O SEFOPER, que já se encontra em sua 17 edição, é um evento voltado à formação de professores de Ensino Religioso, estudantes em processo de formação, seja na graduação em Ciências da Religião, na Pedagogia ou demais cursos, bem como na pós-graduação. Por abordar temáticas que possuem conexões e interfaces com outras áreas e campos da atuação humana, o evento abarca um público específico e, ao mesmo tempo, diverso, como é o caso do tema desta edição: Direitos Humanos, da Terra e Laicidade: perspectivas à formação docente.

O debate em torno da laicidade, dos direitos humanos e da terra engloba um conjunto de dimensões, áreas, instâncias e instituições sociais do Estado brasilieiro. Mobiliza narrativas, práticas e políticas públicas que impactam sobremaneira na visibilidade de problemas sociais, de identidades historicamente marginalizadas e negação de direitos fundamentais. Este cenário requer ações, projetos e estratégias de enfrentamento de todo tipo de discriminação, intolerância e violência, especificamente aquelas que se situam ou que transversalizam os campos religioso e educacional.

A banalização da vida e da morte, os fundamentalismos que atentam contra as liberdades e a dignidade humana, os problemas socioambientais e o aumento das desigualdades sociais no país e no mundo, são alguns dos impasses que desafiam a humanidade, os governos, as denominações religiosas e, fundamentalmente, a educação contemporânea.

O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, de 2007, reconhece a escola como um espaço privilegiado da ação pedagógica e da prática e vivência dos direitos humanos. Trata-se, portanto, de um espaço/tempo para a estruturação de concepções de mundo e consciência social, circulação e consolidação de valores, compreensão e valoração do direito à existência, reconhecimento da importância do respeito à diferença na formação cidadã.

No referido Plano, entende-se que:

[...] a educação em direitos humanos deve ser um dos eixos fundamentais da educação básica e permear o currículo, a formação inicial e continuada dos profissionais da educação, o projeto político pedagógico da escola, os materiais didático-pedagógicos, o modelo de gestão e a avaliação (BRASIL, 2007, p. 24).

É nesta perspectiva que o respeito à liberdade e diferença religiosa precisa ser compreendido, enquanto um direito humano a ser ensinado e aprendido nos espaços educativos. Corrobora, assim, a compreensão de Estado laico enquanto a primeira organização política a possibilitar o reconhecimento da liberdade e diversidade religiosa, bem como o direito de minorias religiosas serem gradativamente visibilizadas e respeitadas. E isso só é possível quando o Estado não assume nenhuma posição, seja em favor ou contra qualquer denominação religiosa. De acordo com Blancarte (2008, p. 29), “há que se lembrar que a liberdade de crença, a liberdade de culto e a tolerância religiosa foram aceitas graças ao Estado laico, e não como oposição a ele”.

No contexto brasileiro, não é novidade que um dos temas mais desafiadores à laicidade do Estado tem sido o Ensino Religioso, muito embora, com o processo de redemocratização do país e, fundamentalmente, com a publicação do art. 33 da LDB/1996, alterado pela Lei nº 9.475/1997, inaugura-se um novo paradigma para essa disciplina escolar, fundado em outros pressupostos epistemológicos e pedagógicos, não mais exclusivamente teológicos, mas antropológicos, sociológicos, fenomenológicos e históricos.

O conhecimento sobre as religiões, articulado às Ciências da Religião, passa a ser utilizado para estabelecer diálogos entre diferentes cosmovisões, voltado à análise e compreensão da diversidade cultural e religiosa e suas implicações nas distintas áreas da atuação humana, tendo em vista o compromisso com a formação cidadã, integral e humanística.

Neste sentido, como ensina o Professor Síveres (2016), o diálogo é um  elemento instituidor da condição humana, isto porque está  presente nas formas mais intensas para desenvolver o conhecimento por meio do diálogo entre os saberes, e é um elemento desencadeador da práxis, isto é, de uma ação que é decorrente de uma reflexão. Nesta perspectiva, o diálogo é compreendido como uma relação dialógica (Ser), uma disposição do conhecimento (Saber) e  uma intencionalidade da ação (Agir). No contexto educacional, onde se inscreve a oferta do Ensino Religioso, essa tridimensionalidade traduz a possibilidade do processo pedagógico estar pleno de significado e de sentido ao estudante.

Não é sem sentido que o Ensino Religioso na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) sinaliza um encaminhamento centrado na “pesquisa e no diálogo como princípios mediadores e articuladores dos processos de observação, identificação, análise, apropriação e ressignificação de saberes” (BRASIL, 2017, p. 432). Se na perspectiva confessional a metodologia do Ensino Religioso está focada na resposta pré-definida, na não confessional se caracteriza por uma inversão fundamental em que a pergunta passa a ser mobilizadora do processo de ensino-aprendizagem. Assim, abrem-se espaços para o exercício do diálogo que, de acordo com Hermann (2002, p. 94), “[...] se constitui na força do próprio educar - que é educar-se - no sentido de uma constante confrontação do sujeito consigo mesmo, com suas opiniões e crenças, pela condição interrogativa na qual vivemos”.

Frente ao exposto e considerando os desafios socioeducacionais de nosso tempo, justifica-se a necessidade de discutir, refletir e articular ações que fomentem os direitos humanos, da terra e a laicidade, tendo em vista a formação de professores, os quais têm um papel central na formação das crianças e juventudes, no respeito e valorização da ciência, da cultura e da vida, na medida em que assumem o desafio de renovar o mundo.