos específicos foram: entender os discursos produzidos acerca da mulher egressa; descrever as trajetórias das mulheres egressas a fim de analisar como se dá o processo de saída do cárcere; mapear a literatura de interesse à pesquisa, as políticas públicas e as organizações socias que buscam orientar as mulheres egressas para entender o que está sendo feito. O trabalho visou entender os novos processos que essas mulheres vivenciam no momento em que conseguem a liberdade, quais as estratégias que utilizam, condições dos familiares e quais são as oportunidades no retorno ao meio social. Nesse sentido, é possível fazer conexões entre as experiências dentro e fora das prisões. A principal técnica utilizada foi entrevista qualitativa semiestruturada com auxílio de tópicos guia, realizada com as mulheres egressas e conversas informais com alguns dirigentes de organizações na cidade de São Paulo e São Carlos. Os resultados encontrados foram as dificuldades encontradas pelas mulheres como a reestruturação familiar, falta de informações sobre os seus direitos e benefícios, longo tempo de prisão e pouca progressão de regime.
Palavras-chave: Mulheres egressas, encarceramento, desinstitucionalização.
Paula Paschoal Rodrigues Garcia.
Mestranda do PPGS (Programa de Pós-graduação em Sociologia) da Universidade Federal de São Carlos e pesquisadora vinculada ao GEVAC (Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos). Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de São Paulo.
Maternidade no submundo do cárcere: prisão domiciliar versus punitivismo
O crescente protagonismo da mulher na criminalidade, reflexo de uma sociedade extremamente desigual, repercute diretamente no sistema carcerário brasileiro. Nos últimos anos, vê-se a elevação dos índices de encarceramento. Outro aspecto relevante a ser discutido quanto à problemática, é o papel social vivido e imposto à mulher, ou seja, a ligação de sua imagem ao bom desenvolvimento da criança. Em relação à maternidade eclode o problema da precariedade das prisões brasileiras que em grande parte não apresenta condições mínimas para assegurar qualidade de vida a mulher e a criança. As prisões brasileiras foram desenvolvidas para o acolhimento do homem, sem observar as singularidades da mulher. Por meio da análise bibliográfica, busca-se apontar um panorama da relação entre a privação de liberdade, o exercício da maternidade, a proteção da criança e as políticas públicas. À luz do Habeas Corpus 143.641 São Paulo e legislações vigentes, desenvolvem-se novas perspectivas quanto à proteção integral a criança, visando seu bom desenvolvimento e bem-estar, e à defesa da dignidade da mulher e do infante. Indaga-se, se o punitivismo apregoado como melhor forma de manutenção da segurança social, e como visto, demonstra-se, atualmente, um mecanismo mais falho do que eficaz, deve ser repensado e construída novas formas que assegure tutela a todos.
Palavras-chave: Maternidade, Mulheres Encarceradas, Prisão
Rafaela Alice Faria
Graduada em licenciatura em matemática pela Faculdades Integradas Regionais de Avaré. Discente do Curso de Direito da Faculdade Eduvale de Avaré. Servidora Pública do Judiciário do Estado de São Paulo.
O Serviço Social no sistema penitenciário do Ceará frente à superlotação e crise de segurança pública
O artigo analisa a atuação do assistente social no sistema penitenciário do estado do Ceará, Brasil, mediante processo de reestruturação do complexo industrial prisional e reorganização do tráfico de drogas, armas e munições no estado. Verifica - se a ascendente presença de facções, como o Comando Vermelho, o Primeiro Comando da Capital e a Guardiões do Estado, e a nova administração dos presídios como forma de mitigar os grupos citados. Pretende -se identificar a atuação do assistente social frente esta nova dinâmica institucional e como a Lei de Execução Penal é aplicada em um contexto de grave crise, superlotação, denúncias de tortura e outras violações aos Direitos Humanos. Foi realizada investigação qualitativa através de entrevistas, análise de matérias da imprensa, relatório emitido recentemente pelo Mecanismo Nacional de Combate à Tortura em missão realizada no Ceará e referências teóricas da área de encarceramento em massa e racismo. A análise considera que a crise do sistema de justiça criminal abrange um escopo ainda maior de manutenção da ordem pública com disposição para encarceramento de determinamos sujeitos e aponta o serviço social como uma das profissões indispensáveis na dinâmica de funcionamento contraditória do sistema penitenciário.
Palavras-chave: Serviço social, Prisões, Encarceramento, Ceará, Lep.
Samara Edwiges Andrade Lima, Maria Helena de Paula Frota.
Graduanda em Serviço Social na Universidade Estadual do Ceará - UECE e integrante do Laboratório Conflitualidade e Violência - COVIO.
A ausência de políticas públicas no sistema penitenciário diante da inércia do executivo federal após a redemocratização
Uma política pública visando a reinserção do condenado e evitando sua reincidência, seria relevante fator de prevenção da criminalidade. Analisando a digressão histórica da legislação acerca da execução penal desde 1984, época final do regime militar onde foi publicada a Lei de Execução Penal que vigora até os dias atuais, observa-se que nenhum governo democrático teve efetivo interesse na solução dos problemas decorrentes do sistema penitenciário. Em nenhum deles foram implementadas mudanças significativas nos sistemas carcerários buscando a humanização das penas e a efetivação de políticas públicas, não obstante a existência neste período de 18 leis e 8 decretos versando sobre o conteúdo da lei de execução penal que culminaram na fatídica Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 347 junto ao STF buscando o reconhecimento do “estado de coisas inconstitucional” do sistema penitenciário. O objetivo da pena seria repreender e Ressocializar. Essa visão humanista no que se refere à proporcionalidade da pena e a busca pela reinserção social do preso, estaria presente em instrumentos de políticas públicas como manifestação real dos exercentes do poder político e como resposta as demandas sociais diante do crescimento da população carcerária. O Estado deveria ser atentar ao alto índice de pessoas encarceradas que deveria se sujeitar a medidas efetivas de reinserção social. Desta forma, a eficácia governamental se tornaria fonte de legitimidade para os programas criados. O trabalho busca analisar as inovações legislativas no que se refere à execução penal desde 1984, separando-se os períodos de acordo com os oito presidentes que governaram o país, analisando quantas normas guardam efetiva relação direta com a implementação de políticas públicas.
Palavras-chave: Políticas Públicas, Sistema Penitenciário, Inércia do Poder Executivo Federal, Redemocratização
Ulysses Monteiro Molitor, José Blanes Sala.
Doutorando em Ciências Humanas e Sociais pela Universidade Federal do ABC – UFABC, Especialista em Direito Processual, Mestre em Direitos Difusos e Coletivos, Advogado, Professor concursado da Universidade Municipal de São Caetano do Sul, SP – USCS.
Análise Comparativa dos Arranjos de Justiça Juvenil: diferentes possibilidades para a configuração de sistemas em linha de montagem
A pesquisa compara dois arranjos de vara da infância e da juventude em Minas Gerais, o CIA-BH, que é especializada na matéria e integra todos órgãos envolvidos com o processamento judicial em um mesmo prédio; e outra no interior do estado, a qual não apresenta integração física, nem completa especialização como na capital. A partir disso, analisou-se as implicações desses dois modelos para as práticas, as decisões dos atores, os desfechos dos processos e os fluxos, bem como para a observância às garantias processuais assinaladas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Este trabalho dialoga com as teorias das organizações, questionando se os arranjos institucionais se enquadram e em que medida são aderentes aos modelos teóricos de justiça frouxamente articulada, marcada pela fraca integração entre os órgãos que compõem o sistema de justiça criminal e justiça em linha de montagem, em que a meta da eficiência é o elo de integração do sistema. Dessa forma, foram conjugadas observações de audiências, entrevistas semiestruturadas, leitura dos autos processuais e análise quantitativa descritiva dos desfechos dos processos. Confirmou-se, a partir desse estudo, que o modelo de operação do CIA-BH proporciona o processamento dos casos de forma extremamente rápida e que, na vara do interior, apesar de não contar com tamanha celeridade, a eficiência no funcionamento da justiça é garantida por acordos e pelas conexões interpessoais entre os agentes. À vista disso, concluiu-se que ambas as varas funcionam como linhas de montagem, assentadas por vias informais. A diferença é que, na capital, as interações informais são induzidas por mecanismos institucionais, em função da estrutura do prédio, enquanto na vara do interior, elas apresentam um teor eminentemente personativo.
Palavras-chave: Justiça Juvenil; Justiça frouxamente articulada; Justiça em linha de montagem.
Vitor Sousa Gonçalves
Mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na linha da sociologia do crime, do desvio e do conflito, tendo desenvolvido pesquisa sobre o sistema de justiça juvenil em Minas Gerais.
Racionalidade criminalizante e combate à LGBTfobia
Partindo das reflexões de Simon (2007) sobre o “governo pelo crime”, busca-se investigar como uma racionalidade criminalizante constituiria as estratégias de controle e combate à violência formuladas por movimentos sociais contemporâneos. Sob a racionalidade criminalizante, a fim da racionalidade neoliberal, constituiu-se um modo de pensar os fenômenos sociais como crimes e a sociedade como composta por vítimas e por criminosos, o que teria impulsionado novas criminalizações atreladas ao acento no simbolismo do direito penal simbólico e no papel de incapacitação do encarceramento. A trajetória das estratégias empreendidas pelo movimento LGBT brasileiro constitui o objeto sobre o qual se procura refletir. A partir da análise de documentos de Conferências, Encontros e Seminários Nacionais, busca-se compreender que papel tem desempenhado nesse processo a bandeira da criminalização e do encarceramento de LGBTfóbicos, em diálogo com a bibliografia sobre a criminalização do racismo e do feminicídio. Como resultados preliminares, constata-se, por um lado, que a criminalização da LGBTfobia e a estratégia de encarceramento de LGBTfóbicos tendem a ser hegemônicas e a eclipsar outras pautas de combate à LGBTfobia no movimento, mesmo quando acompanhadas por estratégias educativas. Por outro lado, ambiguidades frente ao sistema penal, com frequentes denúncias de violências e criminalizações praticadas por agentes policiais, compõem os discursos pró-criminalização, apontando para ambivalências frente à racionalidade criminalizante em distintos períodos da trajetória do movimento.
Palavras-Chave: violência; crime; movimentos sociais; sexualidade
Alexandre Nogueira Martins
Bacharel em Ciências Sociais (USP). Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Sociologia USP, sob orientação de Prof. Laurindo Dias Minhoto, onde conduz pesquisa sob o título “Os caminhos da luta contra LGBTfobia no Brasil”.
A violência letal intencional como um fenômeno de bairro – o caso de Luziânia
Brasil está entre os 12 países com maiores taxas de homicídios para cada 100 mil habitantes, sendo o país com maior número absoluto. Aproximadamente 60 mil pessoas são assassinadas por ano em crimes violentos letais intencionais. A consequência do aumento dessas taxas representa uma crise civilizatória no Brasil e um problema a ser constantemente observado. Nas últimas décadas, nota-se um novo padrão de distribuição da violência letal no país, onde há uma redução na região Sudeste, estabilidade na região Sul, e um crescimento acentuado nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste, sobretudo em cidades de menor porte com aproximadamente 200 mil habitantes. Portanto este trabalho procura explorar os efeitos da violência letal em um deste municípios, o de Luziânia, sendo considerado um dos mais violentos da área Metropolitana de Brasília e do Estado de Goiás. Através de análises qualitativas, observação de campo e entrevistas em profundidade, e quantitativas – análises de dados secundários – foi possível identificar os bairros mais violentos e o impacto da violência letal no município e na vida de seus cidadãos. A pesquisa diagnosticou que no município a violência letal se desenvolve como um fenômeno de bairro onde há localidades que respondem majoritariamente pelas taxas de homicídios e apresentam diversos problemas estruturais como o surgimento de bolsões de pobreza, ausência de políticas públicas e de ordenamento social. Desta forma, a pesquisa em Luziânia é um exemplo da necessidade de investigações específicas destes territórios para a compreensão da violência letal no Brasil.
Palavras-Chave: Violência Letal; Homicídios; Luziânia; Bairro;
André Sales dos Santos Cedro
Doutorando em Sociologia, mestre em Sociologia e graduado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Carlos. Integra o Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos (GEVAC).
Homicídios múltiplos em São Paulo e Região Metropolitana e o caso da Chacina da Torcida Pavilhão 9.
O resumo trata de pesquisa de doutorado, em que analisamos os homicídios múltiplos – as chacinas- em São Paulo e Região Metropolitana, traçando a historicidade desses conflitos, possíveis modus operandi, vitimizações e agentes executores. De modo particular, para entender os diversos fatores que conformam uma chacina, nos debruçamos sobre a Chacina da Torcida Pavilhão 9, ocorrida em 2015, na quadra da torcida organizada, na Ponte da Vila dos Remédios, Zona Oeste paulistana, onde oito torcedores foram mortos, tendo como suspeitos um ex-policial militar e dois policiais militares. Dos suspeitos da execução, somente o ex-pm segue preso. Um dos policiais militares não foi identificado e outro foi solto por falta de provas. Para realização da pesquisa buscamos dados junto à Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e ao Banco de Dados da Imprensa sobre as Graves Violações de Direitos Humanos, do NEV/USP, além de outras fontes. Realizamos entrevistas com delegados e ouvidores das polícias, com jornalistas que cobrem e/ou cobriram chacinas – partindo do entendimento de que esses eventos escapam à uma normatização jurídica ou de conceito, sendo um termo com ampla circulação social e plasticidade, muito utilizado pela mídia. Entrevistamos também integrantes da torcida, familiares e amigos das vítimas da Chacina da Torcida Pavilhão 9, além de acompanharmos o processo judicial. Preliminarmente, as análises apontam que as chacinas em São Paulo estão atreladas a ações de agentes de segurança pública. Atentamos para o fato de que, a referida torcida organizada tem sua história associada ao Carandiru e essa relação interfere em uma criminalização dos torcedores e, por fim, familiares e amigos nos mostram como a chacina não acaba, mas permanece do cotidiano desses sujeitos.
Palavras-Chave: Homicídios múltiplos, chacinas, letalidade policial, Torcida Organizada Pavilhão
Camila de Lima Vedovello
Doutoranda em Sociologia – PPGS/IFCH/UNICAMP. Integrante dos grupos de estudos Problemática Urbana e Ambiental, liderado pela Profa Dra Arlete Moysés Rodrigues e Polcrim- Laboratório de Estudos de Política e Criminologia, liderado pelo Prof Dr Frederico N.
Problemas de gênero e de controle do crime
A Lei 11.340/06 representa a virada tardia e necessária no reconhecimento e tratamento legal das violências domésticas e familiares contra a mulher dentro de uma perspectiva guiada pelos direitos humanos e pelo combate às violências motivadas por gênero. Perto de seu décimo terceiro aniversário, a lei ainda sofre alterações, sendo a mais recente aquela causada pela Lei 11.327/2019, que autoriza a aplicação de medida protetiva de urgência pela autoridade judicial ou policial e determina o registro em banco de dados do Conselho Nacional de Justiça. O presente trabalho pretende investigar de uma perspectiva crítica as estratégias de prevenção e de controle dos crimes previstos na Lei Maria da Penha. Através de pesquisa publicada em 2017 pela Universidade Federal do ABC (UFABC), sabe-se que há mais delegacias e postos especializados de combate de violência contra a mulher espalhados pelo território nacional, do que centros de atendimento à mulher vítima de violência. Não obstante, de acordo com relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública publicado em 2019, a maioria das mulheres vítimas de violência no Brasil não recorrem a qualquer instituição (52%), enquanto 29,6% buscam órgãos não oficiais e apenas 22,2% buscam órgão oficiais. A busca por órgão oficial não exclui aquela por não oficial e vice-versa.Portanto, neste trabalho buscamos investigar e analisar características das estratégias de controle dos crimes associados à violência doméstica e familiar baseada em gênero, além de apontar possíveis razões pelas quais as estratégias de repressão são foco de investimentos, todavia aparecem como pouco acionadas pelas mulheres vítimas de violência, além de inexistirem indicativos de redução dessas violências desde as criminalizações.
Palavras-Chave: controle do crime; violência doméstica; gênero; políticas de repressão; ineficiência
Carolina Soares Nunes Pereira
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (2018), mestranda em Sociologia pela Universidade de São Paulo (2019 - atual).
A (in) consistência do controle externo da atividade policial pelo Ministério Público – um olhar sobre Recife.
É amplamente conhecido o Programa Pacto Pela Vida em Pernambuco e os resultados exitosos de redução de homicídios até 2014. Nos últimos anos, porém, o estado apresenta crescimento dessa forma de violência, conforme dados fornecidos por metodologias distintas como: da saúde - 5.419 homicídios em 2017 (ATLAS, 2019); ou da polícia - 4.022; em 2018 (G1, FBSP, 2019). Neste universo, chama atenção os casos de morte decorrente de intervenção policial - MDIP. A Secretaria de Defesa Social de PE, por meio de pedido de acesso à informação, indicou 330 casos de MDIP entre 2014 e 27/08/2018, sendo 47 deles, na cidade do Recife. Ante esse cenário, a pesquisa em andamento, investiga a atuação do Ministério Público quanto ao dever constitucional de controle externo das polícias, buscando compreender o significado dessa atividade para os membros do Parquet e os reflexos na resolutividade dos procedimentos policiais. Metodologicamente, a opção foi utilizar entrevistas semiestruturadas e a análise de conteúdo de documentos oficiais emitidos pelo órgão. O resultado parcial é a verificação de evidente desorganização e fragilidade da atividade, com ausência de um consenso minimamente consistente sobre o significado do controle externo e de que modo ele deve ser executado. Verificou-se que a atividade é basicamente reduzida a questões burocráticas, sem preocupações com violações de direitos pela polícia e sem nenhum acompanhamento especial nos casos de MDIP. Assim, as conclusões primárias apontam para inexistência de programa institucional de controle externo da polícia pelo Ministério Público, o que indica negligência com a letalidade policial e e a própria democracia.
Palavras-Chave: letalidade policial, controle externo das polícias, Ministério Público, democracia,
Érica Babini; Maria Adelia Mello; Milena Trajano dos Anjos; Regina Célia Lopes Lustosa Roriz
Doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Professora da Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Casa Comum.
Revisão bibliográfica e considerações sobre o controle do crime e a gestão da violência em São Paulo
A partir de meados da década de 1990 a emergência proeminente de um novo ator no campo da segurança pública, o Primeiro Comando da Capital (PCC), passou a demandar novas reflexões e análises sobre as estratégias estatais de controle do crime e sobre o problema dos conflitos violentos. Segundo a bibliografia especializada, a organização foi responsável por reconfigurar a dinâmica criminal através da centralização econômica e política de negócios ilegais e ilícitos; de modo que impactou diretamente não só na distribuição e comércio de drogas e armas, como também na resolução de conflitos interpessoais dentro e fora dos presídios paulistas. Por outro lado, o combate ao “crime organizado” estimulou o discurso de maior repressão (violenta) por parte das agências policiais, reiterando a legitimidade de ações letais. No mais, assassinatos de policiais praticados por integrantes do PCC, estão geralmente associados a chacinas subsequentes com indício de participação dos agentes, numa forma de “vingança” que caracteriza e aprofunda o problema da letalidade policial. Neste sentido, esta comunicação trata de retomar as produções bibliográficas no campo da sociologia da violência que se dedicam aos temas da centralização econômico-política do PCC no “mundo do crime” e da prática policial letal, a fim de analisar os mecanismos formais e informais de controle e uso da força, e as formas de dispersão da violência. Dada a permanência de altos índices de letalidade policial e a drástica redução no número de homicídios em São Paulo, trata-se de caracterizar a gestão da violência em São Paulo e refletir sobre as estratégias legais-informais de controle do crime praticadas pela polícia, e a organização ilegal-formal do PCC como instância alternativa de resolução de conflitos.
Palavras-Chave: Segurança Pública, Interações Violentas, Polícia, PCC, Biopolítica.
Gabriel de Sousa Romero
Mestrando no PPG em Ciências Sociais da UNIFESP. Pesquisador do Observatório de Segurança Pública (Marília).
Desenhos possíveis das políticas de metas em segurança pública e suas implicações: estudo de caso sobre o programa “São Paulo Contra o Crime”
O presente trabalho tem como objeto as políticas de meta em segurança pública. Este instrumento tcaracteriza-se pela escolha de indicadores, aos quais serão designadas metas que, se cumpridas, irão conferir benefícios aos gestores envolvidos. Os indicadores e os benefícios adotados diferem entre os programas, de modo a atingir premissas e objetivos singulares, trazendo uma infinidade de desenhos para estas políticas que já são adotadas há décadas em pastas como Saúde, Educação e Segurança Pública do país. Este modelo de política pública foi inserido pela gestão de Fernando Henrique Cardoso, na reforma gerencial da administração pública da década de 1990. Tem como marca o exercício do controle administrativo por meio de resultados em substituição ao rígido controle procedimental. Tal fato ganha especial relevância ao pensar na adoção desta modelagem de política para políticas de segurança pública. Podem políticas de segurança pública abrir mão do controle procedimental e adotar o controle por resultados? Ou, em outros termos, políticas de metas com bonificação por resultado devem ser adotadas para políticas de segurança pública? Este questionamento orientará o presente trabalho que busca entender o que são as políticas de metas, como foram introduzidas na administração pública brasileira e como estas políticas têm sido adotadas pelas Secretarias da Segurança Pública de diversos estados brasileiros. Para tal será feita, uma revisão bibliográfica que abordará a questão, desde uma perspectiva histórica. Em seguida, uma breve análise dos diferentes modelos que têm sido adotados pelas pastas de segurança pública dos estados brasileiros, para podermos analisar o desenho do programa paulista: São Paulo Contra o Crime, a partir dos resultados compilados entre 2014 e 2018.
Palavras-Chave: Políticas de metas, segurança pública, bonificação por resultado, modelos Estratégias de controle do crime
Gabriela Magalhães Tavares de Oliveira
Advogada, formada pela Universidade de São Paulo.
"Territórios pacificados": reorientação do controle do crime e biopolítica de gestão da vida/RJ
O estudo tem o propósito de analisar a relação existente entre a política de pacificação e a singularidade dos modos de gestão da vida instituídos a partir da instalação das Unidades de Polícia Pacificadora nas favelas do Rio de Janeiro. Por meio da geração de dados empíricos foi possível perceber que o processo de pacificação dos "territórios da pobreza" produziu tensionamentos revelantes na organização e racionalização dos métodos de poder, isto é, representou uma inflexão no modo de administrar os conflitos relacionados ao "problema favela". Por um lado, o policiamento permanente permitiu a redução dos conflitos armados por certo período de tempo, por outro, as UPPs instauraram práticas que se aproximaram de uma biopolítica de gestão da vida dos sujeitos favelados por meio de vigilância militarizada, proibições e regulamentações das manifestações culturais. O estudo buscou compreender as particularidades que envolveram a relação estabelecida entre moradores e policiais; os efeitos da vigilância sistemática sob as populações desses territórios; o policial da UPP; as reengenharias do tráfico de drogas e os discursos favoráveis e contrários ao projeto de pacificação. Para elaborar o estudo foram tomadas enquanto objeto de análise as seguintes áreas de UPP: Favela Santa Marta, Favela Pavão-Pavãozinho, Ladeira dos Tabajaras/Morro dos Cabritos e Complexo do Alemão. A metodologia utilizada para que os propósitos da pesquisa pudessem ser cumpridos consistiram na elaboração de um estudo baseado na análise qualitativa, obtendo dados por meio de observações diretas e entrevistas semiestruturadas.
Palavras-Chave: Pacificação; favelas cariocas; violência urbana; gestão da vida
Helton Luiz Gonçalves Damas
Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de São Carlos. Mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade pela Universidade Federal de São Carlos. Bacharel em turismo pela Universidade Estadual Paulista
O Estalar do Martelo: Uma análise das sentenças de crimes patrimoniais na cidade de São Carlos
O objetivo do presente trabalho foi estudar a distribuição das sentenças judiciais para crimes patrimoniais, em especial furto e roubo, cometidos por negros e brancos em uma cidade de São Carlos, do interior de São Paulo, que foram proferidas no ano de 2017. Para tal, foi feito a análise do perfil do réu, utilizando categorias como gênero, raça, classe social, escolaridade e idade, além de características do processo criminal, onde encontram-se o resultado da sentença e o exercício de garantias de defesa e outras particularidades jurídicas de cada caso. A hipótese levantada e comprovada é que os juízes condenam de maneira diferencial indivíduos negros e brancos dando à primeira categoria penas mais severas. A metodologia utilizada se baseia na análise dos autos processais. As conclusões são da confirmação do racismo institucional dentro do sistema judiciário, onde se afirmou o privilégio de indivíduos brancos sobre os negros e da falha do sistema judiciário no princípio de igualdade.Palavras-Chave: Sentenças; Crimes Patrimoniais; Decisões Judiciais; Seletividade Penal
Jade Santoro Cavalli
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Sociologia (UFSCar)
Vou Ter que Discordar da Senhora: percepções de gênero no contexto do Curso de Tecnologia em Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense
O objetivo deste trabalho é colocar sob descrição algumas interações sociais e acadêmicas ocorridas no Curso de Tecnologia em Segurança Pública da UFF para, em seguida, propormos linhas de interpretação dos contextos etnográficos descritos à luz da discussão sobre diferenças na percepção de gênero nas Ciências Sociais contemporâneas. A ideia será verificar como as práticas militarizadas e militares das alunas e dos alunos tendem a reproduzir as construções sociais do ser homem e ser mulher, dentro e fora das instituições de segurança pública. Ambos os autores desta proposta fazem parte do LABIAC (Laboratório de Iniciação Acadêmica) o qual promove palestras, mesas redondas, ciclos de debates e lançamentos de livros nos polos regionais, onde ocorrem os encontros presenciais do curso. Nossa observação será no contexto da criação de um grupo de pesquisa acadêmica para fomentar pesquisas científicas, bem como a socialização acadêmica entre estudantes e mediadores do Curso e focará nas diferenças entre as percepções de gênero dos participantes das atividades: estudantes e docentes. Os estudantes deste curso de graduação, o qual é ofertado através da plataforma do Consócio CEDERJ-CECIERJ e é na modalidade semipresencial, são, exclusivamente, profissionais que atuam na área da segurança pública sendo, desta forma, policiais militares, civis ou federais, guarda municipais, integrantes das Forças Armadas entre outros.
Palavras-Chave: Conflito, Segurança Pública, Gênero
Maria Carolina Loss Leite, Marcos Veríssimo
Mestranda do Programa de Sociologia do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - IESP- UERJ, (2018) e bolsista CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Controle e Punição: a monitoração eletrônica em Minas Gerais
A proposta deste trabalho é compreender o funcionamento da monitoração eletrônica nas suas três situações de aplicabilidade no estado de Minas Gerais: medida cautelar diversa da prisão, medida protetiva de urgência nos casos de violência doméstica e execução penal em meio aberto. A monitoração eletrônica foi implementada oficialmente no Brasil a partir de 2010 ampliando sua atuação a quase todas as unidades federativas ao final de 2017, quando atingiu um total de 51.515 pessoas monitoradas. A justificativa para implementação de tal mecanismo centrou-se na possibilidade de diminuição da população carcerária entre presos provisórios e condenados com menor custo sem perder o poder de controle de Estado. Diante deste contexto, o presente estudo foi estruturado em duas etapas: a primeira etapa de caráter exploratório buscou conhecer todo o funcionamento da monitoração eletrônica por meio de observação de audiências e consultas em legislações sobre o tema, inquéritos e processos judiciais. A segunda etapa teve o intuito de compreender a percepção dos operadores do sistema de justiça e monitorados acerca da execução da monitoração eletrônica por meio da realização de entrevistas e aplicação de questionários. Os dados da pesquisa com os monitorados revelaram percepção da monitoração eletrônica em suas vidas como uma punição, ao passo que na percepção dos operadores de justiça a monitoração eletrônica atua como fator reabilitativo nos casos da execução penal e violência doméstica. Nos casos de medida cautelar a monitoração eletrônica se configura, muito mais como garantidora do andamento processual do que controle do crime.
Palavras-Chave: monitoração eletrônica; punição, Controle
Rafaelle Lopes Souza.
Assistente Social (UFF). Especialista em Elaboração, Gestão e Avaliação de Projetos Sociais (UFMG). Mestre e Doutora em Sociologia (UFMG). Atualmente é pesquisadora do Centro de Estudos da Criminalidade e Segurança Pública CRISP/UFMG
Só na morte se reconhece a vida: os discursos do TJSP em processos criminais envolvendo travestis.
Estas reflexões são desdobramentos de uma pesquisa de mestrado já finalizada que buscou compreender em que situações conflituosas envolvendo travestis o sistema de justiça criminal interveio, de que forma essas intervenções ocorreram e como tudo isso foi representado na “ponta final” do processo penal. Para isso, analisei 100 acórdãos criminais do Tribunal de Justiça de São Paulo, coletados a partir da palavra-chave “travesti”. Por meio da análise de discurso – atento, portanto, ao poder da linguagem -, analisei como a travestilidade é evidenciada ou silenciada e de que formas estereótipos e expectativas sociais influenciam as decisões jurídicas e o funcionamento do sistema de justiça criminal paulista. Parte-se da constatação de que o Brasil é o país que mais mata pessoas LGBT (especialmente travestis) no planeta (TGE, 2016) e também um dos que mais encarcera (INFOPEN, 2018). Considera-se também a vulnerabilidade em que vive grande parte das travestis, a distribuição desigual de violência e a seletividade de classe, raça e gênero inerente ao poder punitivo em nossa sociedade. Conclui-se que o Tribunal de Justiça de São Paulo reproduz a imagem de travestis como pessoas necessariamente desviantes e criminosas, culminando em um processo de criminalização que deslegitima suas narrativas sobre os conflitos e legitima práticas bastante questionáveis do sistema de justiça. Sua humanidade somente é reconhecida depois da morte – para punir com prisão seus agressores. A ambivalência dos discursos sobre travestis e as profundas desigualdades que marcam o processo penal concretizam as expectativas sociais e servem como fundamentação jurídica para a criminalização das travestis, ao mesmo tempo em que legitimam o sistema de justiça criminal como suposta proteção às pessoas LGBT.
Palavras-Chave: sistema de justiça criminal; discursos jurídicos; política criminal; travestis;
Victor Siqueira Serra
Graduado e Mestre em Direito pela Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” (UNESP). Líder do NEPAL (Núcleo de Estudo e Pesquisa em Aprisionamentos e Liberdades). Pesquisador do DIVERGENTES.
Relações Étnico-Raciais na PMDF: percepções de oficiais negros/as sobre a abordagem policial
O presente trabalho apresenta alguns resultados encontrados no âmbito da pesquisa Policiamento e relações raciais: estudo comparado sobre formas contemporâneas de controle do crime, que visa entender como se dão as relações étnico-raciais dentro do planejamento do policiamento ostensivo em cinco estados brasileiros, entre eles, o Distrito Federal. O artigo proposto é constituído pela análise de 5 entrevistas realizadas com 3 policiais homens e 2 policiais mulheres autodeclarados/as negros/as que estão na carreira de oficiais da PMDF, com pelo menos 25 anos de profissão e idade entre 40 e 50 anos. O artigo encontra-se dividido em duas partes. Primeiro, trataremos da forma como o policiamento ostensivo é planejado, assim como quem são os responsáveis por tal planejamento. Em um segundo momento, abordaremos a trajetória de vida destes policiais negros/as e sua relação com a instituição, enquanto negros/as que ocupam cargos de comando. As entrevistas nos permitem afirmar que, entre oficiais da PMDF, o reconhecimento da raça como categoria que media o saber prático policial está diretamente relacionado às experiências pessoais dos/as oficiais. Em resumo, ao identificar e sistematizar os diversos significados atribuídos à raça no saber prático da PMDF, a partir do imaginário e das experiências de oficiais negros/as, o artigo visa contribuir para as discussões relacionadas ao planejamento do policiamento ostensivo e às percepções a respeito das relações raciais dentro da PMDF, considerando as vivências, experiências e trajetórias pessoais dos policiais entrevistados.
Palavras-chaves: policiamento ostensivo, policiais negras/os, raça, trajetória
Andresa Pereira de Sena, Marina Carvalho Paz
Atualmente é mestranda do Programa de Pós-Graduação do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília, orientada pela Profª Drª Haydée Caruso. Possui graduação em Ciências Sociais com habilitação em Licenciatura pela Universidade de Brasília (2016).
JUVENTUDE E VIOLÊNCIA: AS VÍTIMAS DE HOMICÍDIO NO MACIÇO DE BATURITÉ E OS DESAFIOS PARA POLÍTICAS PÚBLICAS DE PREVENÇÃO À VIOLÊNCIA EM REDENÇÃO-CE.
Resumo: Este artigo tem como objetivo traçar alguns apontamentos críticos sobre a juventude sujeita à violência no município de Redenção, localizado na macroregião do Maciço de Baturité, no Ceará, a partir de dados estatísticos de mortalidade violenta tendo como fio condutor o debate acerca da “interiorização” da violência, que caminha junto com a “nordestinação” dos homicídios, isto é, da mudança geopolítica dos indicadores da violência no Maciço de Baturité. Fez-se uso de dados coletados do portal DATASUS, correlacionando-os com entrevistas semiestruturadas realizadas com profissionais da assistência social, operadores do direito e agentes da segurança pública de Redenção. Constatou-se a ausência e precarização de programas e ações socioassistenciais e de políticas públicas voltada para as juventudes em condição de vulnerabilidade e risco social, sobretudo, jovens negros em espaços periféricos da cidade. Dessa maneira, observa-se a necessidade de abordar questões de política pública para a juventude nutrida num diálogo com a segurança pública de modo intersetorial e dentro de uma concepção mais ampliada, não centrada nas atividades policiais de repressão e investigação, mas nas redes de proteção social e de administração de conflitos. Cresce a importância de articular os serviços e projetos de prevenção e enfrentamento da violência e proteção à vida tomando os jovens como agentes transformadores da cena social.
Palavras-chaves: juventude; violência; desigualdade; prevenção e enfrentamento da violência.
Antonio Micael Pontes da Silva, Francisco Thiago Rocha Vasconcelos.
Mestrando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), Licenciado em Sociologia pela Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) e Bacharel em Humanidades pela UNILAB.
O Policiamento Comunitário na Polícia Civil de Minas Gerais: uma mudança organizacional?
Dois são os objetivos deste artigo: compreender como o policiamento comunitário, por ser uma mudança nos objetivos organizacionais, promove alterações de cunho ambiental, estrutural, institucional e cultural nas polícias que decidem por sua adoção; e compreender como o modelo de Policiamento Comunitário se insere na Polícia Civil de Minas Gerais e em que medida esse modelo promove a mudança dessa organização. Para tanto, utilizamos como framework de análise os conceitos estruturantes da sociologia das organizações, de forma a compreender como a alteração no objetivo maior do policiamento deve resignificar dimensões ambientais, estruturais, institucionais e culturais dentro da Polícia Civil. Os dados coletados em 2017 indicam que o Policiamento Comunitário é tão somente o oferecimento de alguns programas que não guardam relação direta com a missão da instituição, se configurando em um novo nome para velhas práticas dentro da Polícia Civil de Minas Gerais.
Palavras-chaves: Policiamento Comunitário; Aprendizagem Organizacional; Mudança Organizacional; Polícia Civil de Minas Gerais.
Daniel Araujo de Azevedo
Doutorando em Sociologia e Mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (2017). Bacharel em Ciências Sociais também pela Universidade Federal de Minas Gerais (2012).
VIOLÊNCIA E RACIALIZAÇÃO: REFLEXÕES PRELIMINARES SOBRE A PRODUÇÃO SOCIAL DO MEDO NA DEMOCRACIA BRASILEIRA
O artigo proposto apresenta parte de pesquisa de doutorado sobre representações e interpretações da violência intitulada “Medo, surpresa e violenta emoção: a fetichização da violência na democracia brasileira”. A pesquisa é realizada sob orientação da professora doutora Haydée Caruso, coautora do presente artigo. O objetivo é refletir sobre a produção social do medo a partir de amálgamas entre raça e violência. Para tal, propomos interações entre contribuições fundamentais da sociologia da violência brasileira, como linguagem da “violência urbana” e sociabilidade violenta (MACHADO, 2011), sujeição criminal e acumulação social da violência (MISSE, 2010), representações sociais da violência (PORTO, 2010) e administração institucional dos conflitos (KANT DE LIMA, 2010; 2016), e estudos sobre a branquitude e o branqueamento no Brasil. Explorar as interfaces entre a sociologia da violência e estudos provenientes de outros campos das ciências humanas e sociais, como a história e a psicologia, por exemplo, sobre as origens e os efeitos da racialização na sociedade brasileira nos permite acessar e lapidar instrumentos teóricos de alto potencial explicativo no que se relaciona às contradições presentes nas representações e interpretações da violência na democracia brasileira. Por fim, o artigo oferece, a partir do referencial teórico proposto, breve análise de conteúdo do chamado “Projeto Anticrime”, de autoria do Ministro da Justiça e da Segurança Pública e ex-juiz, Sérgio Moro, que tramita no Congresso Nacional e prevê modificações no Código Penal brasileiro que, sob o subterfúgio de combater o crime organizado, intenta legalizar práticas terroristas que sub-repticiamente autorizam a radicalização do genocídio antinegro no Brasil.
Palavras-chaves: medo, violência, racismo, democracia, Brasil, projeto anticrime
Laura Gonçalves de Lima, Haydee Glória Cruz Caruso.
Laura Gonçalves de Lima. Bacharela em Relações Internacionais pela UNESP, campus de Franca (2014). Mestra em Ciências Sociais pelo Departamento de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Brasília (2016). Doutoranda em Sociologia pela UNB.
Policiamento preditivo, controle social e desigualdades raciais
Este paper é parte de uma pesquisa em andamento sobre as intersecções entre o uso de tecnologias e discriminação racial pela Polícia Militar do estado de São Paulo (PMESP), Brasil. Visa-se avaliar a importância do uso da tecnologia - e se tal se enquadra enquanto policiamento preditivo. A partir do conceito de racismo institucional, este estudo também investiga como as tecnologias relacionadas ao policiamento podem impactar, em um Estado Racial, a reprodução de desigualdades raciais. Enquanto um estudo qualitativo, as fontes mobilizadas no presente estágio consistem primariamente em revisão bibliográfica e entrevistas com policiais. Os resultados preliminares indicam que o uso da tecnologia pela PMESP age em duas direções diferentes, ainda que ambas espacialmente referenciadas: em primeiro lugar, contribui para a organização dos recursos policiais em áreas específicas/prioritárias por meio do georreferenciamento de registros de ocorrências criminais. Em segundo lugar, fundamenta-se na introdução de tecnologias de análise de imagens para a identificação de situações suspeitas. Em ambos os casos, essas tecnologias parecem reforçar as práticas de filtragem racial e de racialização do suspeito, contribuindo para a estigmatização de pessoas negras e suas comunidades.
Palavras-chaves: Polícia Militar, racismo institucional, policiamento preditivo, controle social, filtragem racial
Letícia Simões-Gomes
Mestre em Sociologia pela FFLCH/USP, Doutoranda em Sociologia pela FFLCH/USP e pesquisadora vinculada ao NEV/USP.
“TEM DIAS QUE ELES DEIXAM OS BRANCO PASSAR E PARAM OS NEGRO”: representações sociais sobre violência policial e o marcador social raça.
Trabalho buscou realizar um estudo de caso acerca da Polícia Militar do RS. Analisamos as representações sociais sobre a atuação da PM, tanto dos policiais militares como da sociedade civil, trazendo como centro guiador os debates sobre violência policial e suas relações com a racialização. A pesquisa teve como objetivo central analisar a influência do marcador social raça na abordagem policial, identificando sua relação com a própria construção do campo de Segurança Pública no Brasil, a partir de um olhar voltado para a ideia da existência de representações sociais que moldam - e são moldadas - pelos atores sociais presentes nesse contexto. Assim, traçamos um estado da arte da formação da Polícia Militar no Brasil, bem como a formação dos próprios policiais militares dentro dessa Instituição, trazendo as aproximações e diferenças de alguns estados do Brasil. Ademais, buscou-se debater sobre o mandato policial e a legitimidade de atuação dessa Corporação. O marcador social raça foi trazido através de um caminhar histórico do fim da escravidão no Brasil, bem como de sua relação com os debates sócio-geográficos e sua aproximação com a chegada da Escola Positiva de Criminologia. O trabalho de campo realizou-se a partir de entrevistas com 12 Oficiais da BM do RS, bem como através de 2 grupos focais com jovens que frequentavam o Centro da Juventude da Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre. Os resultados elucidaram uma dinâmica de interação polícia- comunidade inserida em um percepção de combate constante, permeado por medos e angústias trazidos pelos atores. Os processos identitários são (re)construídos nesses embates de afirmação do “eu” em relação ao “outro”, sendo atravessados por processos de racialização que carregam consigo a construção social do “suspeito nato”.
Palavras-chaves: Polícia Militar; Violência Policial; Representações Sociais; Racialização
Luiza Correa de Magalhães Dutra
Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Especialista em Segurança Pública, Cidadania e Diversidade, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Produzindo "verdades": narrativas policiais dos flagrantes de tráfico de drogas na cidade de São Paulo
Diversas pesquisas sobre tráfico de drogas apontam para a padronização das narrativas policiais com relação aos flagrantes de tráfico de drogas que realizam, destacando o uso de termos como: atitude suspeita, tipo e quantidade da droga, quantidade da droga, local da apreensão, confissão informal, entrada franqueada. A relevância desses relatos é percebida quando tais vocabulários são mobilizados pelos operadores do Direito em suas manifestações, seja para manter a prisão provisória, seja para condenar. Poucos questionamentos são apresentados com relação a esses vocabulários pelos operadores do Direito. O critério relacionado às “circunstâncias sociais e pessoais” traz elementos seletivos e discriminatórios para a definição do crime, assim como as “condições em que se desenvolveu a ação”. Diante desse cenário, como os policiais mobilizam esses critérios para a classificação do delito? Eis a questão que se pretende apresentar na presente proposta. Realizamos uma análise das narrativas policiais dos flagrantes de tráfico de drogas, mostrando que esse repertório de vocabulário dos agentes policiais na produção do flagrante compõe uma série de estratégias para a caracterização de um determinado fato como crime, sobretudo nos casos envolvendo tráfico de drogas, que encontra um determinado perfil de pessoas presas.
Palavras-chaves: verdade jurídica, verdade policial, justiça criminal, drogas
Maria Gorete Marques de Jesus
Pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV/USP) Doutora em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação do Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). Mestre em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP).
A RELAÇÃO ENTRE OS JOVENS E A POLÍCIA EM CEILÂNDIA (DF)
Este trabalho integra a pesquisa Sociabilidades juvenis na periferia do Distrito Federal: um estudo comparado sobre a relação entre jovens e policiais no Jardim Roriz (Planaltina) e no Sol Nascente (Ceilândia), que tem por objetivo principal compreender as sociabilidades juvenis em dois territórios da periferia do DF, assim como a relação que se estabelece entre os jovens e as polícias. A seguinte proposta de trabalho apresenta os resultados encontrados em Ceilândia, onde, para a aproximação aos jovens, foi realizada uma imersão em dois Centros Educacionais que atendem alunos/as dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. Paralelamente também foram entrevistados policiais militares do Grupamento Tático Operacional (GTOP), integrantes do 10º Batalhão da PMDF que atuam em Ceilândia e figuram como o principal ponto de contato entre a juventude e os órgãos de segurança pública, além de serem responsáveis pelo policiamento ostensivo de toda a área pesquisada.Em um primeiro momento, discorremos sobre o pano de fundo no qual se estabelece a relação entre juventude e polícia, apresentando Ceilândia, suas problemáticas e principais dinâmicas territoriais. Em um segundo momento, entrecruzaremos as percepções juvenis sobre a atuação policial na região com as considerações dos policiais sobre a juventude ceilandense. Por fim, faremos uma reflexão sobre a relação entre jovens e policiais na região, apontando as especificidades locais da interação entre estes dois grupos e revisitando a noção de “peba”, categoria de análise nativa que assinala o tipo ideal do indivíduo suspeito, o qual, segundo Silva (2009), é o homem, negro, jovem, pobre, com tatuagens, roupas folgadas e boné. Tal categoria é central para pensar as juventudes na periferia do DF.
Palavras-chaves: polícia; juventude; controle social; suspeição; periferia do Distrito Federal
Marina Carvalho Paz, Yacine Guellati
Marina Carvalho Paz. Mestranda e Graduada em Sociologia pela Universidade de Brasília. É professora temporária de Sociologia na Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal- SEE/DF, atuando em uma escola pública de Ceilândia.
Ministério Público: entre a letalidade policial e o direito à vida
O Ministério Público tem a função de defender a ordem jurídica, os interesses sociais e individuais e o regime democrático. É a instituição que atua dentro do Sistema de Justiça Criminal com a competência de fiscalizar o cumprimento das leis e da Constituição Federal visando a defesa dos interesses da sociedade, portanto uma de suas atribuições é o controle externo da polícia. Competência que se materializa por meio da investigação realizada pelo MP sem a participação policial. Em resumo, sua atuação se impõe pela obrigação de zelar pelo direito à vida e, portanto, o MP tem o dever de levar adiante todos os casos que atentem contra a vida dos cidadãos. Em vista disso, a proposta deste artigo é analisar, a partir de uma revisão bibliográfica, como a atuação do Ministério Público pode ou não corroborar com a crescente violência letal praticada pela polícia contra um grupo específico (homens, jovens, negros ou pardos). Partindo de uma ideia de seletividade da justiça (Sinhoretto, 2014) onde existe um suspeito em potencial que é abordado, apreendido, aprisionado e exterminado sob a prerrogativa weberiana de uso legítimo da violência. Na concepção de Wacquant (2002) é a partir da fórmula “jovem mais negro mais sexo masculino” que se encontra a justificativa da prisão, do interrogatório, da revista corporal e da detenção deste público. Portanto o objetivo central é entender se a crescente incidência de homicídio praticado pela polícia contra esse grupo social específico é validado pela atuação do Ministério Público.
Palavras-chaves: Ministério Público; Seletividade da Justiça; Letalidade Policial
Nathalia S Mourão
Mestranda no programa de Pós Graduação da Fundação João Pinheiro. Possui graduação em Gestão de Recursos Humanos pelo Centro Universitário UNA (2013). Graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
NOVAS FORMAS DE POLICIAMENTO? O TRABALHO DA POLÍCIA MILITAR E DA POLÍCIA CIVIL NO CONTEXTO DA POLÍTICA DE INTEGRAÇÃO POLICIAL EM BELO HORIZONTE
A segmentação das atividades policiais em organizações distintas tem sido apontada como algumas das barreiras a serem enfrentadas pelas políticas de segurança pública no Brasil. Além das distintas atribuições, as polícias brasileiras são marcadas por processos formativos e estruturas organizacionais diferentes. Contudo, ambas tem sido marcadas por um modelo policial tradicional, onde prevalece a repressão e o discurso de combate ao crime, em detrimento de maior proximidade com a comunidade e entre as polícias. As políticas de integração policial tem sido uma das formas de contornar essa problemática que se encontra inscrita na constituição de 1988. Dessa forma, o estudo volta a compreender a visão dos policiais diante da política de integração policial em Belo Horizonte. Ainda em reallização, serão utilziados dados secundários de pesquisas realizadas em nível nacional e estadual que exploraram questões como as mudaçnas no modelo policial, como a unificação e a integração policial.
Palavras-chaves: Polícia Militar; Polícia Civil; Segurança Pública; Policiamento; Reforma Policial
Tiago de Jesus Brito
Graduado em Ciências Sociais e mestrando em Sociologia, ambos pela Universidade Federal de Minas Gerais. Foi bolsista do PET - Conexões de Saberes UFMG, passando por um período formativo em temáticas como gênero, raça e sexualidade.
RELAÇÕES ENTRE MORTALIDADE POLICIAL E RACISMO: mais uma forma de silenciamento do sofrimento negro no Brasil
A partir de uma governamentalidade neoliberal, em que o mercado se torna o centro das ações governamentais e a utilização do medo se torna uma das principais tecnologias de poder, o problema da insegurança social no capitalismo tem sido estudado como um fenômeno que coloca o poder punitivo como central nas políticas institucionais dessa nova arte de governar. Ocorre que, com o aumento desse aparelho repressivo estatal, prioriza-se a formação de práticas policiais hierarquizadas, autoritárias e direcionadas à criminalização e marginalização das classes subalternas, gerando um imaginário social que só com políticas policialescas será possível acabar com a “criminalidade” e a “violência” próprias da insegurança social em que se vive. No Brasil, esse contexto nos demonstra que mais do que um problema conjuntural de falta de treinamento, infraestrutura e investimento dos salários desses profissionais da segurança pública, há um problema estrutural do poder punitivo nas sociedades capitalistas do sul global. É importante ainda frisar como a mortalidade policial no Brasil se sedimenta também em processos de hierarquizações raciais, em que é possível encarar como a vitimização é um privilégio da branquitude. Segundo esses autos, a posição de vítima sempre exige um nível de empatia, solidariedade e alteridade, as quais são impedidas por uma generalizada suspeição direcionada à população negra. Portanto, objetiva-se contextualizar a polícia militar brasileira em um processo de racismo institucional, em que tal instituição foi moldada a partir de uma naturalização e invisibilização do sofrimento negro, considerando a dimensão estrutural do racismo na formação social brasileira. Para isso, far-se-á um a revisão bibliográfica, bem como uma análise de dados sobre o tema.
Palavras-chaves: Mortalidade policial. Neoliberalismo. Racismo.
Vitória de Oliveira Monteiro
Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Pará (PPGD/UFPA) na linha de pesquisa “Intervenção Penal, Segurança Pública e Direitos Humanos”. Membro do Centro de Estudos sobre Intervenção Penal (CESIP).
O “causar” e o “conciliar” na Justiça: os sentidos da política de conciliação na prática
Pretendo explorar alguns resultados da minha pesquisa de mestrado, que analisou os sentidos da política nacional de conciliação no cotidiano das pessoas que formam e acessam o serviço judicial em um fórum no interior do Estado de São Paulo. Partindo de uma abordagem etnográfica, realizei um período de observação participante de março a junho de 2017 no foro central de Campinas-SP. Os dados confirmam o que outras pesquisas já apontaram (Sinhoretto, 2011): as audiências de conciliação não criam práticas diferentes das observadas nas audiências formais, reforçando assimetrias existentes no sistema de justiça. Ao estipular que acordos se tornem o principal critério de eficiência, o sentido de consenso fica limitado à assinatura do acordo. Nesse contexto, pacificar um conflito é fazer com que as partes não briguem, não “causem” e, no limite, não falem a respeito do conflito. Assim, a conciliação tem se tornado uma ferramenta ideológica escondida atrás de um discurso que promete mais democracia e acesso, e entrega um “modelo de justiça neoliberal” (Garapon, 2008). Dois grupos perpassam esse modelo: (1) a mediação impositiva dos funcionários, a linguagem jurídica e as formalidades na produção de acordos, e o tratamento diferenciado a advogados e ao público em geral; e (2) a reprodução de desigualdades econômicas, sociais, raciais e de gênero na execução da política, tal como o tratamento negligente a vítimas de violência doméstica, a presença de racismo institucional e as vantagens processuais dos “repeat players” (Galanter, 1974). Os resultados apontam uma forte atuação do Estado em políticas repressivas, regulatórias ou atuariais que controlam e reproduzem condições de competição e, portanto, de desigualdade (Dardot & Laval, 2016; Foucault, 2008).
Palavras-chave: Conciliação, Judiciário, Acesso à Justiça, Reformas Judiciais, Ritual.
Elizabete Pellegrini
Doutoranda e mestra em Ciência Política pela UNICAMP e bacharela em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Práticas Restaurativas na Escola: implantação de uma Cultura de Paz
Este trabalho busca compreender como as práticas restaurativas, dentro do contexto escolar, podem contribuir para o enfrentamento da violência entre educandos bem como trabalhar para o fortalecimento da postura reflexiva, da escuta, do respeito e da solidariedade para a diminuição de conflitos escolares. Trata-se de um estudo realizado no ambiente escolar, com educandos do Ensino Fundamental I, II e Ensino Médio, de uma escola filantrópica localizada na periferia da cidade de Ribeirão Preto/SP. Os dados estão sendo coletados por meio dos registros dos círculos restaurativos que ocorrem mensalmente nas salas de aulas, registros fotográficos e acompanhamento do número de mediações de conflitos realizadas na escola. A proposta de prática restaurativa utilizando a metodologia de círculos visa eliminar a verticalidade das relações possibilitando a horizontalidade para que as mais diferentes decisões sejam de forma consensual e solidária (Pranis, 2010). O empoderamento escolar através das práticas restaurativas possibilitará a construção de uma comunidade coesa cujas necessidades possam ser ouvidas e atendidas. A interconexão se estabelecerá entre as pessoas e ultrapassará as barreiras das disputas e poderes. Conforme Hopikins (2004), nossos pensamentos influenciam as nossas emoções e saber identificar e lidar com estas emoções fará toda a diferença nos relacionamentos. Agir de forma não violenta é a chave para uma sociedade harmônica. Os resultados deste trabalho mostram que investir na propagação da concepção de cultura de paz dentro da escola e tornar este espaço restaurativo é fundamental para romper com práticas baseadas na violência promovendo o educando como sujeito ativo, critico, e atuante em seu papel social (Freire, 2002).
Palavras-chave: Práticas Restaurativas, Escola, Violência.
Livia Masson, Marcia Regina Nogueira Soares
Assistente Social do Centro Educacional Marista Ir Rui. Mestre em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo. Extensão em Educação, Pobreza e Desigualdade Social pela Universidade Federal de São Carlos. Especialização em Justiça Restaurativa pela PUC.
Sartup in Favela: empreendedorismo social como estratégia de docilização dos corpos não criminosos.
O objetivo deste trabalho é produzir um estudo sobre as práticas de uma empresa de tecnologia, e um instituto a ela vinculado, em um dos projetos sociais que desenvolve, voltado à difusão da linguagem de programação em favelas do Rio de Janeiro. A forma como os agentes das iniciativas privadas e do terceiro setor cultuam a ideia do auto-resgate através do empreendedorismo se coloca como um dos problemas centrais investigados. Por meio de suas redes reais e virtuais, circulam a idealização de um estilo de vida e difundem a crença na possibilidade de um mundo melhor, conforme um jargão do universo social pesquisado, por intermédio de projetos classificados por eles como projetos de tecnologia social. O trabalho de campo foi realizado de forma multissituada, entre uma empresa, um Instituto e beneficiários do projeto social. Os debates teóricos abarcam os temas da antropologia política e econômica. Tomando como conceitos importantes de análise, a pobreza, a juventude, e os problemas sociais, podemos compreender como os instrumentos de “resgate” movidos pelos agentes da empresa estão associados a vontade de modificar o outro, assim como a benevolência que concedem a si mesmos quando cumprem seu papel de interventores. Analisar de que forma as e os agentes da empresa, do Instituto e do projeto social (alunas e alunos) exercem seu poder e calculam sua força de negociação para alcançar seus interesses. Observar as técnicas de governo que a empresa aciona quando pretende realizar a “transformação social profunda” na favela, por meio do projeto social. Demonstrar os usos de marcadores de pobreza, de imoralidade e de incapacidade que existem na relação entre pessoas da empresa com os alunos e alunas moradores de favela.
Palavras-chave: Empreendedorismo; justiça; favela; burocracia; desenvolvimento sustentável.
Luana Antunes Varela Salvadori.
Antropóloga e educadora. Desenvolvo projetos na área de tecnologia social; direitos humanos; desenvolvimento sustentável por meio de ONG’s e movimentos sociais; Etnoeducação; Educação patrimonial; projetos de compensação; resolução de conflitos.
Justiça Restaurativa como Política Judiciária: as experiências dos juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher no Estado do Rio Grande do Sul
O presente trabalho tem por objetivo demonstrar, por meio da aproximação entre teoria e prática, quais os efeitos da tradução da justiça restaurativa para o Brasil – no modelo de política judiciária – no âmbito da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. Discute-se, portanto, de que forma a justiça restaurativa se apresenta como meio alternativo de solução desses conflitos, bem como a potencialidade de se pensar outras formas de fazer justiça e acessá-la. Importa-nos, também, questionar quais os riscos de desenvolvimento de programas experimentais em casos de violência doméstica contra a mulher, e os desafios de construção de um modelo de justiça eminentemente restaurativo que concretize o tripé princípios-valores-práticas. Na tentativa de aprofundar as questões centrais que orientam este trabalho, realizamos revisão bibliográfica, privilegiando a teoria crítica da justiça restaurativa; análise documental de dados oficiais sobre a implementação e avaliação dos Programas brasileiros, e análise de resultados de três estudos de caso efetuados no âmbito de três Juizados de Violência Doméstica no Estado do Rio Grande do Sul. Concluímos, preliminarmente, que a incidência enquanto política judiciária ofereceu maiores possibilidades de desenvolvimento da justiça restaurativa no país, contudo, o engessamento das práticas apresentam riscos às partes envolvidas, pois violam direitos e garantias do acusados e vinculam as vítimas ao resultado dos processos restaurativos, de forma a reproduzir violências estruturais e a servir para manutenção de opressões sistemáticas. Percebe-se, então, a deturpação do conceito de justiça restaurativa, demonstrando-se a necessidade de se repensar linguagem, locais, protagonismos e relações de poder.
Palavras-chave: Justiça restaurativa, violência doméstica, política judiciária.
Michelle Karen Batista dos Santos, Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo.
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PPGCCRIM/PUCRS). Bolsista CAPES. Especialista em Ciências Penais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Análise dos programas sobre Mediação de Conflitos no Brasil na Segurança Pública
Não obstante o desenvolvimento técnico alcançado pelo Direito, alguns temas ainda carecem de aprimoramento ou mesmo de reconfiguração. Justamente o que vem se verificando, cotidianamente, na realidade empírica, no tocante ao desempenho do Poder Judiciário, demonstrando a necessidade da operação do Direito no fluxo do movimento das relações sociais. Colocada a questão neste projeto, para se estimular a reflexão sobre os programas da Segurança Pública, nos Estados brasileiros, sobre a mediação de conflitos no âmbito policial. A presente pesquisa, além de importância jurídica, tem relevância social, pois à margem da legalidade, a prática extra-oficial de maior relevância nas Delegacias de Polícia são as conciliações e mediações que produzem respostas alternativas às demandas de um público, por vezes, marginalizado, refletindo, diretamente, nos direitos de minorias e o acesso à justiça efetiva. Com a análise da eficiência destes programas e a aplicação dos métodos alternativos/adequados de resolução de conflitos e seus princípios. O objetivo geral está na análise das informações sobre o processo de criação, implementação e funcionamento destes programas, bem como os desafios enfrentados pelos profissionais no desempenho de suas atividades. Aplicando o método dedutivo e a pesquisa bibliográfica e documental para revelar novas possibilidades, para além do acesso ao Judiciário. Como resultados preliminares, pode-se concluir, até o momento, que a implementação da Mediação Policial nos conflitos criminais de menor potencial ofensivo, é medida a ser incentivada a sua ampliação e manutenção, merecendo destaque por estar também em expansão na Europa e em países Latino Americanos, conforme se pode extrair da análise dos Congressos Ibero-Americanos de Mediação Policial na Espanha.
Palavras-chave: Segurança pública, Justiça Restaurativa e Dialógica, mediação policial, mediação de conflitos, Direito Penal.
Patrícia Pacheco Rodrigues, Samantha Ribeiro Meyer- Pflug Marques, Gabriela Marinho Rodrigues da Silva.
Delegada de Polícia Civil em São Paulo; mestranda em Direito pela Universidade Nove de Julho, na linha de pesquisa: justiça e o paradigma da eficiência; pós-graduada em Resolución de conflictos: estrategias de negociación y técnicas de mediación.
Os corres, os pilantras e a facção: angulando a constituição da masculinidade em mercados ilícitos em Maceió/AL
Partindo da trajetória de jovens em sistemas de internação na cidade de Maceió/A, focalizo como a produção de narrativas acerca de assassinatos de rivais em lutas por defesa de biqueiras caminha lado a lado com uma nova geografia produzida por um intenso processo de interpenetração de facções criminais em cidades alagoanas em meados de 2015-2016 (MARQUES, 2009; RODRIGUES, 2018; SILVA, 2018). Meu argumento é que novos canais de debate e diálogo vinculados a noções de justiça se entrelaçam a antigos e novos códigos simbólicos, expressos em termos como ser do crime, corro com, sou de em relação a posições ocupadas em novos regimes de verdade relativos à economia moral das posições ocupadas dos agentes em atividades de defesa de biqueiras a partir da atuação de facções criminais em cidades alagoanas. Neste sentido, diferentes ângulos sobre sensos de identificação masculina são produzidos com base nos esforços de uma maior ou menor integração em redes de interdependência em mercados ilícitos que tem como base a gestão de uma economia moral de valoração dos homens (CONNEL, 2013; NASCIMENTO, 2019; SÁ, 2011;). Analiso a trajetória de jovens em sistemas de internação, evidenciando episódios ligados à defesa de biqueiras a partir do assassinato de rivais, enquanto lógicas decorrentes de exigências gestadas em diferentes redes de interdependência (ELIAS, 1994) nas quais termos como matar, quebrar e derrubar pilantras são operacionalizados como partes integrantes de regimes de verdade que têm como base a construção de valorações em relação à experiência da masculinidade enquanto termo comum que estrutura uma balança eu-nós (BUTLER, 2013; ELIAS, 1994; FOUCAULT, 2014; MOORE, 2000; WELZER-LANG, 2001).
Palavras-chave: Masculinidades, mundo do crime, facções criminais, justiça alternativa.
Rangel Ferreira Fideles do Nascimento
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de São Carlos.
Justiça Restaurativa - Uma alternativa para o enfrentamento da Violência Doméstica
O fenômeno da violência doméstica está presente na sociedade há séculos e foi tolerado e até justificado por muito tempo como uma forma de educação e valores sociais. Apesar dos avanços legislativos, verificou-se que as formas adotadas atualmente para resolução dos conflitos não foram suficientes para conter a violência doméstica. Houve um crescimento nas estatísticas de crimes envolvendo as mulheres no ambiente doméstico, o que justificou uma análise aprofundada das estratégias utilizadas para o enfrentamento desse fenômeno. Nas últimas décadas, diversos estudos foram desenvolvidos para buscar alternativas a essa problemática, já que as ferramentas utilizadas pelo sistema de justiça tradicional podem não ser os únicos meios eficazes para a solução desses conflitos. A justiça restaurativa surgiu como um modelo centrado em enfrentar o crime no âmbito do seu conflito (inter)pessoal, com o intuito de promover a pacificação através de uma medida reparadora à vítima e a responsabilização do infrator. Uma forma de solução de conflitos que, antes de tudo, é pensada na/para a vítima, de modo a curar seus medos e suprir suas necessidades. Contudo, ainda que esse novo paradigma de justiça já tenha sido introduzido no ordenamento jurídico brasileiro, constatou-se um limitada aplicação das práticas restaurativas nos conflitos da violência doméstica. Os pequenos e pontuais projetos desenvolvidos no Brasil, apontam para uma grande resistência na aplicação da Justiça Restaurativa em conflitos de violência doméstica, na contramão de grandes avanços verificados no contexto internacional, a exemplo dos resultados positivos alcançados na Áustria, através do método victim-offender mediation, nos casos de intimate partner violence, conforme demonstrado por Christa Pelikan.
Palavras-chave: Violência Doméstica, Justiça Restaurativa, Práticas Restaurativas, Victim-Offender-Mediation.
Renata Rodrigues Guimarães Wollmann, Fernanda Maria Justo
Advogada. Mestre em Ciências jurídico-Criminais pela Universidade de Coimbra, Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela PUC-PR, Especialista em Direito Aplicado pela EMAP. Coordenadora do Grupo Permanente de Pesquisa sobre Violência Doméstica.
O cravo, a rosa e a cultura de paz: aplicação da justiça restaurativa nos crimes de violência de gênero
A paralisante e angustiante situação enfrentada em relação aos crimes de violência de gênero, que alavancam os dados estatísticos do país, faz insurgir como questionamento, o seguinte: quais as possíveis medidas aplicáveis para minimização desse contexto estarrecedor da sociedade brasileira contemporânea. Ao abordar a questão de gênero, verifica-se necessariamente a desigualdade existente entre homens e mulheres, reforçada pelos discursos machistas e de ódio que objetificam a mulher e a tratam como simples propriedade, embora, o texto constitucional de 1988 emane o reconhecimento da igualdade dos indivíduos, sem distinções. Dessa concepção enraizada de objetificação, estrutura-se a ambientalização da violência de gênero na figura da violência doméstica. Por meio da análise bibliográfica, objetiva-se explorar o processo de configuração dos crimes de violência de gênero e a aplicabilidade de medidas alternativas na busca da cultura de paz. Dessa forma, retornando à indagação inicial, vê-se como possibilidade de enfrentamento da violência de gênero a instrumentalização da justiça restaurativa para superação e pacificação do conflito. Restaurar as relações humanas, voltando-se para vítima e o dano sofrido em contraposição aos meios aplicados recorrentemente utilizados moldados nas concepções anti-garantistas e punitivistas.
Palavras-chave: Justiça restaurativa, violência de gênero, cultura de paz.
Sara Rodrigues de Moraes, Rafaela Alice Faria.
Discente do Curso de Direito da Faculdade Eduvale de Avaré.
As propostas do "Pacote Anticrime" (Projeto de Lei nº 882/2019) para a Segurança Pública: populismo penal e tragédia anunciada
O denominado “Pacote Anticrime”, apresentado pelo Ministro da Justiça e da Segurança Pública Sérgio Moro e atualmente em tramitação da Câmara dos Deputados sob o número 882/2019, tenciona-se ao enfrentamento da corrupção, do crime organizado e dos crimes cometidos com grave violência a pessoa. O próprio nome dado ao projeto pelo Ministro deveria trazer desconfiança aos mais prudentes, afinal, indica que está fundado na ilusão de que as leis penais são a solução mágica para os problemas da violência e da segurança pública contemporâneas. Mas o problema não está só no nome. São propostas alterações bastante polêmicas ao Código Penal, ao Código de Processo Penal, à Lei de Execução Penal, e a outras onze leis penais especiais. O projeto aposta no agravamento, qualitativo e quantitativo, das penas; na antecipação do momento de cumprimento de pena; a imposição de dificuldades à progressão de regime e obtenção de benefícios na execução; na expansão o conceito de organização criminosa e em mudanças significativas para o instituto da legítima defesa como resposta aos problemas nacionais de segurança pública. Ao presente trabalho interessam, principalmente, as medidas do Pacote Anticrime voltadas à temática da segurança pública. Pretende-se, por meio da análise do Projeto de Lei 882/2019, da mensagem enviada ao Congresso Nacional, associada à pesquisa bibliográfica, avaliar o enquadramento da proposta no fenômeno do populismo penal, bem como, a partir de dados e relatórios sobre violência, segurança pública e encarceramento de institutos de pesquisa (INFOPEN, IPEA, FBSP, NEV, entre outros) verificar se e como as propostas de alteração legislativa pretendidas podem resultar no agravamento quadro atual de violência – disseminada e institucionalizada – no país.
Palavras-chave: Pacote Anticrime; Populismo Penal; Encarceramento; Seletividade; Letalidade Policial
Ana Carolina de Morais Colombaroli
Graduada e Mestre em Direito Penal pela UNESP; Professora Universitária na Libertas Faculdades Integradas.
Policiamento e Polícia: controles alternativos no policiamento de manifestações
O policiamento é inerente a qualquer organização social, a polícia, no entanto, é uma criação das sociedades modernas. A partir dessa constatação, o trabalho policial torna-se um produto da cultura vigente em cada sociedade, reproduzindo suas normas e valores. O policiamento de locais públicos é tarefa exclusiva da polícia em muitos países, portanto, os protestos de rua também são policiados por esse órgão, embora se trate de legitimidade democrática e, muitas vezes, questões políticas. Através do estudo dos protocolos do trabalho policial e da aplicação no caso brasileiro, apontando seus dilemas e falhas, verifico a necessidade de acionar controles alternativos à polícia militarizada no Brasil para a realização do policiamento de manifestações, mobilizando estudos comparativos do caso francês (compaigne républicaine de sécurité) e do caso britânico. Este estudo é parte da pesquisa de mestrado em andamento no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo.
Palavras-Chave: polícia; manifestações; controle; França; Inglaterra
Bianca Isabel Lombarde Silva
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo; Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Paulo.
Chacinas no Brasil: levantamento de dados da imprensa entre 2016 e 2018
A presente pesquisa, ainda em andamento, tem como objetivo analisar dinâmicas de violência no Brasil, tendo como foco as ocorrências de chacinas, como são conhecidas as ocorrências de homicídios múltiplos com três ou mais vítimas fatais. Para este estudo, foi construída uma base de dados a partir de notícias da imprensa, contemplando categorias que permitem a caracterização das ocorrências (local, horário, provável motivação, etc.), das vítimas e autores (idade, gênero, profissão, raça/cor, etc.) e das repercussões institucionais/judiciais (investigação e julgamento) e sociais/políticas (levantes, manifestações) destes casos. A base de dados compreende o período de 2016 a 2018, tendo sido identificados e coletados 242 casos com três ou mais vítimas fatais que foram caracterizados pela imprensa como sendo chacinas. Um total de 1.175 vítimas fatais foram sistematizadas. A análise dos dados preliminares indica que esse fenômeno compõe um repertório de ação, isto é, uma dentre outras possibilidades de cursos de ação, que emergem em contextos conflitivos diversos. Estes, por sua vez, representam fortemente os contornos dos principais conflitos regionais brasileiros, com destaque para as facções criminosas, tráfico de drogas, milícias, grupos de extermínio, atuação e operações policiais, conflitos agrários e feminicídios. Ressalta-se que, somados, os casos nos quais há suspeita ou certeza de participação de policiais ou outros agentes estatais (categorizados como atuação ou operações policiais, grupos de extermínio ou milícia) são a segunda motivação mais frequente de chacinas no país. Em alguns estados, como o Pará, correspondem à quase totalidade dos casos identificados. Esta pesquisa é parte do projeto Reconexão Periferias, realizado pela Fundação Perseu Abramo.
Palavras-Chave: Chacinas, violência, Brasil, homicídios múltiplos
David Marques, Jacqueline Sinhoretto
Mestre e Doutorando em Sociologia pela Universidade Federal de São Carlos. Coordenador de projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Consultor da Fundação Perseu Abramo no projeto Reconexão Periferias, do qual a pesquisa sobre chacinas faz parte.
A comunidade de política de segurança pública no governo estadual paulista (1983-2014)
A presente proposta consiste em uma análise do perfil dos gestores da área de segurança pública do governo estadual paulista no período compreendido entre os anos de 1983 e 2014, propondo a traçar a trajetória acadêmica e profissional dos gestores com poder decisório em órgãos de implementação de políticas de segurança pública(Secretaria de Segurança Pública, Secretaria de Administração Penitenciária, Secretaria de Justiça, entre outros). Parte-se da hipótese de que as características profissionais dos gestores, sua formação e experiências profissionais pretéritas, conformam preferências por determinados tipos de política. No caso, gestores com perfil mais ligado aos órgãos policiais e de administração da justiça comum teriam preferência por políticas mais repressivas enquanto aqueles ligados às defensorias públicas e/ou com trajetórias diversas tenderiam para políticas de cunho garantitivista. Como aspecto subsidiário do trabalho propõe-se o mapeamento da rede dessa comunidade de política, procurando padrões de relacionamento entre membros dessa comunidade que possam revelar trajetórias interligadas, elucidando aspectos fundamentais da conformação dessa comunidade e da relação desses agentes com as políticas implementadas.
Palavras-Chave: Segurança Pública, Políticas Públicas
Gabriel Ferreira dos Santos Soares
Bacharel em História pela Universidade de São Paulo (2013), Mestrando em Ciências Sociais pela Unifesp (Guarulhos)
Esposas de praças: família e política na Polícia Militar do Pará
O número de policiais militares mortos durante e, principalmente, fora de serviço no estado do Pará vem aumentado significativamente nos últimos anos, o que tem levado à organização por parte das esposas e familiares de policiais militares praças em volta da reinvindicação de uma política habitacional que possibilite a saída destes das periferias urbanas onde habitam. As periferias são consideradas “áreas de risco” pelos policiais e seus familiares, pois os coloca em contato direto com o público-alvo das ações policiais. O protagonismo feminino nestas pautas se deve ao fato dos policiais, por serem militares, se verem destituídos do direito de greve e de livre manifestação de pensamento e associação. No presente trabalho busca-se compreender de que forma o arranjo familiar imposto por uma relação direta entre as famílias de praças e a corporação policial-militar possibilita as estratégias específicas voltadas ao trato institucional de um tipo de conflito violento: o assassínio de policiais militares. Para isso serão analisadas as trajetórias sociais das componentes da Associação de Esposas e Familiares de Praças do Pará através de entrevistas, e em diálogo com a bibliografia de antropologia da família e da família militar. Esse método possibilita compreender as pressões sobre as trajetórias dessas mulheres, que as levou do lugar da invisibilidade feminina, regra nas instituições militares, a agentes-chave no debate público sobre a mortalidade de policiais militares no estado do Pará. Apesar do protagonismo feminino nesta pauta, os resultados preliminares apontam para a tendência à institucionalização do núcleo familiar dos praças, já que este passa a depender mais intensamente das relações com a corporação policial-militar.
Palavras-Chave: Polícia Militar; família; política; mortes violentas.
Gustavo Ferreira de Queiroz
Graduado em Direito pelo Instituto de Ciências Jurídicas (ICJ) da Universidade Federal do Pará (UFPA) e Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade de São Paulo (USP).
Meios para que fim? O policiamento ostensivo no Estado de São Paulo
Este trabalho tem como objetivo apresentar os resultados parciais da nossa pesquisa de doutorado sobre policiamento ostensivo realizado pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, sobretudo o patrulhamento ordinário realizado pela “rádio patrulha”. Esta pesquisa tem como mote compreender quais são os fins (objetivos e prioridades) que orientam e para o qual se organizam os fazeres policiais e os meios (saberes, tecnologias e técnicas) utilizadas pela instituição e pelos policiais para atingi-los, além de seus impactos para a Segurança Pública. Os resultados parciais são analisados a partir do diálogo com o debate encontrado na literatura das ciências sociais sobre segurança pública, policiamento e polícia, destacando o diálogo com a produção do Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflito (GEVAC) que nos últimos 10 anos tem se dedicado a estudar e produzir conhecimento sobre estes temas. A metodologia utilizada foi a qualitativa que focou principalmente a narrativa de policiais militares de diversas patentes, graduações e que tiveram experiência no planejamento e na execução do policiamento que foram entrevistados. As entrevistas foram realizadas seguindo um roteiro semiestruturado que procurou abordar: quem são os policiais, suas trajetórias profissionais, suas percepções sobre o policiamento ostensivo, como ele é planejado, executado e as relações internas e externas que o influenciam. O resultado até aqui demonstra que a instituição e seus operadores pouco discutem os fins a que devem atender, focando em aperfeiçoar os meios com os quais realizam seu trabalho. Essa relação meio e fim também demonstra um abismo que existe entre as praças e os oficiais, entre uma lógica empírica sem muitos recursos e uma de gestão com melhores recursos.
Palavras-Chave: Policiamento, Polícia Militar do Estado de São Paulo, Segurança Pública, Sociologia da Violência e Administração do Conflito.
Henrique de Linica dos Santos Macedo
Doutorando em Sociologia, mestre em Sociologia e graduado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Carlos. Estuda temas vinculados a segurança pública e a polícia militar desde 2011. Integra o Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos (GEVAC).
Rede de proteção e Resistência ao Genocídio
Este texto busca problematizar a configuração de políticas de Segurança Pública em São Paulo, a partir da vivência e olhares da população preta e periférica, identificada como alvo da violência de Estado enquanto também são protagonistas na defesa de direitos. Para tanto, o artigo considera o trabalho desenvolvido e proposto pela Rede de Proteção e Resistência contra o Genocídio. A Rede é um movimento que vem sendo construído por coletivos informais e instituições formais de São Paulo, desde 2017. Entende-se rede social, como um conjunto heterogêneo de iniciativas e recursos institucionais e da sociedade, que não escapa aos conflitos inerentes ao Estado e a sociedade de classes. Com a finalidade de buscar, a partir da atuação nos territórios de alta vulnerabilidade, articular e fortalecer diferentes iniciativas de organização local, formas de proteção e enfrentamento às violações de direitos praticadas pelo Estado brasileiro, que resultam na criminalização, encarceramento massivo e morte da população pobre do país, atingindo especialmente, o jovem negro periférico. Utilizando como estratégias: 1) formação na perspectiva de defesa e promoção de direitos humanos; 2) Fortalecimento de estratégias locais / territoriais de enfrentamento à violência; 3) incidência nas políticas públicas sociais e de segurança pública, a maior participação da população na luta por garantia de direitos; 4) relação de confiança com a comunidade, em contraposição ao silêncio, medo e insegurança que perpassam os territórios; 5) fortalecimento das ações em rede para a ativação da cidadania a partir do engajamento de jovens e suas famílias a favor da justiça e contra o genocídio negro; 6) Participação em fóruns regionais e Grupos de trabalho com o Ministério Público e Defensoria Pública.
Palavras-Chave: Redes sociais, território, genocídio, resistência, políticas de Segurança Pública, juventude negra
Ingrid Leão, Marisa Feffermann
Mestre e doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo. Atualmente é pesquisadora do Instituto de Saúde da SES/SP, da FLACSO - Brasil (Faculdade Latino Americana de Sociologia).
“Você pode mandar no grupo?”: reflexões sobre o uso de novas tecnologias da informação e comunicação em contextos de trabalho de agentes de segurança pública.
O crescente acesso às tecnologias da informação e comunicação (TIC’s), através dos mais variados aparelhos, tem dado novos contornos à noção de anonimato e privacidade, além de estar modificando as formas de interação social em diferentes escalas. No âmbito das instituições públicas o uso de tecnologias móveis para a troca de mensagens, fotos, documentos, entre outros, têm incrementado as dinâmicas do trabalho cotidiano, estabelecendo novos contornos aos saberes práticos dos profissionais. Na área de segurança pública a criação de novos softwares, projetados por setores públicos e privados, buscam atender diferentes finalidades; entre elas a incorporação de instrumentos que promovam práticas profissionais mais eficientes. Seus usos, nem sempre regulado normativamente, suscitam questões acerca das percepções acionadas - legais, sobretudo - quando a finalidade para a utilização desses instrumentos relacionam-se à prevenção e administração de conflitos. A pesquisa de campo, realizada através da observação do cotidiano de agentes do Programa Segurança Presente, em uma região do Rio de Janeiro, possibilitou a construção de dados que contribuem para reflexões acerca do uso de um aplicativo móvel, de troca de mensagens instantâneas, com a finalidade de promover a comunicação e a interação entre diferentes atores. Neste paper apresento a existência de diferentes interações promovidas pelo uso deste aplicativo, bem como as diversas finalidades para o qual seu uso é acionado - entre os quais o atendimento de demandas burocrática-administrativa. Focalizo a interação entre os agentes para realização de trabalhos do cotidiano, como instrumento de governança e como forma de ampliar o controle e a vigilância sobre as circularidades de sujeitos sociais e objetos no espaço estudado.
Palavras-Chave: Segurança Pública; Tecnologia da Comunicação e Informação; Estado em ação.
Karina de Paula
Mestranda em Antropologia no Programa de Pós Graduação em Antropologia da Universidade Federal Fluminense (PPGA/UFF), bacharel em Segurança Pública pelo Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos.
Legado dos megaeventos esportivos na governança da segurança
Este artigo busca contrastar duas hipóteses concorrentes sobre a adoção de ferramentas de manejo do risco em megaeventos esportivos. A primeira delas supõe um processo de isomorfismo, onde stakeholders optam por reproduzir estratégias e políticas experimentadas em outros lugares e adaptadas ao novo contexto. A hipótese concorrente supõe um certo hermetismo por parte das constelações políticas nacionais de tal forma que as ferramentas escolhidas para manejo do risco em tais eventos são elaboradas tendo em vista, sobretudo, experiências anteriores e do repertório prévio de agentes e instituições nacionais. A hipótese de isomorfismo destaca a relevância do posicionamento internacional dos anfitriões; levadas a adotar medidas familiares ao público internacional, as elites locais e nacionais optam por importar ferramentas de manejo de risco. A hipótese hermética não nega tais estímulos, mas questiona a real capacidade dos atores envolvidos no processo. A não-assimilação resultaria, segundo acadêmicos e entrevistados, da a) incapacidade institucional, incluindo mas não limitada à disponibilidade de recursos, e b) a diferença na natureza das ameaças percebidas. Defende-se o conceito de legado como estratégia de pesquisa. Definido como resultado de transformações estruturais, o legado é um passivo que precisa ser acionado. Assim, refletir sobre as transformações decorrentes de megaeventos esportivos na estrutura de governança deve incluir o momento posterior ao evento, apenas a partir do acionamento posterior pode-se indicar o real escopo. Cabe atentar-se à inclusão de novos atores na rede de governança, mas também à reorganização da rede preexistente, dado que esta por vezes é realizada à luz de um processo isomórfico.
Palavras-Chave: megaeventos; governança da segurança; isomorfismo institucional.
Lucas Damasceno Pereira
Graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo, Mestrando em Ciência Política pela mesma instituição.
Arranjos sociais em torno do tráfico de drogas na fronteira oeste do Mato Grosso: o caso “Superman Pancadão” e a simbiose entre o legal e ilegal
No ano de 2015, a partir de informações extraídas da investigação Operação Sentinela, o Ministério da Justiça aponta o caso “Superman Pancadão” como um conjunto organizacional de tráfico de drogas transfronteiriço que operava grandes transações financeiras em torno do tráfico de drogas e articulava redes formadas desde pequenos comerciantes a grandes pecuaristas da região oeste da fronteira do Mato Grosso. Esse caso é emblemático para compreender como esses arranjos, que operam entre o legal e o ilegal, atravessam não somente a economia local como as formas de sociabilidade e gestão de conflitos nessa região. Portanto, pretende-se analisar como arranjos sociais e neles seus múltiplos atores e atoras se articulam e produzem dinâmicas sociais torno do tráfico de drogas em cidades situadas na faixa da fronteira do oeste do Mato Grosso. Essa região, como já apontada por outros relatórios (BRASIL, 2010; 2015), é marcada por diversos arranjos ilegalismos e ilíticos penais, que formam um fluxo de circulação de riquezas entre Brasil e Bolívia. Parte-se da hipótese que arranjos, ao se incorporarem nos meios legais da economia local, não somente reconstroem a representação do que é ilegal como criam formas particulares de sociabilidade. O estudo de caso parte de três eixos metodológicos: análise das decisões monocráticas do STF sobre o caso (já realizadas); entrevistas com atores do setor de inteligência da Polícia Federal e com representantes da sociedade civil da região; e banco de dados de matérias de jornal entre os anos de 2015 a 2019 sobre o caso. Esse trabalho ainda dialoga com dados qualitativos dos relatórios Segurança Pública nas Fronteiras – arco central (BRASIL, 2016) e Condições de vida e vitimização no estado do Mato Grosso (BRASIL, 2010).
Palavras-Chave: Tráfico de drogas, ilegalismos, fronteira, estudo de caso.
Paula Pereira Gonçalves Alves
Professora assistente do curso de Direito da Universidade Estadual de Mato Grosso e nomeada no concurso para professora de Direito da Universidade Federal do Mato Grosso. Tem mestrado em Direito pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho.
Espaço Urbano e Controle Social: a construção do imaginário desviante na política de segurança pública da cidade de Pelotas /RS
O esvaziamento do sentido do cotidiano, apreendido pela automaticidade da vida, motiva transgressões ao regramento que os poderes estatais e os empreendedores morais tentam impor na administração das cidades. Em Pelotas/RS, o projeto “Pacto Pelotas pela Paz” condensa diversas medidas na tentativa de reduzir o número da criminalidade e controlar aglomerações humanas tidas como suspeitas ou incômodas ao marketing de "lei e ordem" que a cidade busca propagar. Seus eixos de atuação são policiamento, fiscalização, prevenção, vigilância e urbanismo. À vista disso, a pesquisa analisa o fenômeno de segregação do espaço urbano pelotense a partir de dois casos que ocorreram no início de 2019 na cidade: a poluição sonora na Rua Gonçalves Chaves em frente à Universidade Católica de Pelotas e a suspensão das atividades culturais no Mercado Central pela mesma razão. O trabalho transcorre através da descrição dos movimentos que frequentam os locais sob a perspectiva da Teoria da Subcultura de Albert Cohen, e do regramento e da mídia local através da Criminologia Cultural, que possibilita um estudo mais complexo do desvio com todos os seus significantes e significados. Como conclusão prévia ao estudo, que ainda está em desenvolvimento, tem-se que a construção do imaginário desviante perpassa a tentativa de término do encontro espontâneo e da retirada de cena do que Keith Hayward chama de “cidade-experiencial”. Aquelas pessoas que não assimilam o pacto, estão contra uma “cultura de paz” e, por essa razão, são rotuladas como delinquentes. Ainda assim, a criatividade humana disponibiliza meios para resistir a tais investidas por meio de ações contestatórias à ideologia de controle.
Palavras-Chave: Criminologia Cultural; Espaço Urbano; Segurança Pública; Desvio.
Pedro Henrique Farina Soares
Mestrando em Direito e Justiça Social pela Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus. Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pelotas (UCPEL).
A Segurança Pública em discursos conservadores: da "Bancada da Segurança" à "Bancada da Bala"
Este trabalho analisa as práticas e discursos da assim chamada “Bancada da Bala” na Assembleia Legislativa de São Paulo, enquanto dimensões do avanço de discursos e ações conservadoras em relação aos Direitos Humanos e à Segurança Pública. Como a inserção de policiais na política institucional não é um fenômeno novo, buscou-se problematizar essa categoria midiática e compreender a estruturação desses grupos com base em uma análise comparativa em diferentes contextos, com o objetivo de responder a seguinte questão: quais são os desdobramentos, atualizações e continuidades nas práticas e discursos de "deputados-policiais" sobre os temas da (in)segurança, direitos, crime e punição? Partindo da perspectiva de Michel Foucault sobre o discurso como principal ferramenta analítica de interpretação, investigou-se a atuação dos deputados da 18ª legislatura, por meio da pesquisa documental de proposições legislativas, sessões e frentes parlamentares, relatórios da Comissão de Segurança Pública e Comissão de Direitos Humanos. A seguir, esses discursos foram comparados aos da bibliografia que trata da "Bancada da Segurança", eleita pela primeira vez na 11ª legislatura.Dos resultados obtidos, constata-se que esses grupos apresentam uma trajetória de continuidade no debate sobre Direitos Humanos e controle da violência. Demonstra-se também como os deputados da 18ª legislatura reorganizam formas de conservadorismo no campo político e no âmbito de controle do crime, por intermédio de um discurso gerencialista da cidade como estratégico para o discurso do populismo penal, bem como pelo estabelecimento de conexões parciais com a frente parlamentar evangélica, em que o fortalecimento de instituições tradicionais e criminalização de condutas são eixos comuns de ação política.
Palavras-Chave: conservadorismo, análise de discurso, policiais na política, Direitos Humanos, Segurança Pública, Assembleia Legislativa de São Paulo.
Roberta Heleno Novello
Mestra em Sociologia pela Universidade de São Paulo e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência (NEV/USP).