Mesa-redonda 1

Memória da música: acervos e instituições:

Diósnio Machado Neto

Pedro Paulo Salles

O que águas lembram, o fogo faz esquecer: música, memória e esquecimento entre os Haliti
do Mato Grosso

As flautas mais poderosas dos Haliti vieram do fundo das águas do rio. Em setembro de 2018,
várias dessas flautas e seus cantos (gravados em cilindros de cera) foram consumidos pelo
fogo no incêndio do Museu Nacional. Nos anos 1990, contaram-me os Haliti, um incêndio na
pequena maloca de palha denominada casa-da-flauta, em uma das mais de 50 aldeias desse
povo, e a coincidente interrupção da linhagem de donos-de-flauta em razão da morte de um
ancião, determinaram a morte das flautas daquela aldeia. As flautas Iyamaka são consideradas
como entes vivos que, por meio de suas potências agentivas, tanto podem oferecer proteção
quanto perigo. “Lembrem-se de nós!”, dizem as flautas aos Haliti, alertando para o seu
esquecimento, pois flautas esquecidas ou abandonadas vão embora (morrem). É um campo
complexo de relações de memória, que também incidem sobre os cantos-de-flauta e os
acervos, sendo a música um elemento movido por relações cosmopolíticas com outros seres,
visíveis e invisíveis. Esquecer as flautas ou seus cantos é perder sua proteção e ficar à mercê de
serpentes e raios vingativos e, na pior das hipóteses, espíritos malignos como o feiticeiro
Tihanare, que já tem sido comparado a Bolsonaro, que atrai pelo discurso e subtrai pelo fogo
até o esquecimento.

Lucas F. Lara

Rafael Vítor Barbosa

Mediação: Marcos Terra

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