O Encontro de Sociolinguística é um fórum privilegiado e consolidado para a socialização das pesquisas sociolinguísticas, seja de natureza descritiva ou aplicada. Nesta 11ª edição, ainda de forma remota, com o tema A Sociolinguística no Nordeste, buscamos evidenciar ainda mais as pesquisas desenvolvidas em nossa região, com uma programação diversificada.
Foram aceitos trabalhos de diversos lugares com pesquisas desenvolvidas em uma das seguintes áreas: Geossociolinguística, Sociofuncionalismo, Sociolinguística de Contato, Sociolinguística Educacional, Sociolinguística Histórica, Sociolinguística Interacional, Sociolinguística Perceptual e Sociolinguística Variacionista.
Aline Gomes (UNEB)
Cristina Carvalho (UNEB)
Norma Lopes (UNEB)
Norma Lúcia Almeida (UEFS)
Pedro Daniel Souza (UNEB)
Raquel Freitag (UFS)
Silvana Araújo (UEFS)
Valter Dias (IFBA)
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Área de submissãoAbertura Abertura
Conferência Conferência · Claudia Roberta Tavares Silva
Sociolinguística Variacionista Mesa-redonda · Elyne Giselle de Santana Lima Aguiar Vitório, Hebe Macedo de Carvalho, Wendel Silva dos Santos
Políticas linguísticas na África Lusófona e o ensino do português Minicurso · Alexandre António Timbane
Sociolinguística Histórica Mesa-redonda · Huda da Silva Santiago, Lécio Barbosa de Assis, Valéria Severina Gomes
Sociofuncionalismo Mesa-redonda · Camilo Rosa Silva, Gessilene Silveira Kanthack, Valéria Viana Sousa
Sessões de Comunicação Apresentação Oral
Políticas linguísticas na África Lusófona e o ensino do português Minicurso · Alexandre António Timbane
Sessões de Comunicação Apresentação Oral
Sociolinguística e Ensino Mesa-redonda · Eliane Vitorino de Moura Oliveira, Gredson dos Santos, Juliene Lopes Ribeiro Pedrosa
Encerramento Encerramento
Por favor, descreva abaixo a razão da sua denúncia.
Na lusofonia se fala em língua portuguesa, doravante LP, como língua oficial, embora não seja a língua da maioria. Na África, os países que falam a LP são chamados de PALOP - Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, sendo ela a segunda ou terceira língua para a grande parte da população. A LP chegou com o processo da colonização portuguesa. À medida que o tempo passou e, sobretudo, após as proclamações das independências (nos anos 70), essa língua adquiriu novas características resultantes do contato entre o português e as diversas línguas africanas. Essa variação do português ganhou cada vez mais características próprias, distanciando em grande medida da variedade europeia do português. A LP fala na África resulta da soma de variedades, de normas, inclusive algumas delas são consideradas privilegiadas, enquanto outras são excluídas de forma preconceituosa. Não existe uma única forma de falar português e todas as formas são legítimas para as comunidades de fala. Neste minicurso, pretende-se debater as políticas linguísticas e o planejamento dos seis PALOP olhando para a necessidade urgente da criação de gramáticas e dicionários que possam realmente descrever, escancarar e registrar as variedades africanas do português. A metodologia do minicurso consistirá na leitura antecipada dos textos que servirão de fonte das discussões. Os debates no curso facilitarão a consolidação dos conteúdos. Espera-se que os participantes consigam debater os conceitos de variedade, variante, língua em contato e norma, além de conhecerem a situação sociolinguística dos PALOP e das políticas linguísticas vigentes.
O Sociofuncionalismo consiste na investigação de fenômenos de variação e mudança linguística, valendo-se de aportes da Teoria da Variação e Mudança e do Funcionalismo Linguístico. São as seguintes as questões que guiam a presente proposta de discussão: i) é possível defender uma convergência plena entre teorias funcionalistas e a sociolinguística variacionista? ii) é razoável a defesa de uma terceira via de análise que aglutine princípios e pressupostos de ambas as perspectivas? e iii) a abordagem calcada na interface teórica tem sido produtiva no Brasil? Desse modo, nosso objetivo é considerar as convergências possíveis entre os arcabouços dessas duas vertentes teóricas, refletindo sobre uma pretendida interface. Além disso, tentamos mapear a produtividade de pesquisas realizadas no Brasil a partir da citada perspectiva sociofuncionalista.
Através de uma retrospectiva histórica da Sociolinguística no Brasil, esta conferência objetiva não só situar, mas também, e primordialmente, discutir o processo de consolidação dos estudos sociolinguísticos desenvolvidos no Nordeste, tendo em mente seus contributos e prospectivas advindos de um agenda de trabalho comprometida desde sempre em compreender, sob a ótica da intrínseca relação língua-sociedade (Labov, 2008 [1972]), a constituição dos diferentes falares nordestinos a partir da descrição e sistematização da variação linguística que lhes é inerente. Visando ampliar a discussão aqui proposta sobre a ininterrupta e desafiadora construção do mapeamento sociolinguístico desses falares, serão abordadas também as inegáveis contribuições dos estudos dialetológicos (cf. Cardoso, 1998; Aragão, 1999, 2000; 2014; Alencar, 2011; Sá, 2011; Paim, 2012; Ramos, 2016; Paes & Paim, 2018; Costa, 2021, dentre outros). É fato que, diante das inúmeras investigações sociolinguísticas já realizadas nessa região sobre os usos linguísticos produzidos em diferentes modalidades da língua (cf. Lucchesi, Baxter & Ribeiro, 2009; Hora & Aquino, 2012; Sedrins & Sá, 2015; Araújo & Freitag, 2016; Lopes; Oliveira & Parcero, 2017; Araújo, Viana & Pereira, 2018; Santana, Araújo & Freitag, 2018; Nunes & Silva, 2021, dentre outros) e sobre as crenças e atitudes linguísticas dos falantes diante desses usos (cf. Aguilera, 2008; Cardoso, 2015; Freitag, 2016; Freitag et. al. 2016; Hora, 2018; Vitório, 2021; Pereira, 2021, dentre outros), a agenda de trabalho não se esgota, mas abre espaço para novas reflexões, apontando para a necessidade de, por exemplo: (a) novos empreendimentos no campo da documentação linguística, (b) ampliação da descrição dos múltiplos usos da língua d’além das capitais dos estados nordestinos e (c) realização de estudos adicionais sobre crenças e atitudes linguísticas e sobre o ensino da variação e mudança linguística.
Desde a origem, a expressão linguística do brasileiro sofre pressões de entidades hegemônicas. O “Diretório dos Índios”, lei formulada pelo ministro da Coroa Portuguesa, Marques de Pombal, foi a primeiro grande “genocídio” da identidade linguística nacional. A língua geral e as demais línguas faladas na então colônia passaram a ser proibidas, com a imposição do Português como única possibilidade, sobretudo no ensino. Reflexões diversas apontam que começa, aí, a problemática que se apresenta até hoje: a norma (ou variedade) comumente praticada pelos brasileiros não é a que a escola apresenta. Por isso, a necessidade de olhar para o ensino de Língua Portuguesa com lentes “sociolinguísticas”: quando, onde, com quem e como falamos ou escrevemos é crucial para a norma (ou variedade) pela qual nos expressaremos. Nesta fala, tratarei um pouco disso, passeando pelas trilhas da Sociolinguística Educacional, acompanhada por autores como Bortoni-Ricardo, Faraco, Bagno, entre outros que vêm caminhando por estas vias. Objetivo, com isso, ampliar a reflexão sobre formas de ensinar essa língua que é nossa identidade, sobre o papel da escola na afirmação ou negação da “cara sociolinguística” dos alunos, usando termo de Faraco (2008), abordando, para isso, a proposta de Bortoni-Ricardo (2004) para a análise do PB, ou seja, a alocação de falantes em línguas imaginárias, às quais ela dá o nome de contínuos.
Pesquisas realizadas sob o arcabouço teórico-metodológico da Teoria da Variação e Mudança Linguística (LABOV, 2008 [1972]) têm permitido, desde a década de 1970, descrever diferentes fenômenos linguísticos variáveis em diversas variedades do português, contribuindo para a descrição de uma norma linguística brasileira. Um fenômeno que tem sido amplamente estudado é a representação da segunda pessoa do singular na função de sujeito (SCHERRE et al., 2015; LOPES et al., 2018), que tende a ser condicionada por fatores linguísticos, sociais, pragmáticos, históricos e geográficos (COUTO; LOPES, 2011). Com a publicação do texto Variação dos pronomes “tu” e “você”, de Scherre et al. (2015), que tem como um dos objetivos mapear a variação tu, você, cê e ocê nas diferentes regiões brasileiras, instigou-nos o fato do estado de Alagoas fazer parte das áreas não mapeadas por não haver informação disponível ou suficiente sobre o uso desses pronomes. Tentando suprir essa lacuna, propomos, no âmbito da UFAL, projetos de pesquisa que contemplavam a variação tu e você na função de sujeito em diferentes comunidades situadas na capital, no agreste e no sertão de Alagoas. Neste trabalho, descrevemos o estado da variação tu e você na função de sujeito na fala alagoana. Para tanto, consideramos as pesquisas de Tenório (2002), Cardoso (2008), Silva e Vitório (2017), Vitório (2018, 2019, 2021), Silva (2019), Silva (2020), Divino (2020) e Vitório e Silva (2021), que têm mostrado, nos termos de Scherre, Andrade e Catão (2020), a predominância de duas construções pronominais: o macro VOCÊ e tu sem concordância. Nas comunidades alagoanas, você é a variante selecionada, com o pronome tu sem concordância apresentando parcas realizações, principalmente em entrevistas sociolinguísticas. Também retornamos aos dados de Vitório (2018) e Vitório e Silva (2021) e mostramos que tu sem concordância é uma variante associada a situações que socialmente são vistas como solidárias, igualitárias e familiares. O comportamento variável de tu e você tem indicado uma variação que apresenta nuances interacionais, mostrando que o tipo de coleta interfere no percentual de uso de tu. Por fim, apresentamos uma agenda de trabalho para melhor compreensão do fenômeno em estudo, através de estudos de produção, tanto sincrônicos quanto diacrônicos, e estudos de avaliação e percepção.
Destacaremos contribuições para o ensino da variabilidade funcional, uma propriedade que nos permite compreender a mudança linguística (em especial, a gramaticalização) como um processo de regularização de uso da língua.
Pretende-se discutir, em perspectiva histórica e crítica, as contribuições que a Sociolinguística brasileira tem dado ao ensino de língua portuguesa. Numa primeira parte, argumentaremos que, desde seus anos iniciais (Cf. LABOV, 1972; 1974), a Sociolinguística possui uma face pedagógica, o que mostra que uma “sociolinguística educacional” não é um campo novo na história da disciplina. Num segundo momento, discutiremos o impacto dos estudos da Sociolinguística brasileira para o ensino de língua portuguesa, especialmente quanto à questão da variação linguística, considerando mormente a educação básica em escolas públicas e destacando o papel de publicações importantes no Brasil, a exemplo de Bortoni-Ricardo (2004), Gorski e Coelho (2006), Zilles e Faraco (2015) e Martins, Vieira e Tavares (2016). Numa terceira seção, destacaremos que a Sociolinguística brasileira ofereceu contribuições ao ensino de português que podem ser colocadas como situadas nos campos descritivo, conceitual e pedagógico. Finalmente, colocamos em cena alguns desafios para a Sociolinguística brasileira no que tange à aplicação escolar de seus achados teóricos e descritivos.
Estudos sobre a concordância verbal com as formas pronominais nós e a gente no português do Brasil têm sido desenvolvidos ao longo dos últimos 37 anos por diferentes grupos de pesquisa, em diferentes regiões do país, sob o viés da Sociolinguística Variacionista (Vianna; Lopes, 2015, p. 109), incluindo pesquisas com dados de fala da região Nordeste (Álban; Freitas, 1991; Fernandes, 1997; Ramos et al, 2006; Mendes, 2007; Araújo, 2016; Freitag, 2016; Feitosa; Vitório, 2018; Silva, 2020 – para citar apenas alguns estudos). O trabalho a ser apresentado traz resultados da produção da concordância verbal com sujeitos da sentença nós e a gente, por falantes de Fortaleza com escolarização até o ensino médio. Em termos de proporção, das 374 observações, 68,4% (n=256) são de concordância associada ao pronome a gente e 23% (n=86) de concordância verbal com nós (nós cantamos/nós brincamos). Foram observadas 8,02% (n=30) de concordância singular com a forma nós (nós canta/nós brinca) e 0,53% (n=2) de a gente com o verbo da sentença no plural (a gente cantamos/a gente brincamos), mostrando tendência da comunidade de fala, em termos de frequência, à concordância verbal padrão. Sob a lente da flutuação, observa-se que a forma a gente é a mais frequente na amostra (74,9%), restando ao cânone nós 25,1% das ocorrências, tendência já atestada em estudos variacionistas do português brasileiro, refletindo o encaixamento linguístico dessa variação. Os dados de fala são dos anos de 1980 – coletados da base de dados do projeto Dialetos Sociais Cearenses (DSC), disponível em https://profala.ufc.br/pt/projeto-dialetos- sociais-cearenses. Pretende-se ainda discorrer, nessa apresentação, sobre outra etapa do estudo centrada na análise de percepção dessas variantes, estimulada por contextos de concordância verbal, replicando técnicas de testes inspiradas em Lambert et al. (1960), Campbell_Kibler (2009) e Oushiro (2015). Os testes foram disponibilizados pela plataforma Google forms, divulgados nas redes sociais WhatsApp, Telegram, Facebook, Instagram e Twitter e compartilhados entre amigos de amigos. A pergunta que se faz é em que medida essa variável de natureza morfossintática evoca comportamentos avaliativos (Labov, 2008 [1972], p. 176), bem como reflete um conjunto “uniforme” de crenças e atitudes compartilhado pelos membros da comunidade de fala em estudo. Os resultados dos 177 formulários respondidos indicam, em termos de proporção apenas (R Core Team, 2020), que os falantes percebem o nós como forma de prestígio, de uso formal e escolarizado, de bairros centrais da cidade. A variante a gente é avaliada como de uso informal, escolarizado, de periferia urbana e de bairros centrais. Os participantes do estudo reconhecem esses usos como correntes em suas falas, sem indícios de estigma por parte desse time de graduandos/graduados; a rejeição, contudo, é explícita quando estimulados a responder sobre a ausência de concordância verbal (nós come/nós dorme), refletindo estudos de produção com dados do português brasileiro (Scherre; Naro, 2014; Carvalho, 1997) que mostram estar a concordância verbal ou nominal associada à escolarização dos falantes. Esses resultados se alinham a estudos de percepção que demonstram ser a variação na 1ª pessoa do plural “razoavelmente sensível à avaliação social” (Freitag, 2016, p. 890), bem como confirmam a existência de padrões de crenças compartilhados pelos falantes de determinada comunidade de fala.
A adoção de alguns dos princípios da Sociolinguística de orientação laboviana (2006 [1968]) para uma aproximação aos fenômenos linguísticos de sincronias pretéritas tem resultado em trabalhos que contribuem para uma melhor descrição da constituição histórica do português brasileiro, ao tempo que também são trabalhos que evidenciam os desafios relacionados a essa tarefa, instituindo um perfil próprio a esse campo. Na Bahia, muitas vezes sob o rótulo de linguística sócio-histórica, principalmente pela influência de Mattos e Silva (1998, 2004), estudos na perspectiva de uma Sociolinguística Histórica (ROMAINE, 1982; CONDE SILVESTRE, 2007) têm enfrentado os desafios, por exemplo, de localização e constituição de corpora escritos que sejam representativos, de identificar o perfil dos escreventes e de estabelecer os fatores sociais relacionados à comunidade da qual faziam parte. O objetivo, nesta apresentação, é discutir sobre alguns desses enfretamentos e sobre os avanços conquistados, principalmente no que se refere ao tratamento metodológico dos corpora utilizados.
Em 1968, Weinreich, Labov, Herzog questionaram a relação indissociável de unidade e sistematicidade, reforçando que a variação linguística é sistemática e passível de observação. A partir desse pressuposto, surgem as pesquisas sob a metodologia variacionista, a exemplo das desenvolvidas por Labov (1966, 1972, 1994, 2001). Entender que a língua é variável e ao mesmo tempo sistemática foi um grande avanço, pois permitiu o mapeamento da língua como um todo, levando em consideração aspectos linguísticos homogêneos e heterogêneos. E esse novo olhar é indispensável nas salas de aula da educação básica, afinal cabe ao/à docente dar condições aos/às discentes de entender e fazer uso de sua língua de forma proficiente nos mais diferentes contextos. É importante que o/a discente compreenda cada situação de uso e o que cada variante representa naquela situação. Ultrapassa, dessa forma, o conhecimento das variantes, pois adentra na função social que estas possuem. Na fonologia, por exemplo, é importante identificar quais processos variáveis precisam ser trabalhados em sala de aula para dar melhores condições de discentes em fase de aquisição de escrita, seja inicial ou não, compreenderem melhor o sistema variável da língua e as possíveis interferências na escrita, a exemplo da variação das consoantes /l/ e /R/ em posição de coda: maltratado ? [‘mawtratadu] → “mautratado”; remorso ? [remosu] → “remoço”, e dos processos de ditongação e monotongação: vez ? [‘vejs] → “veis”; banheiro ? [‘bãneru] → “bainhero” (PEDROSA, 2014). Reforçando essa proposta, traremos aqui a discussão de um processo variável que, por ser menos marcado linguistica e socialmente, pode, com frequência, ser transposto para a escrita: o apagamento do [d] no encontro consonantal /nd/ em palavras no gerúndio: pulando [pu‘lãnu] → “pulano” e em alguns substantivos como: candidato [kani‘datu] → “canidato” e condensado [kõnesadu] → “conensado”. Além de descrever o seu comportamento na fala, proporemos algumas sugestões de como esse processo pode ser trabalhado em sala de aula de forma a ampliar a competência comunicativa dos/as discentes.
*Por questões técnicas, a transcrição fonética não corresponde ao descrito, em alguns casos, pela pesquisadora.
Por meio dos arquivos paroquiais houve a garantia dos registros da história e da cultura da sociedade, permitindo a possibilidade de análise da escrita em uso, em uma determinada temporalidade, compreendendo a história do Português Brasileiro usado no sertão do Rio São Francisco do século XVIII. A fonte documental estudada foi escrita por vigários que atuaram na Freguesia de Santo Antônio do Urubu de baixo do Rio São Francisco (1719-1753), delineando, assim, a história social e desvelando possibilidades para investigações na área da Sociolinguística Histórica. Neste recorte, temos o objetivo de analisar a habilidade dos scriptores, através dos aspectos físico- gráficos e gráficos e fonéticos, como o traçado das letras, substituições de segmentos, segmentação vocabular, alçamento de vogais, substituições consonantais, formas etimologizadas, entre outros. A pergunta que norteou este trabalho foi: por que a escrita dos assentos de casamentos revela marcas específicas da oralidade na grafia, se os scriptores pertenciam a uma elite instruída na região do baixo São Francisco no referido período? A hipótese assumida é a de que esses homens eram influenciados pela oralidade e pelo princípio etimológico em detrimento do fonético, reflexo do conflito existente entre os períodos da história da ortografia da língua portuguesa em que o manuscrito foi produzido (1719-1753). Para a realização deste trabalho, recorremos ao suporte da leitura paleográfica (SPINA, 1994; CAMBRAIA, 2005; BERWANGER; LEAL, 2008) e da Sociolinguística Histórica (ROMAINE 1982; SCHNEIDER, 2002, CONDE-SILVESTRE, 2007; MONTGOMERY, 2007 e HERNÁNDEZ-CAMPOY; CONDE-SILVESTRE, 2012) para reconstruir o comportamento de comunidades históricas, possibilitando a reflexão sobre as condições sócio-históricas em que a fonte documental foi produzida. A metodologia seguiu os seguintes passos: (i) leitura da reprodução fac-similar e transcrição do manuscrito; (ii) sistematização dos aspectos físico-gráficos e gráficos e fonéticos com o auxílio da ferramenta computacional AntConc (2011) e (iii) consulta e comparação das grafias nas obras de Bluteau (1728) e Feijó (1734) para verificar se os índices de oralidade na grafia, encontrados no documento, correspondiam aos mesmos usos apresentados pelas obras de referência do período estudado. Os resultados revelam que, apesar dos scriptores fazerem parte de uma elite com maior nível de instrução, uma vez que as habilidades para ler e escrever seriam fundamentais para desempenhar os trabalhos exigidos em sua paróquia de atuação, a escrita era influenciada pelos conflitos referentes aos períodos históricos da ortografia da língua portuguesa.
Esta comunicação tem como objetivo compartilhar o resultado de pesquisas realizadas por pesquisadores do Laboratório de Edição de Documentos de Pernambuco (LEDOC), com cartas de casais do litoral e do sertão pernambucanos, na primeira metade do século XX. A abordagem das tradições discursivas Koch (1997), Kabatek (2006, 2012), Andrade e Gomes (2018) é feita de acordo com as noções de proximidade comunicativa (KOCH; ÖESTERREICHER, 2007; 2013) e com a proposta de Longhin (2014), em que são abordadas as dimensões da tradicionalidade temática, composicional e dos modos de dizer. Os estudos realizados por Rumeu (2013) e Gomes e Lopes (2014a, 2016) complementam a base teórica, na perspectiva da Sociolinguística Histórica. Os resultados dessa análise revelam que as tradicionalidades temática, composicional e dos modos de dizer evidenciam estratégias de verbalização tradicionais ou variáveis próprias da natureza carta de casal.
Em “Caminhos sociofuncionalistas no Sertão da Ressaca”, compreendendo o caminho norteado por duas bases teóricas, a Sociolinguística variacionista e o Funcionalismo norte-americano, apresentaremos os princípios basilares dessa interface e algumas pesquisas realizadas no sudoeste baiano fundamentadas no diálogo entre a teoria sociolinguística e a teoria funcionalista. Realizado esse percurso, lançaremos inquietações sobre possíveis caminhos a serem seguidos.
O uso da morfologia do indicativo, na expressão da noção de subjuntivo, tem sido bastante debatido pela sociolinguística brasileira, e, especialmente na região nordeste, esse modo verbal tem sido amplamente descrito (Santos, 2005; Oliveira, 2006; Carvalho, 2007; Santos, 2015; Souza; Oliveira, 2020) à luz da Sociolinguística Variacionista (Labov, 2008[1972]). O trabalho que se pretende apresentar é mais uma contribuição para as pesquisas que se ocupam em analisar a variação entre as morfologias desses modos verbais, ao propor uma análise de percepção estimulada por orações subordinadas no modo indicativo ou subjuntivo, organizadas de acordo com a técnica matched-guise (Lambert et al, 1960; Campbell-Kibler, 2006; 2008; 2009). Os estímulos (enunciados por 4 falantes – dois ludovicenses e dois paulistanos, dado ao caráter comparativo da pesquisa) constituem-se de orações subordinadas no modo indicativo ou subjuntivo: adverbiais com embora ou talvez (como em “embora ESTIVESSE/ESTAVA aqui, a oportunidade foi dada a outro candidato” e “talvez ESTIVESSE/ESTAVA no tempo de perguntar aos funcionários sobre sua satisfação no trabalho”) e substantivas introduzidas por “querer” ou “acreditar” (a exemplo de “o chefe QUER que a secretária PERMANEÇA/PERMANECE na reunião” e “ele ACREDITA que todos FAÇAM/FAZEM a sua parte”). A discussão que se levanta é a de que, comparativamente a variáveis fonéticas, variáveis gramaticais têm recebido menos atenção nos estudos de percepção (vejam-se, contudo, Gaucher, 2013; Levon & Buchstaller, 2015; Mendes, 2016; 2018, Santos, 2020). Isso se deve, de certo modo, a afirmações de que as formas gramaticais da língua não provocam os mesmos tipos de reações perceptuais que variáveis fonológicas, fazendo com que os “ouvintes avaliem estruturas menos profundas da língua, mas não características mais abstratas” (Labov, 1993; Labov et al, 2011). No geral, as análises de regressão linear (R Core Team, 2021) mostram que os falantes foram percebidos como mais inteligentes quando ouvidos no subjuntivo. Os ludovicenses foram avaliados como mais formais, mas os falantes paulistanos foram percebidos como mais antipáticos. Ludovicenses foram percebidos como menos escolarizados quando ouvidos com o indicativo, enquanto não houve diferença para os falantes paulistanos. Tais resultados não apenas questionam a afirmação de que variáveis gramaticais estejam disponíveis para avaliação sociolinguística, como também mostram que a percepção social de variáveis linguísticas é variável e ordenada, tal como a produção sociolinguística.