Breves considerações acerca das Viagens a Inhomirim

  • Autor
  • Jacqueline de Moura Siano (Jac Siano)
  • Resumo
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    BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DAS VIAGENS A INHOMIRIM

     

     

    RESUMO

    Exponho neste ensaio um breve relato sobre encontros e descobertas acontecidas na localidade de Vila Inhomirim, 6º distrito de Magé, região que guarda parte de nossa memória histórica e se reveste de abandonos e de esquecimentos. A fim de vivenciar a experiência de uma artista viajante local, adotei os deslocamentos como viagem como forma e metodologia para a construção de trabalhos que visam provocar fricções nos modos habituais de lidar com as paisagens do cotidiano.

     

    Palavras-chave: paisagem, memória, história, esquecimento

     

    Tomando como ponto de partida o embate com algumas pranchas do álbum “Viagem Pitoresca através do Brasil” (1835), do artista viajante Johann Moritz Rugendas, associado à minha prática de artista viajante local, ao longo de três anos consegui realizar algumas edições das “Viagens a Inhomirim”, região também conhecida como Raiz da Serra, 6º distrito de Magé, a fim de pesquisar os rastros de antigas movimentações ali acontecidas. [1]

     

    Trata-se de uma proposição de deslocamento como viagem, feita a grupos de amigos e colegas de pesquisa, com o intuito de promover uma aproximação com a memória das expedições naturalistas acontecidas no Brasil durante o século XIX. Naquela região o médico e naturalista Georg von Langsdorff adquiriu a Fazenda Mandioca e nela construiu um efervescente centro de pesquisa que contava com um herbário e farta biblioteca, onde recebia outros naturalistas e viajantes. Também constava de seus planos a implantação de um projeto de colonização agrícola germânica que nunca prosperou. A própria “Expedição Langsdorff” (1822-1829), empreendida pelo naturalista ao interior do Brasil correu cheia de atropelos e incidentes, inclusive um fatal que resultou na morte do artista Adrien-Aimée Taunay. No final da viagem, já na Amazônia, Langsdorff muito doente e com transtornos mentais, retorna para a Alemanha onde permanece esquecido até a sua morte. O material coletado pela expedição e enviado para a Rússia, depois de disputas entre instituições de pesquisa, é abandonado por cem anos num porão da Academia de Ciências de São Petersburgo, vindo a ser parcialmente resgatado por brasileiros nos anos da década de 1930.[2]

     

    No Brasil, ainda no século XIX, a memória de Langsdorff também sofre um processo de difamação e de apagamento. A Mandioca é abandonada sobrando atualmente alguns restos de um projeto ambicioso. Ruínas divididas por uma rua que esconde sobre o asfalto partes inacessíveis que conectam os dois núcleos familiares que divergem sobre os modos de ocupação e opiniões sobre a preservação da memória do lugar. De um lado, sobre um antigo porão, ergue-se a casa de uma família. Do outro lado, escondida sob o capim aflora uma mureta de pedras e uma canaleta esculpida em granito que permanecem no aguardo de futuro tombamento ou projeto de ponto de cultura sonhado por uma das moradoras do sítio.

     

    A passagem dos personagens que compõem o quadro da história das ciências naturais e da arte, associada aos rastros da presença da mão de obra escravizada e sua presença imanente no sofisticado trabalho de entalhe das pedras encontradas nos sítios históricos da região como no calçamento do Caminho Novo (monumento histórico que ladeia o sítio da Mandioca), por exemplo, não merecem perecer no esquecimento, muito pelo contrário. Mas como proceder com ao acionamento de um espaço ocupado por pessoas que há gerações habitam o sítio histórico, sem que elas sejam ameaçadas em seu direito à moradia? Como abandonar o contributo da apropriação da memória coletiva como parte de um processo de resgate cidadão e de fortalecimento de laços afetivos com o lugar onde se vive?

     

    Um dos caminhos possíveis aponta para a participação coletiva e voluntária da comunidade. Um primeiro passo depende da colaboração daquelas pessoas residentes no sítio e de seus interesses para tal acionamento, daí então poderá discutir-se em conjunto estratégias para um despertar da população que ainda desconhece a potencialidade da região; tanto no que diz respeito à memória histórica quanto à recuperação de mitologias e lendas locais que juntas, poderão constituir uma nova visão de desenvolvimento e progresso social baseada na valorização das narrativas locais. Também a questão da preservação do meio ambiente natural se faz relevante, já que a região ainda guarda parte da floresta atlântica.

     

    Não se trata portanto de resgatar a história da colonização e da ocupação do solo por estrangeiros, mas de promover o acesso à informação e dar voz a quem sofre de silenciamento por tantos anos. Ao inserir Vila Inhomirim num circuito cultural amplo (artístico, de estudos do meio ambiente e de turístico ecológico) procura-se despertar o interesse para uma região que vive à margem da grande narrativa história. O fortalecimento da população local poderá por fim, proporcionar a reescrita de uma história que a todos pertence.

     

    Referências Bibliográficas

    BECHER, Hans. O barão Georg Heinrich von Langsdorff: pesquisa de um cientista alemão no século XIX. São Paulo: Edições Diá: Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília, 1990.

    COSTA, Maria de Fátima. Viajando nos bastidores: documentos de viagem da expedição Langsdorff. Cuiabá, MT: EdUFMT, 1995.

    GUATTARI, Félix. As três ecologias. Campinas, SP: Papirus, 2012.

    SÜSSEKIND, Flora. A ciência da viagem. In: O Brasil não é longe daqui: o narrador a viagem. São Paulo: Companhia das Letras, 1990, pp. 104-128.

     


    [1] Devido à pandemia do novo coronavírus as “Viagens a Inhomirim” encontram-se temporariamente suspensas.

     

    [2] Para os “Diários de Langsdorff” acessar http://static.scielo.org/scielobooks/q5cc4/pdf/silva-9788575412442.pdf Acesso em: 03 nov. 2020.

     

     

  • Palavras-chave
  • paisagem, memória, história, esquecimento
  • Área Temática
  • ST 04 - Periferia é Centro: processos artísticos e culturais em contramão
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O IFRJ campus Belford Roxo promove, anualmente, a Semana Acadêmica do IFRJ campus Belford Roxo, que conta com palestras, mesas redondas, oficinas, minicursos, apresentações artísticas e culturais, além dos resultados de trabalhos desenvolvidos ao longo dos cursos oferecidos no referido campus. O evento costuma acontecer concomitantemente à Semana Nacional de Ciência, Tecnologia e Economia Criativa.

Dentro da Semana Acadêmica, ocorre, ainda, o Encontro de Pesquisadores, momento em que os servidores atuantes no campus Belford Roxo apresentam os resultados de seu trabalho, conectando pesquisa, ensino e extensão.

No ano de 2020, de 19/10 a 23/10, ocorreram a 3a. Semana Acadêmica do IFRJ campus Belford Roxo e a Semana Nacional de Ciência, Tecnologia e Economia Criativa. Ainda compondo os eventos, de 16/11 a 18/11, ocorreu o 3º. Encontro de Pesquisadores do IFRJ campus Belford Roxo. Com o isolamento social decorrente da pandemia do COVID-19, foi a primeira vez que os eventos aconteceram totalmente online. Também foi a primeira vez em que as submissões de trabalhos foram abertas aos pesquisadores de outras instituições e aos estudantes, movimento que só foi possível em razão da expertise adquirida com a realização dos eventos em anos anteriores.

Com o tema “Baixada Fluminense Presente! Diálogos entre Educação, cultura e Arte”, estudantes e profissionais, preferencialmente atuantes na Baixada Fluminense, puderam submeter seus resumos estruturados e/ou relatos de experiências. Estes trabalhos submetidos foram organizados e apresentados em quatro Simpósios Temáticos:

O ST 01 - Direitos humanos, culturas e identidades, coordenado pela professoras Heloisa Santos, Lívia Paiva e em parceria com a coordenadora do ST 06, Jaqueline Gomes recebeu trabalhos que discutiam as questões de gênero, raça e classe, a partir de uma perspectiva crítica que avaliasse o sexismo, o machismo, a lgbtfobia, o racismo e o classismo como violações dos direitos humanos. Considerando tais elementos, trabalhos que abordassem estas questões, especialmente a partir de uma perspectiva interseccional, eram de interesse deste ST, seja em uma perspectiva teórica, seja por meio de trabalhos que trouxessem resultados de práticas educativas, ativistas, artísticas, dentre outras formas de abordar a luta pelos direitos no mundo contemporâneo, especialmente aqueles que buscavam estabelecer diálogos que se voltem para o Eixo Sul-Sul.

O ST 02 - Gestão, design, moda e carnaval, coordenado pelos professores Flávio Sabrá, André Dias em parceria com a coordenadora do ST 06, Cássia Mousinho, se propôs a ser um espaço para a discussão e reflexão crítica de questões relacionadas às práticas de gestão e negócios no campo da moda, carnaval e festejos, observando sua relação com design, arte, vestuário, artesanato, modelagem, administração e as suas interlocuções entre o processo criativo, produtivo, distributivo e de validação dentro da Cadeia Têxtil/Confecção e da Economia Criativa, seja em trocas formais ou informais.

O ST 03 - Cidades, territórios, culturas e educação, coordenado pelas professoras Gabriela Ribeiro e Bárbara Friaça, abordou trabalhos que traziam o debate sobre cidades, territórios e as vivências deles e neles, intermediadas por diversas vertentes culturais e educacionais (artesanato, moda, culinária, acervos de espaços de cultura e memória, patrimônio cultural, espaços culturais, espaços de lazer, urbanismo, design, educação formal, não formal e informal, entre outros). Também recebeu trabalhos que discutiam sobre inclusão social, entendendo que possibilitar acesso e usufruto amplos e irrestritos aos espaços citadinos contribuem para o incremento da inclusão social, propiciando uma formação holística às pessoas, nos âmbitos cultural, social, educacional, de lazer, de desporto, entre outros.

O ST 04 - Periferia é Centro: processos artísticos e culturais em contramão, coordenado pelas professoras Ana Adelaide Balthar e Lucia Vignoli, buscava discutir como os rearranjos espaciais reverberam nas produções artísticas culturais das periferias urbanas frente a questão do distanciamento social devido a pandemia de COVID-19. “Reinventamos e experimentamos existências bidimensionais, através de dispositivos digitais. Telas de telas. Os deslocamentos se restringiram, mas os encontros se constelaram. De repente, a Baixada não sofre de lonjura, de repente a periferia é centro”.

O ST 05 - Corpos, diversidades, identidades e culturas, coordenado pela professora Jaqueline Gomes, objetivava fomentar, em um ambiente complexo, a inclusão de pessoas oriundas de diferentes grupos sociais. Recebia trabalhos que promovessem investigações e propostas de intervenção, considerando os corpos em suas possibilidades na cultura das aparências. 

O ST 06 - Design, artesanato e tecnologia, coordenado pela professora Cassia Mousinho, buscava fomentar a análise do trabalho artesanal, através de seus aspectos estéticos, técnicos, mercadológicos e sociais. Também pretendia reforçar a importância do desenvolvimento de tecnologias e os artefatos a elas associados no âmbito material ou digital, realizando uma ponte entre o artesanato e o design.

Estes Anais são resultantes dos trabalhos aprovados e apresentados no 3º. Encontro de Pesquisadores do IFRJ campus Belford Roxo. É uma das nossas contribuições para a reafirmação da Baixada Fluminense enquanto território potente cultural, artística e educacionalmente.

Boa leitura!

  • ST 01 - Direitos humanos, culturas e identidades: gênero/gêneros
  • ST 02 - Gestão, design, moda e carnaval
  • ST 03 - Cidades, territórios, culturas e educação
  • ST 04 - Periferia é Centro: processos artísticos e culturais em contramão
  • ST 05 - Corpos, diversidades, identidades e culturas
  • ST 06 - Design, artesanato e tecnologia

3º Encontro de Pesquisadores - IFRJ/Campus Belford Roxo

Comissão Organizadora

Docentes

Heloisa Helena de Oliveira Santos - Coordenadora de Extensão, Pesquisa e Pós-Graduação
André Monte Pereira Dias
Flávio Glória Caminada Sabrá
Gabriela Sousa Ribeiro
Lucivania Filomeno Ponte

 

Estudantes
Sara Canto
Gregory Andrade

Comissão Científica

Alicia Romero - UNESA

Ana Adelaide Lyra Porto Balthar - Nena Balthar

André Monte Pereira Dias

Bárbara Boaventura Friaça

Cassia Mousinho de Figueiredo

Charles Leite - UFPE

Denise Loyla Silva

Flávio Glória Caminada Sabrá

Gabriela Sousa Ribeiro

Heloisa Helena de Oliveira Santos

Jaqueline Gomes de Jesus

Lívia de Meira Lima Paiva

Lucivania Filomeno Ponte

Maria Lucia Vignoli Rodrigues de Moraes - INES

Vanessa Santos Ximenes

 

Reitor

Raphael Barreto Almada

Pró-reitora de Extensão

Ana Luisa Lima

Diretor de Implantação - Campus Belford Roxo

Marcio Franklin de Oliveira

Diretora de Ensino

Rosi Marina Rezende

Coordenação de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação do Campus Belford Roxo: extensao.cbel@ifrj.edu.br