O IX Congresso da Associação Brasileira de Pesquisadores em Sociologia do Direito (ABraSD) homenageia José Eduardo Faria, professor titular do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e professor da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

 

A homenagem é devida pela densa obra teórica de Faria, por seu pioneirismo na institucionalização acadêmica da disciplina de Sociologia Jurídica no Brasil e por seu notável papel de formação de quadros para pensar este campo científico e reestruturar a prática do direito na academia, no judiciário, na advocacia pública e privada, nos poderes políticos e na sociedade civil.

 

Faria leciona a disciplina de Sociologia Jurídica desde os anos de 1980 e em 1979 instituiu o Programa de Educação Tutorial da CAPES – PET Sociologia Jurídica – na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, atraindo e qualificando os mais promissores talentos para a teoria e a pesquisa jurídica, desde a graduação.

 

Seu pensamento reflete uma preocupação fundamental com o papel do direito no desenvolvimento econômico e na democracia brasileira, acompanhando as transformações do país e do mundo ao longo de mais de quatro décadas.

 

O questionamento sobre a tensão entre legalidade, legitimidade e efetividade permeou o seu mestrado (publicado como livro: Poder e legitimidade: uma introdução à política do direito, 1976) e teve seguimento no seu doutorado (Direito, modernização e autoritarismo: mudança socioeconômica x liberalismo jurídico, 1981) e na sua tese de livre-docência (Retórica política e ideologia democrática: a legitimação do discurso jurídico liberal, 1982), refletindo a realidade do país com perícia jornalística e destreza acadêmica.

 

Da mesma forma, o projeto de modernização empreendido pelo movimento de “direito e desenvolvimento” nos anos 60 foi objeto de crítica por sua visão meramente instrumental do direito, como ideologia propagadora de um modelo de legalidade que seria capaz de sustentar o crescimento econômico e a liberdade política. Na prática, a corrosão da legalidade provocada pelo autoritarismo aliava-se a uma perigosa pretensão de legitimação pela eficiência. Esse foi o objeto de seu pós-doutorado na Universidade de Wisconsin, em Madison (Estados Unidos), resultando no livro Eficácia jurídica e violência simbólica: o direito como instrumento de transformação social (1988).

 

As transformações da vida política e econômica brasileira, e suas demandas para o campo jurídico, foram objeto de constante reflexão (Crise constitucional e a restauração da legitimidade, 1985; O Brasil pós-Constituinte, 1989; Direito e economia na democratização brasileira, 1993). Não ficaram de fora os diagnósticos e prognósticos para a sociologia jurídica imersa em um cenário de tamanha mudança social (A Sociologia Jurídica no Brasil, 1991, com Celso Campilongo).

 

Mais uma vez com olhar atento às transformações da sociedade mundial e aos desafios do Brasil para reformar suas instituições e atualizar sua estrutura econômica, Faria produziu trabalhos paradigmáticos a respeito de um direito que solapa dogmas centrais do pensamento jurídico moderno, como a soberania do estado nacional e a hierarquia de suas leis (como na tese de titularidade, O direito na economia globalizada, 1999; e em Qual o futuro dos direitos? Estado, mercado e justiça na reestruturação capitalista, 2002, com Rolf Kuntz).

 

Novas arenas de produção do direito, pluralismo jurídico, policentrismo decisório e os movimentos de convergência, unificação e internacionalização do direito – tudo o que havia de mais dinâmico no cenário jurídico do Brasil e do mundo parecia permanecer de fora dos limites institucionais do judiciário (Justiça e Conflito: os juízes em face dos novos movimentos sociais, 1991) e mesmo dos modelos de leitura do mundo na pesquisa e no ensino jurídico.

 

José Eduardo Faria voltou-se para preencher essas lacunas com sua produção teórica sempre atenta para atualizar o pensamento jurídico com as crises e rupturas mundiais (Sociologia Jurídica: Direito e Conjuntura, 2008; O Estado e o direito depois da crise, 2011, este Prêmio Jabuti de Literatura de 2012, na categoria de livros de Direito).

 

Outro tema recorrente na sua agenda de pesquisa foi a temática do ensino jurídico, objeto constante de reflexão na pós-graduação desde a década de oitenta com a disciplina Metodologia do Ensino Jurídico. Portanto, sua produção teórica encaminhou-se em paralelo com a preocupação em atualizar o ensino jurídico brasileiro para além de um paradigma formalista, idealista e dogmático, incapaz de fornecer ao jurista ferramentas conceituais para pensar e praticar o direito em novas situações de globalização e restruturação econômica, abertura política e demandas pela extensão dos direitos de cidadania (A reforma do ensino jurídico, 1987).

 

A destacada reflexão sobre o ensino jurídico ecoou na formação de uma geração de professores e pesquisadores preocupados com a seriedade e rigor com a pesquisa em direito, rompendo o isolamento da área e permitindo o diálogo com a economia, a política, a sociologia, a filosofia entre outras.

 

Não menos importante que sua obra teórica foi o engajamento de José Eduardo Faria na consolidação de um campo para a sociologia jurídica na academia brasileira. Faria foi coordenador da área de ciências humanas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), representante da área de direito do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e avaliador de cursos de pós-graduação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

 

A ABraSD sente-se honrada em homenagear José Eduardo Faria neste seu IX Congresso Internacional.

 

(Leia aqui a primeira parte da entrevista de José Eduardo Faria para a Revista Brasileira de Sociologia do Direito)

 

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