Local: Sala do Google Meet
Minicurso online ministrado pelas doutorandas Floriza Beatriz de Sena Paula da Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP; e Silmária Reis dos Santos da Universidade Federal da Bahia - UFBA.
O que fazem os (as) historiadores (as) quando fazem História?
Parafraseando a interrogação que Marcello Assunção enxerga ter sido central para Clóvis Moura em As injustiças de Clio (ASSUNÇÃO, 2022, p. 239), ressaltamos e buscamos trazer para o debate mais uma dificuldade a ser encarada no ensino e a pesquisa histórica nas subdisciplinas Teoria da História e História da Historiografia. Pensar essas duas subdisciplinas no quadro das relações étnico-raciais é algo ainda bastante recente, mas há trabalhos que têm apontado essa demanda, a exemplo de Marcello Assunção (2019, 2022, 2023), Marcello Assunção; Pereira; Barbosa; Fernando Baldraia; Rodrigues (2023), Marcello Assunção; Allan Kardec Pereira; Felipe Oliveira; Lídia Generoso (2019), Charlisson Andrade; Petrônio Domingues (2023), Juliana Souza (2023), Marcello Assunção, Rafael Trapp (2023), Pereira (2019, 2022).
Esses (as) teóricos (as) estão circulando pela academia e público amplo, e em comum ponto trazem a necessidade de viabilizarmos mais da branquitude que opera as estruturas de poder brasileira, como na educação, política, mídia hegemônica, geoculturas de prestígio, em especial na elaboração e prática das políticas do tempo presente.
Com relação às políticas do tempo, autores (as) como Dussel (1993, 2005, 2016), Quijano (2005a, 2005b), Mudrovic (2018, 2019), Freixo (2019), Marcello (2023), Bevernage (2018) Walderez (2021) tematizam em seus trabalhos a urgência de reafirmarmos a dimensão do comportamento como efetivamente plural, diverso, apesar de haver uma memória disciplinar que hierarquiza as geopolíticas do conhecimento, e as moraliza em pensamentos fronteiriços e de margem “bons” e “desprezíveis”. (Mignolo, 2017; hooks, 2019)
E isso deve-se à emergência de um número significativo de estudantes racializados (as) nas universidades públicas após a disputada lei de cotas (Lei nº 12.711/2012), bem como a luta frequente dos movimentos sociais desde o século XX, inspirados(as) nas lutas ancestrais, como salienta vários(as) pesquisadores(as) brasileiros(as), dentre eles(as) Nilma Gomes (2010), Lélia Gonzalez (2018), Beatriz Nascimento (2018), Petrônio Domingues (2005), Abdias Nascimento (1980), Clóvis Moura (1959a, 1959b, 1964, 1990), Kabengele Munanga (1999). Lutas essas que estavam sendo acadêmicas, políticas, intelectuais, de militância e vividas, racializadas por essência e racializantes. Todas essas transformações, de início deste século, têm sido fundamentais para a reflexão do campo da História no Brasil.
A Lei nº. 14.038, de 17 de agosto de 2020, que dispõe sobre a regulamentação da profissão de Historiador, trouxe importantes adendos em fortalecimento para a comunidade historiadora. Somente em 2020 houve a regulamentação da profissão do (a) historiador (a), passa-se a ser reconhecido (a) como profissional somente quem tem alguma formação na área e formação acadêmica, ou que tenha trabalhado diretamente com esta nos últimos 5 anos à Lei. A comunidade buscava a regulamentação profissional desde 1986.
Mas, apesar dos desenhos que buscam maior qualidade de trabalho e devidamente enquanto profissionais, devemos pensar também na reciprocidade da produção e circulação do conhecimento para além do modo oficial-acadêmico de ser.
Em contexto de comemoração aos 20 anos da aplicação da Lei nº 10.639/2003 (e posteriormente a criação da Lei nº 11.645), bem como as demandas e dificuldades que permeiam a sua aplicabilidade na cultura educacional do Brasil, ressaltamos e buscamos trazer para o debate mais uma dificuldade a ser encarada na pesquisa histórica nas subdisciplinas Teoria da História e História da Historiografia.
Se tratando das subdisciplinas aqui envolvidas, o Simpósio temático se propõe refletir sobre tópicos como a (in)disciplinarização do cânone historiográfica, história oficiosa, giro-linguístico, geopolítica do conhecimento, autorias, públicos e circulação do conhecimento, políticas do tempo, discurso histórico, intelectualidade, elementos tematizados também por Valdei Araujo (2003, 2006, 2011, 2013, 2015, 2019), Thamara Rodrigues (2021), Walderez Ramalho (2023), Rodrigo Turin (2022), Fernando Nicolazzi (2019), Jurandir Malerba (2014), Marcello Abreu; Guilherme Bianchi; Mateus Pereira (2018), Temístocles Cezar (2018), Fernando Ávila, Wagner Geminiano (2018), Avila; Nicolazzi, Turin (2019).
Logo, sentimos a dificuldade de pesquisas e pesquisadores (as) em abordar as relações étnico-raciais na Teoria da História e na História da Historiografia. Pensando nisso, objetivamos neste Minicurso dialogar diretamente com questões étnico-raciais em diferentes perspectivas históricas, sejam elas no âmbito do ensino de história, estudos de trajetórias e biografias, ensino de história indígena, cabocla, ribeirinha, comunidade LGBTQIAPN+, de gênero e todos os mais variados temas vividos, pois entendemos que essas propostas de pesquisas diferentes da acadêmica-normativa possam ser basilares na compreensão e crítica às subdisciplinas aqui tratadas. Em outras palavras, as pesquisas que abordam questões étnico-raciais no Brasil, podem ser ponto de partida e de chegada para as mudanças nas subdisciplinas de Teoria da História e História da Historiografia.
Sendo assim, o curso pretende-se Extensivo, e divide-se em 4 partes, sendo:
1. Introdução aos estudos étnico-raciais no Brasil em relação à Teoria da História e na História da Historiografia;
2. As pesquisas contemporâneas em torno da Teoria da História e na História da Historiografia;
3. Demandas dos Movimentos Sociais Negros, intra e extra-acadêmicas. O século XX como um tempo histórico intenso e disputado;
4. Leis voltadas à pauta étnico-raciais no século XXI. Disciplinarização e regularização da História; O que fazem contemporaeamente os (as) historiadores (as) quando fazem História?
NOTA 1: A versão mais recente da lei de cotas é a Lei nº 14.723/2023, que reformula e amplia o atual sistema de cotas. Sobre ações afirmativas e lei de cotas, consultar: SANTOS (2014, 2015, 2018). O tema das cotas, em específico as cotas raciais ganhou amplitude nas mídias mais amplas no início dos anos dois mil, juntamente com vastas publicações acadêmicas que se dividia no debate entre pró-cotas ou contrário à política. Sobre o debate, consultar: Fry (2007), Kamel (2006), Sodré (2015), Moya (2014), Martins (2018), Oliva (2019), Manifesto em Defesa das cotas/Geledés (2008), Manifesto Contra as cotas/UOL (2006), Anticotas no Brasil (2023).