Mulheres comentando futebol? Projetos de mídia de torcedoras e a produção de representações contra-hegemônicas da mulher no esporte  

Ana Carolina Vimieiro (UFMG, Brasil)

A massificação das ferramentas de auto-publicação, propiciada pelo que costuma ser chamado de Web 2.0, impulsionou nas últimas duas décadas a criação ampliada por parte de torcedores de futebol de projetos de mídia (Vimieiro, 2014, 2015, 2018). Certamente, a Internet não cria as condições para a emergência de tal fenômeno, já que torcedores se engajam em práticas de mídia como fanzines, registros fotográficos, produção de faixas e bandeiras e mesmo inscrições urbanas como pichações pelo menos desde meados do século XX no Brasil. Entretanto, é perceptível que há uma ampliação dos sujeitos que passam a ter voz e acesso a meios de produção cultural na contemporaneidade, com alguns desses projetos alcançando grande visibilidade entre as culturas torcedoras de seus respectivos times. Em trabalhos anteriores, foram explorados os diferentes formatos e perspectivas adotadas em projetos de mídia de torcedores brasileiros. De rádios digitais a canais do YouTube com produção original, esses projetos de forma geral produzem a inversão das estruturas narrativas convencionais da mídia, com o torcedor se tornando protagonista das estórias. Nesta palestra, irei analisar especificamente projetos de mídia liderados por mulheres em Minas. Abordarei duas iniciativas recentes: o Podcast das Marias, feito por torcedoras cruzeirenses, e o podcast da Grupa, coletivo de mulheres atleticanas. Entre as contribuições desses dois projetos está a produção de representações contra-hegemônicas que problematizam, sobretudo, o estereótipo ainda dominante de que mulheres não possuem capacidade para falarem tecnicamente de futebol.

 

Vou ficar de arquibancada pra sentir mais emoção": Técnicas sônicas e produção da performance esportiva em partidas de futebol 

Pedro Marra (UFES)

Esta pesquisa busca escutar uma partida de futebol a fim de compreendê-la como performance na qual torcida e jogo constituem-se mutuamente durante a disputa esportiva. Parte do princípio de que o som é uma mediação afetiva, movimento de um corpo que faz outros corpos vibrarem em consonância, empreendida por um artefato caracterizado por uma dualidade de força e texto. A partir do registro em áudio de 21 partidas do Clube Atlético Mineiro gravadas em trabalho de campo realizado entre os anos de 2008 e 2015, buscamos compreender as técnicas sônicas - conjunto de práticas e protocolos que empregam e modulam vibrações sonoras com vistas a realização de certas tarefas - empregadas pela torcida no estádio para, entre outras: articular e desarticular os torcedores presentes nos jogos, disputar o espaço da arquibancada, demonstrar sentimentos com relação à equipe e ao adversário, afetar a performance atlética dos jogadores e arbitragem em campo e regular a temporalidade das partidas e da temporada esportiva. Nestas dinâmicas sônicas, torcidas e equipes reencenam as histórias e mitos em torno do clube, o que por vezes assume um caráter mágico, já que envolvem uma crença desmesurada e não comprovada na eficácia de tais técnicas, e por outras reproduzem violências - às vezes legítimas - que atravessam a sociedade, tais como patrimonialismo, patriarcado, machismo e misoginia. Assim, o futebol, mais do que ser um espelho da sociedade, sonoriza e ressoa tais tensões, apresentando-se como espaço privilegiado de escuta destas questões.

 

Trabalhando com Big Data e Machine Learning: Classificação de Notícias Esportivas e o Viés Cultural-Esportivo ‘Nacional’

Renan Petersen-Wagner (Leeds Beckett University, Inglaterra) (participação via internet)

Como argumentado por Niklas Luhmann (2000), o que sabemos sobre a sociedade, ou do mundo que nos cerca, sabemos através da mídia de massa. A perspectiva de Luhmann (2000) encontra eco na noção dos cinco vieses editoriais desenvolvida por Herman e Chomsky (1992). Tomando como ponto de partida a noção de sourcing bias (Herman and Chomsky, 1992) meu argumento neste trabalho é que o esporte, por suas características inerentes de conteúdo barato e de prover um drama humano real (ver Rowe, 2004; Jackson, 2013), serve por fabricar o que eu conceitualizo como o viés cultural-esportivo ‘nacional’. O meu argumento é construído através da classificação automática através de machine learning de notícias esportivas de 12 diferentes meios de comunicação impressos ao redor do mundo. Entre Abril e Agosto de 2019 foram coletadas automaticamente (baseado nas previsões do primeiro mês de coleta) 80.000 notícias que foram então categorizadas entre os diferentes esportes cobertos por esses meios de comunicação. Resultados preliminares demonstram que esses meios de comunicação operam no que eu conceitualizo de viés cultural-esportivo ‘nacional’ pelo foco desproporcional em certas modalidades esportivas que acaba por modificar a percepção dos leitores sobre a cultural esportiva nacional.

 

Moderação: Silvio Ricardo (Gefut/EFFETO/UFMG)

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